Mentira. Ele sabia que ela estava com Rodrigo. Ele desligou o telefone, o nojo revirando seu estômago. Ele se arrastou para o trabalho, o corpo pesado de exaustão e tristeza. O sol da manhã parecia ofensivo, a alegria das crianças que visitavam o parque, uma afronta. Ele se sentia um fantasma, vagando por um mundo que não era mais seu.
Mal tinha começado a podar umas roseiras quando seu celular tocou novamente. Era um número desconhecido. Ele atendeu, a voz cansada.
"Alô?"
"Senhor João Carlos? Eu sou do Hospital das Clínicas. Sua esposa, Ana Lúcia, sofreu um acidente de carro. Ela está sendo atendida na emergência."
O chão pareceu sumir sob seus pés. Acidente? Apesar de tudo, uma onda de pânico o atingiu. E se fosse grave? Ele largou as ferramentas e correu para o estacionamento, o coração martelando no peito.
Ele dirigiu como um louco, a mente uma confusão de imagens: Ana Lúcia sorrindo, Ana Lúcia nos braços de outro homem, Ana Lúcia em uma maca de hospital. Ao chegar à emergência lotada, o cheiro de antisséptico e sofrimento o invadiu. Ele perguntou por ela na recepção e, enquanto esperava, viu uma figura familiar sentada numa cadeira, a cabeça entre as mãos.
Era Rodrigo. Ele tinha alguns arranhões no rosto e um curativo na testa, mas parecia bem. Ele levantou a cabeça e viu João Carlos. O rosto dele era uma mistura de culpa e medo.
"Ela... ela vai ficar bem?" João Carlos perguntou, a voz saindo mais fraca do que ele pretendia.
"O médico disse que sim. Foi só um susto. Um carro bateu na nossa traseira," Rodrigo murmurou, sem conseguir encará-lo.
Um médico se aproximou, prancheta na mão.
"O senhor é o marido de Ana Lúcia?"
"Sou," João Carlos respondeu, por força do hábito.
"Sua esposa está estável. Teve algumas contusões, mas nada grave. Nós a manteremos em observação por algumas horas. A boa notícia," o médico sorriu, "é que o bebê está perfeitamente bem. Ela não sabia que estava grávida?"
João Carlos congelou. As palavras do médico ecoaram em sua cabeça, sem fazer sentido. Bebê. Grávida.
"Bebê?" ele repetiu, a voz um sussurro.
"Sim. De aproximadamente oito semanas. Parabéns, papai."
O médico sorriu novamente e se afastou, deixando João Carlos paralisado no meio do corredor. Oito semanas. Ele fez as contas na cabeça, rapidamente, desesperadamente. Era impossível. Absolutamente impossível. A verdade o atingiu com a força de um soco no estômago, tirando-lhe o ar. A humilhação, a traição... tudo ganhou uma nova e sórdida dimensão.
Antes que ele pudesse processar o choque, a mãe de Ana Lúcia, Dona Helena, chegou como um furacão, o rosto vermelho de raiva. Ela passou por Rodrigo sem nem olhá-lo e parou na frente de João Carlos.
"Você!" ela gritou, apontando um dedo acusador para o rosto dele. "A culpa é sua! Você deixou minha filha nesse estado!"
A mão dela voou e o estapeou no rosto. O som ecoou pelo corredor.
As pessoas ao redor pararam para olhar. Enfermeiras, pacientes, outros visitantes. O drama dele, mais uma vez, se tornava um espetáculo público.
"O que você fez com a minha filha? Ela me ligou chorando, disse que você a expulsou de casa! E agora isso! Você queria matá-la?"
A acusação era tão delirante que João Carlos não sabia como reagir. Ele sentia o ardor do tapa no rosto, mas a dor maior era a da injustiça, da humilhação pública.
"Dona Helena, a senhora não sabe o que está dizendo," ele tentou falar, a voz calma, apesar da tempestade dentro dele.
"Eu sei muito bem o que estou dizendo! Você é um monstro! Um aproveitador! Casou com a minha filha só para ter uma empregada!"
As palavras dela eram veneno, destinadas a ferir, a humilhar. Ela gritava para que todos ouvissem, pintando-o como o vilão da história.
"A minha filha, grávida, e você a joga na rua! Que tipo de homem é você?"
Grávida. Aquela palavra de novo. Ele olhou para Rodrigo, que continuava encolhido na cadeira, evitando o olhar de todos. Ele olhou para o rosto furioso da sogra. A peça final do quebra-cabeça se encaixou.
"Isso tem que parar," João Carlos disse, mais para si mesmo do que para ela. Ele sentia os olhares de pena e de desprezo das pessoas ao redor. Ele não podia mais suportar aquilo.
Ele se virou e caminhou em direção ao posto de segurança do hospital. Ele não ia mais ser a vítima passiva daquela farsa.
"Eu preciso de ajuda," ele disse ao segurança. "Estou sendo agredido e acusado falsamente. Eu quero chamar a polícia."
A decisão estava tomada. A guerra tinha apenas começado, e ele não ia mais lutar com as mãos atadas.
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