Amor e Traição em Pães
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Capítulo 3

O som da porta da frente se abrindo e fechando indicou que Pedro havia entrado na loja. Luana permaneceu imóvel, escondida atrás da prateleira. Sua mente, antes um turbilhão de dor e confusão, agora estava estranhamente clara. O choque deu lugar a uma frieza cortante.

Acabou.

Não haveria gritos, não haveria lágrimas na frente dele. Ela não lhe daria essa satisfação.

Ela esperou, contando os segundos, até ouvir a voz dele chamando da loja.

"Lu? Cadê você? Vou dar uma saída rápida, resolver umas coisas, tá?"

Resolver umas coisas. Comprar a entrada do carro de Isabela, talvez? Planejar a festa de noivado?

Luana não respondeu. Segurou a respiração até ouvir a porta da frente se fechar novamente.

Então, ela se moveu.

Sua primeira ação foi caminhar até a caixa registradora. Ela a abriu. Estava cheia com as vendas do dia. Ela pegou todo o dinheiro, notas e moedas, e enfiou nos bolsos do avental.

Depois, foi até a porta dos fundos e a trancou. Voltou para a loja e trancou a porta da frente, virando a placa para "Fechado" .

O lugar ficou silencioso. Só se ouvia a sua respiração.

Ela olhou ao redor. Para as paredes que pintou, para o balcão que lixou, para os fornos que limpava todos os dias. Tudo comprado com o dinheiro dela. Cada saco de farinha, cada quilo de açúcar.

O preço do seu sacrifício estava ali, em cada detalhe daquela padaria humilde. E o preço da sua humilhação também.

Luana subiu as escadas para o pequeno apartamento que ficava em cima da loja. O lugar era simples. Um quarto, uma pequena sala, uma cozinha. Pedro nunca se preocupou em decorar. Agora ela entendia o porquê. Para ele, era um cenário temporário. Um lugar de passagem.

Ela foi direto para o quarto. Ignorou a cama desarrumada, as roupas dele jogadas numa cadeira. Ajoelhou-se e puxou a caixa de sapatos de debaixo da cama.

Abriu a tampa.

Lá estava. Maços de notas de cinquenta e cem reais, organizados com elásticos. O fruto de seis meses de trabalho desumano. Quase duzentos mil reais. O fundo para a festa de noivado dele.

Ela olhou para o dinheiro, e pela primeira vez, não sentiu orgulho. Sentiu raiva. Uma raiva fria e calculada.

Começou a arrumar suas coisas. Não tinha muito. Algumas roupas, seus livros de receita, um porta-retratos com uma foto dela e de Dona Clara, sua mestra. Ela colocou tudo em uma mala velha.

Enquanto esvaziava sua gaveta, encontrou um colar que Pedro lhe dera no primeiro aniversário de namoro. Era uma peça delicada, de prata. Na época, ela achou o gesto lindo. Agora, olhando para ele, via apenas o seu valor material. Barato. Falso. Como tudo nele.

Ela se lembrou das promessas dele, sussurradas no escuro. "Um dia, Lu, vou te dar um castelo. Você vai ser minha rainha."

Ela riu, um som seco e sem alegria. Rainha de um castelo de mentiras, construído com o dinheiro do seu trabalho.

Ela pegou a caixa de sapatos. O dinheiro era pesado. Era o peso da sua ingenuidade.

Parou em frente ao espelho do guarda-roupa. A mulher que a encarava de volta parecia uma estranha. Pálida, magra, com uma expressão dura. O brilho em seus olhos tinha se apagado.

A confeiteira talentosa, a empresária de sucesso, tinha desaparecido. Em seu lugar, estava a "padeira" .

E naquele momento, Luana percebeu a verdade mais cruel de todas. Ela não tinha perdido apenas seu dinheiro e seu negócio. Ela tinha perdido a si mesma.

Ela olhou ao redor do apartamento minúsculo. Não havia nada ali que fosse verdadeiramente "deles" . As poucas coisas de valor eram dele. As coisas simples, do dia a dia, eram dela. A comida na geladeira, os produtos de limpeza, as contas pagas.

Ela tinha construído uma vida inteira em cima de uma mentira. Tinha regado com seu suor e lágrimas um amor que nunca existiu.

E agora, com uma mala na mão e uma caixa de sapatos cheia do dinheiro da sua humilhação, ela não tinha nada. Absolutamente nada. Nem mesmo as memórias, porque agora todas elas estavam manchadas pela verdade.

Ela sentia um vazio imenso. Um buraco negro onde antes havia amor e esperança. Mas no fundo desse buraco, uma pequena chama começava a se acender. A chama da raiva. E da sobrevivência.

            
            

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