Ela se virou para Pedro, que correu até ela, segurando uma pequena caixa de madeira mal pintada. Meus olhos se fixaram na caixa. Eu reconheci a tinta, os pincéis. Eram os materiais de arte que eu havia comprado para Pedro na semana passada, na esperança de passarmos uma tarde juntos, algo que não acontecia há meses.
"Eu e o papai fizemos para você, tia Bella!", Pedro disse, orgulhoso, entregando a caixa para ela. "Feliz aniversário!"
Ricardo bagunçou o cabelo de Pedro, um sorriso genuíno no rosto. Um sorriso que ele raramente me dava.
"Ele trabalhou nisso o dia todo", disse Ricardo para Isabella. "Queria que fosse perfeito para você."
Isabella abriu a caixa com um gritinho de alegria. Dentro, havia um colar de miçangas coloridas, do tipo que uma criança de seis anos faria. Era desajeitado e imperfeito, mas feito com amor. Um amor que deveria ter sido para mim.
Meu coração, que eu pensei que não poderia se partir mais, se estilhaçou em um milhão de pedaços. Era o meu aniversário também. Eu era a mãe dele. E ele, junto com meu marido, passou o dia fazendo um presente para outra mulher. Para a mulher que destruiu minha vida.
Isabella pegou o colar e o estendeu na minha direção, o sorriso dela era pura provocação.
"Olha, Sofi. Não é lindo? Pedro é tão talentoso. Você não quer ver de perto?"
Naquele momento, algo dentro de mim se rompeu. A calma gelada se foi, substituída por uma fúria branca e quente.
Dei um passo à frente e bati na mão dela, fazendo a caixa e o colar voarem e caírem na poça de lama aos meus pés.
As miçangas coloridas se espalharam pela sujeira.
O silêncio foi instantâneo e pesado.
"Chega de mentiras, Isabella", minha voz era baixa e trêmula de raiva. "Eu cansei do seu teatro."
O rosto de Isabella se contorceu em uma máscara de choque e dor. Lágrimas brotaram em seus olhos instantaneamente. Ela era uma atriz talentosa.
"Sofi... por quê? Eu só queria te mostrar..."
"Ricardo!", ela choramingou, virando-se para ele, buscando proteção. "Ela me odeia. Eu não fiz nada!"
Ricardo não hesitou. Ele se moveu tão rápido que eu mal tive tempo de reagir. Sua mão agarrou meu braço com força, seus dedos cravando na minha pele.
"Qual é o seu problema, Sofia?!", ele rosnou, seu rosto perto do meu. "Você enlouqueceu de vez? Peça desculpas para a Isabella. Agora!"
Ele me empurrou com força. Perdi o equilíbrio no chão escorregadio e caí de joelhos na lama, a dor aguda percorrendo meu corpo. A chuva fria e a sujeira me cobriram.
"Mamãe!", Pedro gritou.
Por um segundo, uma faísca de esperança acendeu em mim. Ele estava preocupado.
Mas então suas próximas palavras apagaram essa faísca para sempre.
"Eu odeio você!", ele gritou, seu rostinho contorcido de raiva. "Você machucou a tia Bella! Você é má! Eu não quero mais ser seu filho!"
As palavras dele me atingiram mais forte do que a queda. Olhei para o meu filho, o menino que eu carreguei, que eu amamentei, que eu amava mais do que a própria vida, e vi um estranho. Um estranho que me odiava.
Meus pais adotivos saíram correndo, atraídos pela comoção. Ao me verem no chão e Isabella chorando nos braços de Ricardo, eles não precisaram de mais explicações.
"Ingrata!", minha mãe gritou para mim. "Depois de tudo que fizemos por você! É assim que você retribui, atacando sua irmã?"
Ninguém me perguntou o que aconteceu. Ninguém se importou em me ajudar a levantar. Eu estava sozinha, de joelhos na lama, cercada por pessoas que deveriam me amar, mas que me olhavam com desprezo.
Levantei-me lentamente, ignorando a dor no meu corpo e a dor muito maior no meu coração. Olhei para cada um deles. Para o rosto furioso de Ricardo. Para o choro falso de Isabella. Para a decepção nos rostos dos meus pais. E, por último, para o ódio nos olhos do meu filho.
Sem dizer uma palavra, virei-me e comecei a andar.
"Sofia, onde você pensa que vai?", Ricardo gritou atrás de mim. "Volte aqui!"
Eu não parei. Continuei andando, me afastando da casa, da festa, daquelas pessoas.
Enquanto caminhava na escuridão chuvosa, as memórias vieram sem serem convidadas.
Lembrei-me de quando conheci Ricardo. Ele era apenas um estudante universitário pobre, lutando para pagar as contas. Eu era a "filha adotiva" de uma família rica, mas me apaixonei por sua ambição e seu sorriso tímido. Nós nos casamos contra a vontade dos meus pais, que achavam que ele não era bom o suficiente para mim.
Lembrei-me de quando a empresa da família dele estava à beira da falência. Eu vendi as joias que minha mãe biológica me deixou, meu único vínculo com meu passado, para lhe dar o capital que ele precisava para se reerguer. Trabalhei ao lado dele, dia e noite, fazendo a contabilidade, lidando com fornecedores, fazendo de tudo para que seu sonho se tornasse realidade.
Lembrei-me de quando a mãe dele ficou doente. Fui eu quem passou noites em claro ao lado da cama dela, quem a alimentou e a limpou, enquanto Ricardo estava ocupado demais com o "trabalho importante".
Eu dei a ele tudo. Meu tempo, meu dinheiro, minha juventude, meu amor.
E o que eu recebi em troca?
Lembrei-me de como, depois que ele se tornou bem-sucedido, Isabella começou a se reaproximar. Ela sempre o desprezou quando ele era pobre. Lembro-me dela dizendo: "Por que você está perdendo seu tempo com esse fracassado, Sofi?". Mas agora que ele era o rico e poderoso Ricardo Silva, ela estava sempre por perto, oferecendo "conforto" e "apoio".
Ricardo me disse uma vez, durante uma briga: "Pelo menos a Isabella estava lá para me animar quando eu estava no fundo do poço. Você só sabia me pressionar com os problemas da empresa."
A ironia era tão amarga que me dava vontade de rir. A mulher que o chamava de fracassado agora era a sua salvadora, e eu, que sacrifiquei tudo, era a vilã.
Ele acreditou nas mentiras dela. Ele reescreveu nossa história para se adequar à narrativa dela, onde ela era a heroína e eu, a megera ciumenta.
A chuva começou a diminuir, mas as lágrimas corriam livremente pelo meu rosto, misturando-se com a água fria. Eu não estava mais chorando por eles. Estava chorando por mim. Pela garota tola que acreditou que o amor e o sacrifício seriam suficientes.
Eles não foram. Nada nunca foi suficiente.