Luana olhou para ele, para o homem que amava há três anos. O homem charmoso, de família rica, que parecia ter o mundo aos seus pés. Ela sentiu o coração apertar. Não de dúvida, mas de uma compaixão imensa.
"Calma, meu amor. Calma. Nós vamos dar um jeito. Você tem a mim."
Ela o abraçou, sentindo os ombros dele tensos. Não hesitou por um segundo. A confeitaria dela era um sucesso, ela tinha economias, um nome no mercado. Podia sustentá-los até ele se reerguer.
"Eu vou fechar a loja por um tempo" , ela disse, com a decisão se formando rapidamente em sua mente. "Vou pegar todo o dinheiro que guardei. A gente pode recomeçar. Abrir algo menor, mais simples. Uma padaria de bairro, talvez? Até você resolver suas coisas."
Pedro a olhou, os olhos brilhando.
"Você faria isso por mim, Luana?"
"É claro que eu faria" , ela respondeu, beijando o rosto dele. "A gente está junto nisso."
Em menos de um mês, a "Doce Luana" , com suas vitrines elegantes e doces finos, fechou as portas. Luana liquidou o estoque, encerrou contratos e juntou cada centavo que tinha. Ela entregou tudo para Pedro.
Eles alugaram um pequeno ponto num bairro operário, um lugar que cheirava a graxa e a comida barata. A nova vida de Luana começava antes do sol nascer.
O cheiro agora não era de baunilha francesa e chocolate belga, mas de fermento e farinha barata. Suas mãos, antes acostumadas com a delicadeza de um macaron, agora estavam ásperas e doloridas de sovar pão de sal. O calor do forno industrial era implacável, grudando o cabelo em seu rosto suado.
Ela trabalhava dezesseis horas por dia. Pedro "ajudava" , mas passava a maior parte do tempo no celular, supostamente tentando resolver seus "negócios falidos" . Luana não reclamava. Ela amassava, assava, limpava o chão, atendia no balcão. Via o cansaço no espelho, as olheiras fundas, as unhas quebradas. Mas via também o dinheiro entrando.
A padaria, com seus pães quentinhos e o sorriso cansado mas genuíno de Luana, começou a fazer sucesso no bairro. As pessoas gostavam dela. Em seis meses, a caixa registradora estava sempre cheia no fim do dia. Ela guardava todo o dinheiro numa caixa de sapatos debaixo da cama do pequeno apartamento que dividiam.
Era para o futuro deles. Para quando Pedro se reerguesse.
Numa terça-feira chuvosa, o movimento estava fraco. Luana estava limpando o balcão quando a porta dos fundos, que dava para um beco, se abriu. Pedro entrou, rindo ao telefone. Ele não a viu ali.
"Cara, você não acredita. A padaria está bombando. A 'padeira' aqui leva jeito pra coisa."
Luana parou, o pano sujo na mão. A voz era de Pedro, mas o tom era diferente. Zombeteiro.
Ela se escondeu atrás de uma prateleira de pães, o coração começando a bater de um jeito estranho.
A voz do outro lado da linha era alta o suficiente para ela ouvir. Era Gustavo, o melhor amigo de Pedro.
"E aí? Ela já juntou quanto nessa brincadeira de pobre?"
Pedro soltou uma gargalhada.
"Quase duzentos mil. A idiota guarda tudo numa caixa de sapatos. Acha que é pra 'nossa padaria dos sonhos' ."
Luana sentiu o ar faltar. Padeira? Idiota? Caixa de sapatos?
O que estava acontecendo?
"Duzentos mil? Porra, Pedro! Isso paga a entrada do carro novo da Isabela. Você é um gênio, cara. Fazer a confeiteirazinha de luxo virar padeira de bairro pra bancar sua vida... épico."
O nome "Isabela" caiu como uma pedra no estômago de Luana. Isabela era a socialite com quem Pedro dizia que não tinha mais contato.
Pedro continuou, a voz pingando desprezo.
"Qual é, Gustavo. Eu precisava desse dinheiro. E foi divertido, vai. Ver a princesinha toda orgulhosa das mãos cheias de calos, cheirando a fermento... Ela realmente acreditou que eu tinha falido. Que eu, Pedro Alcântara, ia acabar meus dias vendendo pão de sal num muquifo desses."
Ele cuspiu no chão do beco.
"Ela é tão patética. Tão... comum. Mas tenho que admitir, o dinheiro que essa 'padeira' faz tem um cheiro ótimo."
A risada dos dois homens ecoou pelo beco. Para Luana, soou como o barulho de seu mundo se partindo em mil pedaços. Ela ficou paralisada, o pano caindo de sua mão no chão sujo de farinha.