Mateus cumpriu a sua promessa de "cuidar" de mim.
Ele passava algumas horas por dia no meu quarto de hospital. Sentava-se numa cadeira no canto, a ler os seus relatórios financeiros, sem nunca me dirigir uma palavra que não fosse estritamente necessária.
"Precisas de alguma coisa?"
"A enfermeira já veio?"
A sua presença era mais dolorosa do que a sua ausência. Eu observava-o, o homem por quem me tinha apaixonado, e não sentia nada. O amor, a paixão, a esperança... tudo tinha desaparecido. Sobrou apenas um vazio imenso.
Quando finalmente tive alta, ele estava à minha espera com o carro.
Ao abrir a porta do passageiro, vi-a. Sofia. Sentada no banco da frente, no lugar que devia ser meu. Ela olhou para mim com um sorriso de desprezo, um brilho de vitória nos olhos.
Senti um nó na garganta, mas entrei no banco de trás sem dizer uma palavra. Lutar já não valia a pena.
"Lara, a Sofia vai ficar connosco em casa," anunciou Mateus, como se fosse a coisa mais natural do mundo. "Até ela se sentir completamente segura."
Ele virou-se para Sofia.
"Pede desculpa à Lara."
"Desculpa," disse Sofia, sem me olhar, a sua voz a pingar falsidade.
Mateus pareceu satisfeito. Para ele, o assunto estava encerrado.
A viagem para casa foi uma tortura silenciosa. Eu observava-os pelo espelho retrovisor. Ele ajustava o ar condicionado para ela. Perguntava se ela estava com fome. A sua mão pousou no ombro dela por um instante, num gesto de proteção.
Cada gesto era uma facada no meu coração já morto.
Ao chegarmos à mansão, subi diretamente para o meu quarto e tranquei a porta. Não queria fazer parte daquela farsa.
Deitada na cama, ouvia os sons da vida deles lá em baixo. Risos. Conversas. O som do piano que Sofia tocava. Sons de uma intimidade e felicidade que eu nunca tinha tido naquela casa. Eu era uma estranha no meu próprio casamento.
Mais tarde, o silêncio instalou-se. A curiosidade doentia levou-me a sair do quarto. A porta do quarto de Sofia estava entreaberta.
Espreitei.
Ela dormia, o seu rosto sereno sob a luz do luar. E Mateus estava lá. Ajoelhado ao lado da cama dela.
Ele estendeu a mão, os seus dedos a tremerem, e acariciou o rosto dela com uma ternura que eu nunca tinha recebido.
Depois, inclinou-se.
E beijou-a.
Um beijo nos lábios. Lento, cheio de um desejo reprimido e de uma dor insuportável.
O meu mundo desabou. Ver era diferente de saber. A visão daquele beijo roubado, daquele amor incestuoso finalmente consumado, mesmo que apenas de um lado, destruiu a última partícula de mim que ainda se agarrava a uma réstia de normalidade.
Senti o chão a fugir debaixo dos meus pés. Voltei para o meu quarto a cambalear, o som do meu próprio coração a despedaçar-se a ecoar nos meus ouvidos.