Beijo de Cobra: Fim de Um Amor
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Capítulo 4

João Carlos se recusou a voltar para o corredor da emergência. Ele esperou a polícia perto da entrada do hospital, o rosto ainda ardendo do tapa, mas a mente surpreendentemente clara. Ele não ia mais se rebaixar ao nível de Dona Helena. A gritaria dela podia ser ouvida de longe, uma torrente de acusações e vitimismo.

Quando dois policiais militares chegaram, a cena era caótica. Dona Helena estava no auge de sua performance, apontando para João Carlos e o acusando de abandono, de violência, de tudo que podia imaginar.

"É ele, policiais! Ele agrediu minha filha grávida e a expulsou de casa!"

Os policiais se aproximaram de João Carlos, os rostos sérios.

"Senhor, precisamos que o senhor nos acompanhe para esclarecer essa situação."

"Com certeza," João Carlos disse, calmamente. "Mas eu sugiro que vocês perguntem a ele também."

Ele apontou para Rodrigo, que tentava se fundir com a cadeira de plástico. Os olhos de todos se viraram para o amante, que engoliu em seco.

Um dos policiais se aproximou de Rodrigo.

"E o senhor? Qual a sua relação com a senhora Ana Lúcia?"

Rodrigo gaguejou. "Eu... eu sou um amigo. Eu estava dando uma carona para ela."

"Amigo?" a voz de João Carlos cortou o ar, fria e precisa. "O amigo que estava com ela no carro durante o acidente? O amigo para quem ela roubou uma orquídea valiosa do meu trabalho? O amigo que é o pai do filho que ela está esperando?"

Cada pergunta atingiu o alvo. O rosto de Rodrigo ficou pálido. Dona Helena parou de gritar, a boca aberta em choque.

O policial olhou de João Carlos para Rodrigo, a desconfiança clara em seus olhos.

"Senhor," ele disse para Rodrigo, a voz agora mais dura. "É melhor o senhor começar a falar a verdade."

Pressionado, acuado, Rodrigo desmoronou. Com a voz baixa, quase inaudível, ele confessou. Contou sobre o caso, sobre estar com Ana Lúcia no momento do acidente, sobre a gravidez. Ele não mencionou a orquídea, mas já era o suficiente.

A reação de Dona Helena foi um espetáculo à parte. O queixo caiu, os olhos se arregalaram em descrença. A fúria deu lugar a uma vergonha profunda, o rosto dela passando de vermelho para um branco pálido. Ela olhou para a filha, que estava sendo trazida numa cadeira de rodas por uma enfermeira, e depois para Rodrigo, o desprezo evidente. O escândalo social, a desonra, era claramente pior para ela do que a infidelidade da filha.

Ana Lúcia, vendo a cena, percebeu que tinha perdido o controle da narrativa. Ela tentou a última cartada: as lágrimas.

"João... me perdoa," ela choramingou, estendendo a mão para ele. "Eu cometi um erro. Eu estava confusa. Mas eu te amo. Vamos esquecer tudo isso, pelo nosso filho."

"Nosso filho?" João Carlos repetiu, o sarcasmo pingando de cada sílaba. "Ana Lúcia, nós não dormimos juntos há mais de três meses. Faça as contas."

A verdade crua pairou no ar, feia e irrefutável.

Nesse momento, Dona Helena, a rainha do pragmatismo, mudou de tática. A vergonha foi substituída por um cálculo frio. Ela se aproximou de João Carlos, a voz agora mansa, conciliadora.

"João, meu filho... todo casal tem problemas. Ela errou, sim, mas é jovem. Perdoe. Pense na reputação da nossa família. O que as pessoas vão dizer? Um divórcio, um filho bastardo... seria uma vergonha. Aceite a criança como sua. Crie-a como se fosse sua. Ninguém precisa saber."

A proposta era tão monstruosa, tão egoísta, que João Carlos sentiu vontade de rir. Eles não se importavam com ele, com seus sentimentos. Só se importavam com as aparências.

Ele olhou para o rosto esperançoso de Ana Lúcia, para o olhar calculista de Dona Helena. E tomou uma decisão.

"Tudo bem," ele disse, a voz neutra. "Eu preciso pensar. Vou cuidar das coisas do hospital. Depois a gente conversa."

Um alívio visível passou pelos rostos delas. Elas achavam que tinham vencido. Mal sabiam elas que a guerra de João Carlos estava apenas começando, e agora ele lutaria em seu próprio território, com suas próprias armas.

Naquela mesma tarde, ele ligou para Lucas.

"Preciso de um favor. Um grande favor."

Ele voltou para casa, a casa que agora parecia um território inimigo. Ele começou a procurar. vasculhou o histórico do computador compartilhado, as gavetas de Ana Lúcia. Encontrou o que procurava: recibos de hotéis, faturas de cartão de crédito com despesas em motéis e restaurantes caros em dias que ela dizia estar com a mãe.

Ele fotografou tudo. Cada prova.

À noite, ele ouviu o carro de Rodrigo parar na frente. Ele se escondeu na escuridão do seu quarto, o coração batendo forte. Ele ouviu a porta se abrir. Eram as vozes de Ana Lúcia e Rodrigo. Eles tinham voltado para pegar o resto das coisas dela.

Ele pegou o celular e começou a gravar um áudio.

"Você acha que ele engoliu aquela história?" a voz de Rodrigo perguntou.

"Claro que sim," respondeu Ana Lúcia, rindo. "O João é um idiota sentimental. E minha mãe o convenceu. Ele vai assumir o bebê. Nós vamos pegar o dinheiro do divórcio e sumir. Ele vai ficar com a criança e a gente com a grana. Perfeito."

A confissão. Fria, cruel e completa.

João Carlos parou a gravação. Ele tinha tudo que precisava. A raiva que sentia não era mais quente e explosiva, mas fria e afiada. Eles o tinham subestimado pela última vez.

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