Além da Maldição
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Capítulo 2

Os dias que se seguiram ao desaparecimento do meu pai foram um borrão de confusão e dor. A notícia se espalhou rapidamente pela comunidade científica. O sumiço do Dr. Artur, um gênio em seu campo, virou assunto em todos os cantos. As teorias iam desde um sequestro por uma corporação rival até uma fuga voluntária para escapar da pressão.

A polícia, sem pistas concretas, parecia cada vez mais inclinada a aceitar a segunda opção.

"Seu pai estava sob muito estresse, Sofia", disse o detetive mais velho, cujo nome era Silva. "A doença de sua mãe, a pressão do trabalho... Às vezes, as pessoas simplesmente precisam de um tempo."

"Meu pai não faria isso!", eu protestei, a voz embargada. "Ele nunca nos abandonaria. Algo aconteceu com ele!"

O detetive Silva apenas me olhou com pena, o tipo de olhar que se dá a uma criança que ainda não entende a dureza do mundo. Eles fecharam a investigação ativa algumas semanas depois, classificando o caso como "desaparecimento voluntário de pessoa". O bilhete foi arquivado como uma nota de alguém em estado de confusão mental.

A raiva queimava dentro de mim, uma brasa quente em meio ao gelo do desespero. Eles não entendiam. Ninguém entendia. A "maldição", a "fórmula"... para eles, eram delírios. Para mim, eram as únicas pistas que eu tinha.

Minha frustração se voltou para a única outra pessoa que poderia ter respostas: minha mãe.

Eu a encontrei na sala, no mesmo lugar de sempre. O sol da tarde entrava pela janela, iluminando as partículas de poeira que dançavam no ar, mas não parecia alcançá-la. Ela estava envolta em sua própria escuridão.

"Mãe", eu comecei, tentando manter a calma. "Você precisa me ajudar. O que você sabe sobre o trabalho do papai? Sobre a fórmula?"

Ela não respondeu. Seus olhos continuavam fixos em um ponto invisível na parede.

A calma se desfez. A angústia transbordou.

"Mãe, por favor! Ele desapareceu! Você me ouve? Ele se foi! Você disse que o tempo estava se esgotando. Você sabia que algo ia acontecer, não sabia?"

Minha voz subiu, ecoando na casa silenciosa. Eu a segurei pelos ombros, forçando-a a olhar para mim.

"Diga alguma coisa! Qualquer coisa!"

As lágrimas escorriam pelo meu rosto, quentes e amargas. Eu me sentia tão sozinha. Por um momento, vi um lampejo de dor em seus olhos, um reconhecimento do meu sofrimento. Ela levantou a mão trêmula e pegou um bloco de notas e uma caneta que estavam na mesinha ao lado.

Com um esforço visível, ela escreveu uma única palavra.

Raízes.

Eu olhei para o papel, o coração batendo forte.

"Raízes? O que isso quer dizer? Raízes do quê? Mãe, isso não me ajuda!"

Ela não escreveu mais nada. Apenas largou a caneta e voltou a se encolher na poltrona, o breve momento de conexão desfeito.

A decepção foi como um soco no estômago. Eu esperava uma chave, uma revelação, e recebi um enigma. A raiva voltou, cega e irracional.

"É isso? É tudo o que você vai me dar? Uma palavra inútil? Ele era seu marido! Você não se importa?"

As palavras saíram antes que eu pudesse contê-las, cruéis e injustas. Eu sabia que ela estava doente, sabia que seu sofrimento era imenso, mas naquele momento, a minha própria dor era grande demais para sentir qualquer outra coisa.

Ela não reagiu à minha acusação. Apenas continuou olhando para a frente. Mas então, algo mudou em seu rosto. Um leve tremor percorreu seus lábios, e eles se curvaram em um sorriso.

Não era um sorriso de felicidade ou de conforto. Era um sorriso vazio, estranho, quase assustador. Um sorriso que não alcançava seus olhos, que permaneciam abertos e repletos de uma tristeza antiga e profunda.

Aquilo me arrepiou. O sorriso era mais perturbador do que seu silêncio. Era como se ela estivesse vendo uma piada trágica que só ela entendia.

Eu recuei, sentindo um calafrio. O abismo entre nós parecia ter se tornado intransponível.

Sem dizer mais nada, ela se levantou lentamente e caminhou em direção ao seu quarto, seus passos arrastados no chão de madeira. Ela não olhou para trás.

Fiquei sozinha na sala, com o bilhete e a palavra "Raízes" na minha frente. O sorriso dela ficou gravado em minha mente, um presságio sombrio de que o mistério era muito mais profundo e terrível do que eu imaginava.

            
            

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