Quando chegamos à casa de Lucas, fomos recebidos com abraços calorosos. A casa estava cheia de risadas e do cheiro de comida caseira, um contraste gritante com o silêncio da minha.
Minha mãe foi guiada para uma poltrona na sala, onde permaneceu imóvel, alheia a toda a agitação ao seu redor. Eu fiquei ao seu lado, sentindo os olhares de pena dos outros convidados. Eles eram gentis, mas eu podia ver a curiosidade e o desconforto em seus olhos.
Durante o jantar, a conversa fluiu, mas eu mal consegui participar. Meu foco estava dividido entre tentar parecer normal e monitorar cada respiração de minha mãe.
Então, a mãe de Lucas, com a melhor das intenções, mas com uma total falta de tato, trouxe o assunto que eu mais temia.
"Sofia, querida, você é uma jovem tão forte", ela começou, sua voz soando alta demais na mesa de jantar. "Mas ninguém deveria carregar um fardo desses sozinha. Você e Lucas sempre se deram tão bem..."
O ar ficou rarefeito. Senti meu rosto queimar. Lucas, do outro lado da mesa, parecia igualmente chocado e desconfortável.
"Mãe, por favor", ele disse em voz baixa.
Mas ela continuou, "Seria um alívio para todos nós saber que você tem alguém como o Lucas para cuidar de você e de Helena."
O silêncio que se seguiu foi terrível. Eu queria que o chão se abrisse e me engolisse. Era uma proposta de casamento velada, nascida da pena, e isso me humilhava profundamente.
Foi nesse momento de tensão máxima que o impensável aconteceu.
Minha mãe, que não tinha dito uma palavra a noite toda, se inclinou para frente. Seus movimentos eram lentos, deliberados. Ela estendeu a mão e tocou o braço de Lucas, que estava sentado ao seu lado.
Todos na mesa prenderam a respiração.
Ela se aproximou do ouvido dele, e seus lábios se moveram. Um sussurro, tão baixo que só ele podia ouvir. Foi a segunda vez que ela falava desde o desaparecimento do meu pai. A primeira vez, para mim, com um aviso. Agora, para Lucas, com um segredo.
Eu vi o rosto de Lucas mudar. A cor sumiu de suas bochechas. Seus olhos se arregalaram por uma fração de segundo, uma expressão de puro choque, talvez até medo. Mas ele se recompôs rapidamente, forçando um sorriso tenso.
"Está tudo bem, Dona Helena", ele disse, sua voz um pouco instável.
Minha mãe se recostou na cadeira, como se uma grande energia tivesse sido gasta. E então, ela fez de novo. Aquele sorriso. O mesmo sorriso vazio, perturbador, que eu vira em casa. Um sorriso que parecia dizer: "O jogo começou".
A atmosfera na mesa estava arruinada. Pouco tempo depois, inventei uma desculpa, dizendo que minha mãe estava cansada, e nos preparamos para ir embora.
No caminho para o carro, eu não consegui me segurar.
"Lucas, o que ela te disse?"
Ele evitou meu olhar, ocupado em abrir a porta do carro para minha mãe.
"Não foi nada, Sofia. Ela só estava um pouco confusa."
"Não minta pra mim!", eu insisti, minha voz subindo. "Eu vi seu rosto. Você ficou pálido. O que ela disse?"
Ele finalmente olhou para mim, e em seus olhos, eu vi algo que não estava lá antes: uma barreira. Ele estava me escondendo algo.
"Sofia, agora não é hora. Vamos levar sua mãe para casa."
Sua recusa em me contar a verdade doía mais do que a gafe de sua mãe. Ele, minha única âncora, agora também fazia parte do muro de segredos que me cercava.
Dirigi para casa em um silêncio tenso. A imagem do sussurro, do rosto de Lucas e daquele sorriso assustador se repetia em minha mente. Minha mãe não estava apenas doente. Havia algo mais acontecendo, uma lógica oculta em sua aparente loucura.
E eu estava mais determinada do que nunca a descobrir qual era.