A ironia era dolorosa. Ele estava disposto a me matar para salvar outra mulher.
Quando recebi alta, a primeira coisa que fiz não foi ir para casa. Peguei um táxi e fui para a universidade. Eu precisava vê-la. Eu precisava ver a mulher por quem Thiago me destruiu, duas vezes.
Encontrei Laura facilmente. Ela estava sentada sob uma árvore no campus, lendo um livro. Parecia exatamente como eu me lembrava das fotos que Thiago guardava: jovem, bonita, com um ar de inocência e fragilidade que a fazia parecer uma boneca de porcelana. Ela usava um vestido branco simples e seu cabelo comprido caía sobre os ombros.
Ela parecia... gentil.
Isso tornou tudo mais difícil. Era mais fácil odiar um monstro óbvio. Mas Laura parecia a personificação da doçura.
Eu a observei de longe, meu coração uma pedra de gelo no peito. Eu estava prestes a ir embora quando um garoto de skate passou em alta velocidade, perdendo o controle. Ele estava vindo direto na minha direção.
Eu congelei, meu corpo ainda fraco demais para reagir a tempo.
De repente, alguém me empurrou para o lado com força. Eu caí na grama, e a pessoa que me empurrou caiu ao meu lado com um grito de dor.
Era Laura.
O skate tinha atingido sua perna. Ela estava no chão, o rosto pálido de dor, segurando o tornozelo.
"Você está bem?", ela perguntou, sua voz trêmula, mas seus olhos cheios de preocupação genuína. Comigo.
Eu fiquei chocada. Ela se machucou para me salvar. A mulher que, na minha vida passada, sorriu enquanto uma bomba contava os segundos para a minha morte, acabou de me salvar de um acidente estúpido.
Minha mente girou. Isso fazia sentido? As memórias estavam erradas? Ou isso era apenas outra forma de manipulação, mais sutil e confusa do que antes?
"Eu... eu estou bem", gaguejei, me levantando. "Você está machucada."
"Não foi nada", ela disse, tentando sorrir, mas fazendo uma careta de dor. "Fico feliz que você não tenha se machucado."
Eu a ajudei a se sentar em um banco próximo. Seu tornozelo já estava inchando. A sinceridade em seus olhos me desarmou. A linha entre vítima e vilã ficou turva, e eu me senti perdida.
Mas então eu me lembrei do fogo. Lembrei-me do desprezo de Thiago. Não importava se Laura era um anjo ou um demônio. O problema era Thiago e o que ele estava disposto a fazer por ela.
Nada mudou o fato de que meu casamento era uma prisão e meu marido era meu carrasco.
Eu a deixei lá, prometendo chamar ajuda, e fui embora. A confusão deu lugar a uma resolução fria.
Naquela noite, quando cheguei em casa, a casa estava vazia e silenciosa, como sempre. Fui direto para o escritório de Thiago. Em sua mesa, encontrei o que procurava: os papéis do divórcio. Ele os tinha preparado há muito tempo, apenas esperando o momento certo. Talvez quando eu não fosse mais útil.
Peguei uma caneta. Minha mão não tremeu.
Liguei para ele. Ele atendeu no terceiro toque, sua voz impaciente. "O que foi?"
"Eu quero o divórcio", eu disse, sem rodeios.
Houve uma pausa do outro lado da linha. Eu esperava uma discussão, raiva, qualquer coisa. Em vez disso, ouvi um suspiro de alívio.
"Tudo bem", ele disse, sua voz casual, como se estivéssemos discutindo o tempo. "Deixe os papéis na minha mesa. Eu os assinarei quando voltar."
"Não precisa se preocupar", eu disse, olhando para os papéis em minhas mãos. "Eu já assinei por você."
Com um floreio deliberado, eu escrevi o nome dele na linha pontilhada. Thiago. A caligrafia era uma imitação perfeita, praticada ao longo de cinco anos de uma devoção tola.
"O que você quer dizer?", ele perguntou, um tom de irritação em sua voz.
"Quero dizer que está feito. Eu vou embora. Não quero nada de você. Apenas minha liberdade."
Desliguei antes que ele pudesse responder.
Olhando para a assinatura dele, forjada pela minha própria mão, um sorriso amargo tocou meus lábios. Por cinco anos, eu vivi como sua sombra, sua posse. Assinar o nome dele foi o primeiro ato de verdadeira rebelião. Foi um ato de roubo, pegando de volta a vida que ele me negou.
Estava acabado.
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