Minha cabeça ainda latejava, mas a clareza da situação me mantinha de pé. Eu precisava de água. Fui em direção à cozinha do iate, movendo-me lentamente, ainda representando meu papel de indisposta. Ao passar por uma das cabines de luxo, a porta estava entreaberta. A voz de Luiza, baixa e urgente, veio de dentro.
"...ela não quer ir! Ela disse que vai ficar no iate!"
Parei, encostando o ouvido na porta de madeira polida.
A voz de Carla respondeu, fria e irritada. "Isso não é uma opção. O acordo era claro. Ela precisa estar na água. Como vamos fazer parecer um acidente se ela estiver tomando sol no convés?"
Acidente.
A palavra ecoou na minha mente, confirmando meu pior medo.
"Eu não sei!" , a voz de Luiza era quase um choro. "Ela está desconfiada! Ela me acusou de drogá-la!"
"Incompetente" , Carla cuspiu a palavra. "Eu te disse para ser sutil. Agora resolva. Eu não investi tempo e dinheiro nisso para você estragar tudo na última hora. Pense na herança, Luiza. Pense na vida que você terá quando ela não estiver mais no caminho."
A herança.
A herança dos nossos pais. Uma quantia considerável, que eu administrava com cuidado para garantir o futuro de Luiza. Um futuro que ela estava disposta a roubar, passando por cima do meu cadáver.
A dor da traição me atingiu com a força de um soco no estômago. Não era sobre controle, não era sobre liberdade. Era sobre dinheiro. Pura e simples ganância. Minha própria irmã, a garotinha que eu criei, estava conspirando para me matar por dinheiro.
Tudo se encaixou. A insistência na viagem, a pulseira, a cumplicidade na festa, a bebida batizada. O plano era me levar para o recife perigoso, sabotar meu equipamento e deixar que o oceano fizesse o resto. Um trágico acidente de mergulho. Ninguém jamais suspeitaria.
Um ruído atrás de mim me fez recuar da porta. Um dos tripulantes passou pelo corredor, me cumprimentando com um aceno de cabeça. Sorri de volta, o rosto uma máscara de normalidade enquanto meu mundo desmoronava.
Voltei para a minha cabine, o coração pesado. A urgência de escapar era esmagadora. Olhei para o meu equipamento de mergulho, encostado em um canto. Ajoelhei-me para inspecioná-lo. O manômetro, que media a pressão do ar no tanque, estava adulterado. O ponteiro marcava "cheio", mas eu sabia que o tanque estava quase vazio. Na minha vida anterior, eu só percebi isso tarde demais. E a válvula do meu tanque de reserva estava emperrada, completamente inutilizável. Estava colada.
Elas tinham planejado tudo nos mínimos detalhes.
Eu estava presa. Presa em um iate no meio do nada com duas pessoas que queriam me matar. Tentar pular e nadar para a costa era suicídio. A correnteza era forte e a terra mais próxima estava a quilômetros de distância.
Eu teria que seguir com o plano. Teria que entrar na água. Mas desta vez, eu estaria preparada.