Rejeição e Um Novo Começo
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Capítulo 4

Levei o pacote da USP para o meu quarto e o abri com cuidado. Dentro, havia uma camiseta com o logo da faculdade, um manual do calouro, um mapa do campus e uma carteirinha de estudante provisória com meu nome e foto. Olhei para aquela carteirinha por um longo tempo. Era a prova física da minha decisão, do meu novo futuro. Guardei tudo na gaveta, em segurança.

Mais tarde, desci para beber água e ouvi vozes vindo da sala. Eram Sofia e Camila, e, para meu horror, Gabriel estava com elas. Ele estava sentado no meu sofá, folheando um dos meus livros de arte, como se fosse o dono da casa.

"Esse livro é incrível, João Vítor", disse ele, sem levantar o olhar. "Você tem bom gosto."

"Não toque nas minhas coisas", eu disse, a voz cortante.

Ele levantou a cabeça, fingindo surpresa. "Qual é o problema? Só estou olhando."

"O problema é que você não tem permissão para estar aqui, muito menos para mexer no que é meu", retruquei, indo até ele e tirando o livro de suas mãos.

"João!", gritou Sofia, levantando-se. "Para de tratar ele assim! Ele é nosso convidado!"

"Não na minha casa", afirmei.

"Você está sendo ridículo!", disse Camila, defendendo-o. "O Gabriel só estava elogiando o seu livro!"

Gabriel se encolheu no sofá, assumindo sua persona de vítima. "Deixa pra lá, meninas. Eu não devia ter tocado. A culpa é minha. É que eu nunca tive acesso a livros tão bonitos. Na minha casa a gente mal tinha o que comer."

Era sempre a mesma história, o mesmo apelo à pena. E elas, como sempre, caíam.

Enquanto a discussão se acalorava, a empregada, Dona Cida, entrou na sala segurando os pedaços de um vaso de cerâmica quebrado. Era um vaso que eu mesmo tinha feito numa aula de artes, e ficava na mesinha de centro.

"Menino João, me desculpe", disse ela, aflita. "Eu estava limpando e o moço aqui", ela apontou para Gabriel, "tropeçou no fio do aspirador e derrubou o vaso."

Meu olhar foi de Dona Cida para Gabriel. Ele empalideceu.

"Não foi minha culpa!", ele disse rapidamente. "Ela que deixou o fio no meio do caminho!"

"Gabriel, você está bem? Se machucou?", perguntou Sofia, correndo até ele e ignorando completamente o vaso quebrado e a aflição de Dona Cida.

"Eu me assustei um pouco, mas estou bem", ele disse, fazendo uma careta de dor.

"Foi você que quebrou?", perguntei a Gabriel, a voz perigosamente calma.

"Foi um acidente!", ele se defendeu.

"Não importa, João Vítor! Foi um acidente!", disse Camila. "É só um vaso. A gente compra outro."

"Não dá pra comprar outro", eu disse, sentindo a raiva queimar dentro de mim. "Fui eu que fiz. Tinha um valor sentimental."

"Ai, que exagero. Você está fazendo uma tempestade num copo d'água por causa de um vaso feio", disse Sofia, com desdém.

Aquelas palavras me atingiram com força. "Vaso feio". Ela nem se lembrava. Foi um presente que eu dei para ela e Camila quando tínhamos doze anos, para simbolizar nossa amizade "inquebrável". Elas o devolveram para mim anos depois, dizendo que não combinava com a decoração do quarto delas.

Eu não disse mais nada. Apenas peguei os cacos da mão de Dona Cida. "Tudo bem, Dona Cida, a culpa não foi sua", falei, gentilmente. Depois, olhei para os três. "Podem ir embora. Agora."

"A gente não vai a lugar nenhum até você pedir desculpas ao Gabriel por ter sido tão grosso!", exigiu Camila.

Eu ri. Uma risada amarga e alta. Joguei os cacos do vaso no lixo. "Vão embora", repeti, abrindo a porta da sala.

Eles saíram, bufando de raiva. Sofia e Camila me olhavam com decepção, como se eu fosse o monstro da história. Gabriel, por sua vez, me lançou um olhar rápido por cima do ombro. Não era um olhar de vítima. Era um olhar de triunfo. Ele estava conseguindo exatamente o que queria: me isolar, me transformar no vilão, e ficar com elas só para ele. A determinação de ir embora ficou ainda mais forte. Eu precisava sair daquele ambiente tóxico, daquela teia de aranha que ele tecia ao redor delas.

Naquela noite, houve outra festa. Fui obrigado a ir novamente, por uma chantagem emocional de Camila que disse que se eu não fosse, ela contaria aos meus pais que eu estava "entrando em depressão". Chegando lá, o cenário de sempre. Gabriel era o centro das atenções. Sofia e Camila o paparicavam, riam de suas piadas sem graça, enchiam seu copo.

Eu fiquei num canto, observando. Em um determinado momento, vi Sofia ajeitando a gola da camisa de Gabriel com uma intimidade que me revirou o estômago. Camila, ao lado, sorria, aprovando a cena. Eles pareciam um casal, com Camila como a madrinha feliz. E eu era apenas um espectador indesejado daquele espetáculo deprimente.

Alguém passou por mim e comentou com um amigo: "Olha lá o trio. Parece que virou a dupla dinâmica e o coadjuvante". A pessoa riu. Eu não. Apenas me virei e fui pegar uma bebida, tentando ignorar o nó que se formava na minha garganta.

Mais tarde, durante um jogo idiota de "verdade ou desafio", alguém me perguntou sobre meus planos para o futuro. Antes que eu pudesse responder, Gabriel disse em voz alta: "Ah, o João Vítor, a Sofia e a Camila são um grude só. Vão para a PUC juntos, viver o sonho carioca. Inseparáveis."

Todos olharam para mim, esperando uma confirmação. Eu apenas sorri um sorriso vazio e disse: "É, as coisas mudam. Às vezes, o melhor a fazer é deixar para trás o que não te serve mais."

Ninguém entendeu a profundidade daquelas palavras. Eles riram, pensando que era uma piada. Mas Sofia e Camila me olharam com uma ponta de preocupação. Elas sentiram, pela primeira vez, que algo estava realmente errado.

            
            

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