O Cheiro do Engano
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Capítulo 1

O cheiro de charuto caro e perfume feminino barato misturava-se no ar do pequeno apartamento, era um cheiro que Ricardo conhecia, mas que nunca deveria estar junto.

Ele parou na porta, com a sacola de compras ainda na mão.

Dentro da sala, sua noiva, Juliana, estava nos braços de outro homem.

O homem era Gustavo, o filho arrogante de um magnata da indústria, uma figura que Ricardo só via em colunas sociais.

Eles não o viram.

Estavam rindo, e a mão de Gustavo descia pelas costas de Juliana, parando perigosamente em sua cintura.

A sacola de compras caiu da mão de Ricardo, o som das laranjas rolando pelo chão de madeira quebrou o silêncio.

Juliana se virou bruscamente, seus olhos se arregalaram.

Ela não mostrou culpa, apenas irritação, como se Ricardo tivesse interrompido algo importante.

"Ricardo? O que você está fazendo aqui tão cedo?"

Gustavo, por outro lado, sorriu, um sorriso lento e presunçoso. Ele não fez questão de se afastar de Juliana, ao contrário, a puxou para mais perto.

Ricardo sentiu o sangue sumir de seu rosto, o choque era como um soco no estômago, tirando seu ar.

Ele olhou para Juliana, a mulher com quem planejava passar o resto da vida, e não a reconheceu.

"O que está acontecendo aqui, Juliana?" a voz dele saiu rouca, quase um sussurro.

Juliana se soltou de Gustavo e ajeitou o vestido, a expressão de irritação se transformou em desprezo.

"Não seja dramático, Ricardo. Gustavo e eu estávamos apenas conversando."

"Conversando?" Ricardo riu, um som amargo e sem alegria. "É assim que você chama isso agora?"

Ele apontou para a maneira como Gustavo a segurava, a intimidade óbvia entre eles.

Gustavo finalmente falou, sua voz era suave, mas cheia de veneno.

"Parece que o seu noivo é um pouco lento, querida. Talvez você devesse explicar as coisas para ele."

Juliana suspirou, como se estivesse lidando com uma criança teimosa.

Ela caminhou até Ricardo, mas não para confortá-lo, ela parou a uma distância segura, os braços cruzados.

"Olha, Ricardo, as coisas mudaram. Eu e Gustavo estamos juntos."

Cada palavra era uma martelada no peito de Ricardo.

"Juntos? Nós estamos noivos, Juliana. Íamos nos casar em três meses."

"Exatamente," ela disse, e agora sua família inteira entrou na sala, saindo do quarto onde deviam estar escondidos, esperando o momento certo. Sua mãe, seu pai, seu irmão, todos com a mesma expressão fria e calculista.

Era uma emboscada.

A mãe de Juliana, Sônia, foi a primeira a falar, sua voz era falsamente doce.

"Ricardo, querido, tente entender. Esta é uma oportunidade única para nossa família, e para você também."

Ricardo olhou para eles, confuso e traído. "Oportunidade? Que oportunidade?"

Foi o pai de Juliana, Alberto, quem respondeu, direto e sem rodeios.

"Juliana vai se envolver com o senhor Gustavo. É uma aliança poderosa. Mas a sociedade não pode saber disso agora, por razões de negócios da família de Gustavo. Então, o casamento de vocês vai acontecer como planejado."

Ricardo sentiu uma náusea subir pela garganta.

Ele olhou de Alberto para Juliana, e depois para Gustavo, que assistia a tudo com um divertimento cruel.

"Vocês... vocês querem que eu me case com ela, sabendo que ela está com ele? Vocês querem que eu seja um 'chifrudo' de fachada?"

A palavra saiu com nojo, com toda a humilhação que ele sentia.

Sônia fez uma careta. "Não use essa linguagem vulgar, Ricardo. Pense nisso como um acordo de negócios. Você se casa com a Juliana, mantém as aparências por um tempo, e nossa família vai te recompensar generosamente. Você terá uma vida que nunca sonhou."

A proposta era tão absurda, tão insultuosa, que por um momento Ricardo ficou sem palavras.

Eles não estavam apenas admitindo a traição, estavam pedindo que ele fosse cúmplice dela, que vendesse sua dignidade por dinheiro.

Ele olhou para Juliana, buscando qualquer sinal de remorso, qualquer vestígio da mulher que ele amou.

Não havia nada.

Seus olhos estavam frios, calculistas, cheios de ambição.

Ela não o amava, talvez nunca o tivesse amado. Ele era apenas uma peça no jogo dela, uma ponte para o poder e a riqueza que ela tanto desejava.

Ele se lembrou de todos os sacrifícios que fez por ela e pela família dela.

Ele trabalhou em dois empregos para ajudar a pagar as dívidas de Alberto, ele deu a ela o pouco dinheiro que tinha para que ela pudesse comprar roupas caras e frequentar os círculos sociais certos.

Ele fez tudo isso por amor, e para eles, era apenas um investimento, um peão a ser usado e descartado.

A dor no peito de Ricardo começou a se transformar em uma raiva fria.

A ingenuidade que o definira por tanto tempo estava se quebrando, sendo substituída por uma clareza dolorosa.

Ele não era parte da família deles, ele era uma ferramenta.

E agora, essa ferramenta havia se tornado um obstáculo a ser contornado da maneira mais humilhante possível.

Ele pensou no noivado, um evento que deveria ter sido feliz. Agora ele percebia a verdade.

O noivado não foi uma promessa de amor, foi uma estratégia.

O pai de Juliana o pressionou a pedir a mão dela, dizendo que era a coisa certa a fazer, que solidificaria sua posição na família.

Ricardo, ingênuo e apaixonado, concordou.

Ele gastou todas as suas economias em um anel, um anel que agora parecia queimar no dedo de Juliana.

Ele se lembrou de como eles comemoraram, a família dela o tratando com uma cordialidade forçada, enquanto ele se sentia o homem mais sortudo do mundo.

Que tolo ele tinha sido.

Ele olhou para os rostos à sua frente: a noiva traidora, o amante arrogante, a família gananciosa.

Eles esperavam que ele baixasse a cabeça, que aceitasse a humilhação em troca de migalhas de sua futura riqueza.

Eles o viam como um homem humilde, sem poder, sem opções.

Eles estavam errados.

Naquele momento, algo dentro de Ricardo mudou para sempre. A dor ainda estava lá, mas a raiva era mais forte.

A necessidade de lutar por sua dignidade, por sua honra, tornou-se a única coisa que importava.

Ele ergueu a cabeça, e pela primeira vez, olhou para eles não como um noivo traído, mas como um inimigo.

"Não", ele disse, a voz firme e clara, cortando a tensão na sala. "Eu não vou fazer parte dessa sua sujeira."

O sorriso de Gustavo vacilou por um segundo.

A família de Juliana o encarou, chocada com sua audácia.

Eles não esperavam resistência.

Mas Ricardo não tinha mais nada a perder, eles já tinham tirado tudo dele.

Tudo, menos sua dignidade.

E por isso, ele lutaria até o fim.

            
            

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