O caminho até a casa foi um borrão de ruas e semáforos. Sofia dirigia com uma calma assustadora, as mãos firmes no volante. A raiva que sentia não era quente e explosiva, mas fria e concentrada. Cada quilômetro percorrido solidificava sua resolução. Ela não planejou o que diria ou faria. Sabia apenas que precisava ver com os próprios olhos.
Estacionou o carro a uma quadra de distância, para não alertar ninguém com o som do motor. Caminhou pela calçada arborizada, o som de música e risadas ficando mais alto a cada passo. Era a sua casa, mas parecia um território estranho, profanado.
A porta da frente estava entreaberta. Sofia empurrou-a lentamente, sem fazer barulho, e entrou. A cena na sala de estar a atingiu como um soco no estômago.
A sala estava cheia de jovens, amigos de Clara, todos bebendo e dançando. Balões com a idade de Clara flutuavam perto do teto. E ali, no centro de tudo, em seu sofá, estava Pedro com Clara no colo. Ele sussurrava algo no ouvido dela, e ela ria, jogando a cabeça para trás. A intimidade entre eles era palpável, descarada.
Um dos amigos de Clara ergueu um copo.
"Um brinde ao casal do ano! Pedro e Clara!"
Gritos de aprovação ecoaram pela sala. Pedro, então, se inclinou e beijou Clara. Não foi um beijo rápido ou discreto. Foi um beijo longo, profundo, cheio de uma paixão que ele não demonstrava por Sofia há muito tempo. A sala inteira aplaudiu.
Naquele momento, algo dentro de Sofia se partiu. A dor, a humilhação, a fúria, tudo convergiu em um único ponto. Ela caminhou para frente, seus passos firmes no chão de madeira. Ninguém a notou no início, todos estavam focados no casal.
Foi Pedro quem a viu primeiro. Seus olhos se arregalaram, a cor sumindo de seu rosto. O sorriso congelou em seus lábios. Ele tentou afastar Clara sutilmente, mas era tarde demais. O olhar dele encontrou o de Sofia, e no rosto dela, ele não viu lágrimas ou desespero. Viu apenas um desprezo gélido.
Sofia não disse uma palavra. Continuou andando até parar bem na frente do sofá. Os convidados começaram a perceber sua presença, a música parecia diminuir de volume, as conversas morreram. O silêncio se espalhou pela sala como uma onda.
Ela levantou a mão direita.
O movimento foi rápido, preciso.
PLOC!
O som do tapa estalou no silêncio pesado, ecoando pela sala. A cabeça de Pedro virou com a força do impacto. Uma marca vermelha começou a se formar em sua bochecha.
O choque foi total. Todos os olhares estavam fixos nela. Clara, que até então estava aninhada confortavelmente, olhava para Sofia com uma mistura de surpresa e raiva. A festa havia acabado.
A atmosfera, antes festiva, agora estava carregada de uma tensão insuportável. Ninguém se movia. Ninguém falava. Todos os olhos estavam pregados em Sofia, a mulher desconhecida que ousara interromper a celebração com um ato de violência tão direto e chocante. A única coisa que se ouvia era a respiração pesada de Pedro, que ainda tinha a mão no rosto, o choque estampado em seus olhos.
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