Ela se agarrou à sua força recém-descoberta, a força de uma mãe protegendo seu filhote ferido. Ela não podia desmoronar. Não agora. Não na frente dele.
João pareceu relaxar, a mentira era plausível o suficiente para sua mente egocêntrica. Ele nunca imaginaria que ela seria capaz de enganá-lo. Para ele, ela sempre fora um livro aberto, ingênuo e fácil de ler.
"Ah, claro. Você precisa ter cuidado, querida" , ele disse, tentando pegar o braço dela. Maria se afastou sutilmente, um movimento quase imperceptível.
Ele não percebeu, ou escolheu ignorar. Sua confiança voltou rapidamente.
"Eu estava ao telefone com a Sofia" , ele disse casualmente, testando as águas. "Com a melhora da Clara, pensei que talvez fosse uma boa hora para elas virem ficar conosco por um tempo. Assim eu posso cuidar de todas vocês."
A audácia dele era inacreditável. Trazer a amante e a filha dela para a casa que ele destruiu, para o lar que ele profanou com seu crime. A raiva queimou dentro de Maria, quente e violenta, mas seu rosto permaneceu calmo, uma máscara de indiferença.
Pedro se encolheu atrás dela, segurando a barra de sua camisola de hospital com força.
Para o completo choque de João, Maria assentiu.
"Claro" , ela disse, a voz vazia de emoção. "Por que não?"
João piscou, pego de surpresa. Ele esperava resistência, talvez lágrimas, uma discussão. A concordância fácil dela o desarmou. Ele não conseguia entender. Ele interpretou isso como submissão, como um sinal de que ela finalmente havia aceitado seu lugar.
Ele não poderia estar mais enganado. O "sim" dela não era rendição. Era uma declaração de guerra.
"Ótimo! Maravilhoso!" , ele exclamou, um sorriso largo e genuíno se espalhando por seu rosto. "Vou ligar para ela agora mesmo e arranjar tudo."
Ele se afastou, já discando o número no celular, completamente alheio à tempestade que se formava bem na sua frente.
Assim que ele virou a esquina do corredor, a força de Maria a abandonou. Ela se apoiou na parede, as pernas tremendo. As lágrimas que ela segurava com tanta força finalmente escaparam, escorrendo silenciosamente por seu rosto. A dor era física, uma pressão esmagadora em seu peito. Ela soluçou silenciosamente, o corpo tremendo com a dor da traição.
Ela sentiu uma mãozinha em seu braço.
"Mãe, não chora" , sussurrou Pedro. "Nós vamos embora, não vamos?"
Maria olhou para o filho, para a seriedade em seus olhos jovens, olhos que tinham visto demais. Ela enxugou as lágrimas e o abraçou com força.
"Sim, meu amor" , ela sussurrou de volta, a voz rouca. "Nós vamos embora. Para bem longe daqui."
Naquela noite, de volta ao quarto do hospital, enquanto João estava fora, "resolvendo negócios" , Pedro fez algo que partiu o coração de Maria em mil pedaços. Ele pegou seu caderno de desenho, o caderno que ele amava, cheio de desenhos de sua família. Desenhos dele, de Maria e de João, todos sorrindo sob um sol amarelo.
Com uma determinação sombria, ele começou a rasgar cada página que continha a figura de seu pai. Ele rasgou os desenhos em pedaços minúsculos, as mãozinhas tremendo de raiva e dor. O som do papel se rasgando era o único som no quarto silencioso. Era o som de uma infância sendo destruída, de um amor sendo aniquilado.
Um dos pedaços de papel caiu no chão. Era parte de um diário que ele tentava manter. Maria o pegou. A caligrafia infantil e trêmula contava uma história devastadora.
"Hoje o papai me visitou. Ele me trouxe meu carrinho de corrida favorito. Ele disse que eu fui muito corajoso no acidente. Eu amo o papai. Ele é meu herói."
Essa anotação era de alguns dias atrás.
Ela pegou outro pedaço. A data era de ontem.
"O papai não veio hoje. Ele disse que estava ocupado. A enfermeira disse que eu tenho uma cicatriz grande na minha barriga. Dói. Eu sinto falta do papai."
E então, o último pedaço, presumivelmente escrito mais cedo naquele dia, depois de ouvirem a conversa.
"Papai mentiu. Não teve acidente. Ele me machucou. Ele machucou a mamãe. Eu odeio ele. Eu não tenho mais um pai."
As lágrimas de Maria voltaram, mas desta vez, elas eram diferentes. Eram lágrimas de fúria. Ver a dor de seu filho, a perda de sua inocência escrita em palavras tão simples e cruéis, solidificou sua decisão.
Não era mais apenas sobre ir embora. Era sobre justiça.
Ela olhou para a pilha de papel rasgado, os restos de uma felicidade que nunca foi real.
"Nós vamos embora, Pedro" , ela disse, a voz agora dura como aço. "E ele vai pagar por cada lágrima que você derramou."