Ele parou, os olhos fixos em mim, uma súbita recordação a brilhar neles. "O teu avô... ele deu-te um amuleto da sorte há anos. Um pequeno frasco com um antídoto universal, uma dose única. Tu ainda o tens, não tens?"
Eu assenti em silêncio.
"Bethany, por favor," ele implorou, agarrando as minhas mãos. A sua força era desesperada. "Dá-mo. Eu juro, depois disto, eu dedico a minha vida a ti. Eu protejo-te para sempre. A Raelyn não será mais um problema."
Eu olhei para ele, para o homem que eu amava, a implorar pela vida de outra mulher.
Tirei o pequeno frasco de prata do meu cofre. Era o meu tesouro, um presente do meu avô. Entreguei-lho.
"A minha condição," eu disse, a voz firme, "está escrita neste papel. Lê-o no dia do meu casamento."
Entreguei-lhe um envelope selado. Ele pegou no antídoto e no envelope, mal olhando para o segundo.
"Obrigado, Bethany. Eu devo-te a vida," disse ele, beijando a minha testa apressadamente antes de correr para a porta.
Ele nem olhou para trás.
A sua atenção estava toda nela. Eu era apenas um meio para um fim, a fornecedora do salva-vidas. Fiquei ali, na sala vazia, sentindo-me supérflua. Afastei-me silenciosamente da janela, vendo o seu carro desaparecer.
Fui até à lareira. Abri uma caixa de madeira cheia de fotografias nossas, cartas de amor, pequenas recordações de uma vida inteira. Peguei numa cópia do bilhete que lhe tinha dado.
As palavras eram simples, escritas com a minha caligrafia: "Leonel Gordon e Bethany Hayes, que nunca mais se encontrem nesta vida."
Joguei o bilhete para as chamas, observando-o a enrolar-se e a tornar-se cinza. Depois, uma a uma, atirei todas as memórias para o fogo. O calor na minha cara não conseguia aquecer o gelo no meu coração.
Lembrei-me da promessa dele, feita há tantos anos. Ele tinha-me dado um anel de filigrana, um protótipo que eu desenhara. "Um dia, Bethany, eu vou colocar o véu de noiva em ti. Serás a minha única noiva."
Agora, o meu design de casamento, um conjunto de filigrana único que eu criava para nós, estava na minha secretária, inacabado. Um monumento a um futuro que nunca existiria.
Uns dias depois, fui à quinta dos Gordon para recolher as minhas últimas coisas. Ouvi duas empregadas a cochichar no corredor.
"O Sr. Leonel é tão bom para a menina Raelyn. Deu-lhe o quarto de hóspedes principal, com vista para o rio."
"E ouvi dizer que ele comprou as ações daquela boutique que ela adora. Disse que era um presente para a fazer sentir-se melhor."
O quarto principal. Ações de uma boutique. Isto ia muito além de um "pequeno apartamento". Ele estava a dar-lhe o mundo, enquanto me pedia paciência.
Entrei no meu antigo estúdio na quinta. O meu coração parou.
O conjunto de joias de filigrana estava em pedaços no chão. O colar partido, os brincos esmagados, a filigrana delicada torcida e irreconhecível.
Raelyn estava sentada no chão, a chorar. Ao meu lado, a governanta, a Sra. Almeida, uma mulher leal à família Hayes há décadas, olhava para a cena com fúria.
"Menina Bethany, foi ela! Eu vi-a! Ela entrou aqui e destruiu tudo!" acusou a Sra. Almeida.
Eu olhei para Raelyn, que parecia a própria imagem da inocência ferida. "Eu só queria ver... escorreguei e caí sobre eles. Foi um acidente," soluçou ela.
Eu sabia que era mentira. Mas confrontá-la só levaria a mais um drama, mais uma vez em que Leonel teria de a "proteger" de mim.
"Não faz mal, Sra. Almeida. Eu arranjo," disse eu, a voz cansada.
Nesse momento, a porta abriu-se. Leonel entrou, o seu olhar passando da destruição no chão para o rosto choroso de Raelyn, e depois para mim.
Raelyn, vendo-o, pegou num caco afiado de um espelho partido no chão e, antes que alguém pudesse reagir, passou-o pelo seu próprio braço. Um corte superficial, mas sangrento.
"Ah!" ela gritou, mais de surpresa do que de dor.
Leonel correu para ela, ignorando-me completamente. Ele viu o caco, o sangue, e o meu rosto chocado. A sua conclusão foi instantânea e errada.
"Bethany!" A sua voz era uma mistura de descrença e acusação. "Como pudeste? Ela é frágil! O que é que ela te fez para a tratares com tanta crueldade?"
Ele olhou para mim como se eu fosse um monstro, como se não me conhecesse. A sua descrença na minha inocência era a ferida mais profunda de todas.