A notificação piscou no canto da tela do meu laptop, uma mensagem de um velho amigo da faculdade, Leo.
"Cara, você precisa ver isso. Hilário."
Junto com a mensagem, havia um link. Eu estava no meio do trabalho, planilhas e relatórios espalhados pela mesa, mas a procrastinação venceu. Um clique não faria mal.
A página demorou um pouco para carregar, exibindo apenas um fundo preto e um logotipo estranho, uma espécie de máscara estilizada. Parecia um fórum antigo, um daqueles cantos esquecidos da internet. O nome era vago, algo como "O Clube Secreto" .
Uma sensação de desconforto começou a se formar na boca do meu estômago. Aquilo não parecia um site de memes.
A página finalmente carregou, e um feed de imagens e gifs apareceu. Meu primeiro impulso foi fechar a aba. Eram fotos de mulheres, claramente tiradas sem que elas soubessem. Fotos em academias, no transporte público, em provadores de lojas. A legenda de uma delas dizia: "Olha a vizinha gostosa do 302" . Outra mostrava uma mulher de saia em uma escada rolante, com um comentário nojento embaixo.
Senti uma onda de repulsa. Que tipo de gente doente frequentava um lugar desses?
Eu já estava movendo o cursor para o "x" da aba quando uma imagem em particular me fez parar. A qualidade era ruim, granulada, como se tivesse sido tirada com um celular antigo e com zoom no máximo. Era uma mulher deitada de lado em uma cama, dormindo. Ela usava uma camiseta larga, e o lençol cobria a maior parte do seu corpo, mas seu rosto estava visível, virado para a câmera.
Meu coração parou por uma fração de segundo.
Não podia ser. Era só alguém parecido.
Mas então meus olhos focaram em um detalhe. Um pequeno ponto prateado brilhando em seu pescoço. Era um colar. Um colar com um pingente minúsculo em forma de lua.
O colar que eu dei para Ana no nosso aniversário de cinco anos de noivado.
O ar sumiu dos meus pulmões. O quarto, antes quente, de repente ficou gelado. Meu estômago se revirou violentamente, e eu senti um gosto amargo na boca. Era ela. Era a minha Ana. A mulher com quem eu ia me casar em seis meses.
Minhas mãos tremiam tanto que eu mal conseguia segurar o mouse. Cliquei na imagem para ampliá-la, rezando para estar errado, para ser uma coincidência cruel. Mas não era. Cada detalhe do seu rosto, a pequena pinta perto do lábio, a forma como seu cabelo caía sobre o travesseiro. Era ela. Sem dúvida alguma.
Um zumbido começou nos meus ouvidos, abafando todos os outros sons. Eu rolei para baixo, para a seção de comentários, e o que eu li me fez querer vomitar.
"Essa aí tem cara de quem gosta."
"Quem foi o sortudo que pegou?"
"Manda mais! Mostra o resto!"
"O noivo dela deve ser um corno manso."
A última frase me atingiu como um soco. Humilhação e uma raiva cega tomaram conta de mim. Eu queria socar a tela, quebrar o laptop, gritar até minha garganta ficar em frangalhos. Como aquilo foi parar ali? Quem tirou aquela foto?
Minha mente corria a mil por hora, cada pensamento mais doloroso que o anterior. Ela me traiu? Quem era o homem que estava no quarto com ela, tirando essa foto enquanto ela dormia? A imagem era íntima, vulnerável. Não era uma foto tirada por um estranho na rua.
Meu primeiro instinto foi ligar para ela, gritar, exigir uma explicação. Mas uma parte de mim, uma parte fria e repentinamente calculista, me parou. Eu não podia simplesmente explodir. Não ainda. Eu precisava de provas. Eu precisava entender o que diabos estava acontecendo.
Com os dedos trêmulos e os nós brancos de tanta força, comecei a agir. Abri um software de gravação de tela. Gravei tudo. Rolei por cada comentário nojento, cada imagem. Tirei screenshots de tudo, salvando em uma pasta escondida no meu computador. Cada clique era uma tortura, me forçando a olhar para a imagem da minha noiva sendo exposta e humilhada para um bando de anônimos doentes.
Enquanto eu salvava a última imagem, meu celular vibrou na mesa. Era uma mensagem de Ana.
"Pensando em você, meu amor. Mal posso esperar pra chegar em casa."
A mensagem veio acompanhada de um emoji de coração.
Olhei para a tela do celular, para as palavras de carinho, e depois para a tela do computador, para a sua imagem exposta. A dissonância era tão brutal, tão avassaladora, que eu senti como se estivesse sufocando. Um nó se formou na minha garganta, e eu tive que me segurar na mesa para não cair.
A mulher que me mandava uma mensagem de amor era a mesma que estava sendo objetificada naquele esgoto online. Ou talvez, e esse pensamento era o mais aterrorizante de todos, ela não fosse a mulher que eu pensava conhecer.