Capítulo 4

As risadas e os comentários maldosos continuaram, mas eu os ignorei. Minha atenção estava dividida entre o relógio e a porta bloqueada. Eu mantive a calma, uma tranquilidade externa que escondia a urgência que eu sentia. Essa atitude parecia desarmá-los; eles esperavam uma explosão, uma briga, mas recebiam apenas um silêncio calculista.

Minha voz saiu mais fria do que eu pretendia.

"Ricardo, essa é a sua última chance. Diga aos seus homens para saírem da minha frente."

Ele cruzou os braços, um sorriso arrogante estampado no rosto.

"Ou o quê? O que você vai fazer? Vai me acertar com sua guitarrinha imaginária? Vai escrever uma canção triste sobre como sua vida é um fracasso?"

Ele se virou para a plateia de colegas, que riam e apoiavam seu show de humilhação. Gabriela o olhava com adoração, como se ele fosse um deus.

Pedro se aproximou de mim novamente, sussurrando desesperadamente.

"João, por favor, cara. Só pede desculpas. Diz que você estava errado. A família dele é uma das mais ricas e influentes da cidade. Eles podem acabar com você com um telefonema. Você não sabe no que está se metendo."

Eu apreciei a preocupação de Pedro, mas ele não entendia. Nenhum deles entendia.

Na minha mente, eu repassava os detalhes do contrato que eu havia recebido. As passagens de avião para Berlim já estavam compradas. O adiantamento já estava na minha conta. Os diretores da Academia de Música mais renomada da Europa estavam vindo para este restaurante, hoje, para me encontrar e finalizar os últimos detalhes pessoalmente, como um gesto de respeito. E eu estava preso aqui, em um circo patético montado por um garoto mimado cuja única conquista era ter nascido na família certa.

A raiva deu lugar a um sentimento de pena. Pena da superficialidade deles, da necessidade de diminuir os outros para se sentirem grandes. Eles mediam o mundo com réguas de notas do ENEM e saldos bancários, e não conseguiam enxergar nada além disso. O verdadeiro poder, o verdadeiro valor, era invisível para eles. E era esse poder invisível que estava prestes a atropelá-los.