Minha mãe se isolou completamente. Ela mal saía do quarto, comendo pouco, falando nada. Eu cuidava dela como podia, levando comida, garantindo que tomasse seus remédios, mas sentia que ela estava se afastando cada vez mais, navegando por um oceano escuro onde eu não podia alcançá-la. Seu mundo era agora a cama, a janela e o silêncio.
Às vezes, à noite, eu me sentava na sala escura e deixava as lembranças virem. Lembrava do meu pai me ensinando a olhar as estrelas pelo telescópio, explicando as constelações com uma paixão contagiosa. Lembrava da minha mãe rindo, seu rosto iluminado, antes que a sombra da doença começasse a cair sobre ela.
Essas memórias eram um refúgio e uma tortura. Elas me lembravam do que eu havia perdido, do que a "maldição" familiar estava nos roubando.
A palavra "maldição" não era apenas uma figura de linguagem no bilhete do meu pai. Era como nossa família se referia à doença. Eu sabia disso, mas era um segredo que guardava a sete chaves.
Quando a polícia me interrogou, eu omiti essa parte. Omiti que meu pai não estava apenas fazendo uma pesquisa genérica, mas que ele estava obcecado em encontrar uma cura para a nossa linhagem. Falar sobre uma "maldição familiar" soaria como loucura, e eu precisava que eles o levassem a sério. Mas eles não levaram. E agora, o segredo pesava sobre mim.
Meu relacionamento com minha mãe era uma mistura complexa de amor e ressentimento. Eu a amava, faria qualquer coisa por ela. Mas eu também a culpava. Culpava por seu silêncio, por sua aparente rendição. Eu queria que ela lutasse, que me ajudasse, que fosse a mãe forte que eu lembrava. Era um sentimento feio, e eu me odiava por isso.
Em meio a essa solidão, uma luz apareceu. Lucas, um antigo colega de pesquisa do meu pai e amigo da família, começou a me visitar. Ele era alguns anos mais velho que eu, um homem calmo e gentil, com um olhar que transmitia uma enorme compaixão.
Ele não vinha com perguntas ou conselhos vazios. Apenas trazia café e se sentava comigo na cozinha, às vezes em silêncio, outras vezes me fazendo falar sobre coisas banais, me puxando para fora do meu casulo de dor por alguns momentos.
"Você não precisa passar por isso sozinha, Sofia", ele disse um dia, sua mão cobrindo a minha sobre a mesa da cozinha.
Seu toque era quente e reconfortante. Foi a primeira vez em meses que senti uma conexão humana genuína.
"Eu não sei mais o que fazer, Lucas. Sinto que estou em um beco sem saída."
"Vamos encontrar uma saída. Juntos."
Lucas e sua família sempre foram próximos da nossa. Seus pais me viam quase como uma filha. Algumas semanas depois, a mãe de Lucas me ligou.
"Querida, estamos planejando um jantar em família no próximo sábado. Queremos muito que você e Helena venham. Seria bom para vocês saírem um pouco de casa."
A ideia me encheu de ansiedade. Levar minha mãe a um evento social parecia uma tarefa impossível. Ela mal interagia comigo, como reagiria em uma casa cheia de gente?
Eu estava prestes a recusar, mas Lucas me ligou logo em seguida, como se soubesse da minha hesitação.
"Minha mãe te ligou, não foi?"
"Sim... Lucas, eu não acho que seja uma boa ideia. Minha mãe..."
"Eu sei. Mas talvez um ambiente diferente a ajude. E vai ser bom para você, Sofia. Você não pode se trancar aqui para sempre. Eu estarei lá com você a cada segundo. Não vou deixar você sozinha."
Sua voz era tão segura, tão cheia de carinho, que minha resistência começou a ceder. Talvez ele estivesse certo. Talvez eu precisasse disso. Talvez nós precisássemos.
"Tudo bem", eu disse, a voz pouco mais que um sussurro. "Nós vamos."
Na noite anterior ao jantar, a ansiedade voltou com força total. E se minha mãe tivesse uma crise? E se ela se recusasse a ir? Eu estava andando de um lado para o outro na sala quando meu telefone tocou. Era Lucas.
"Nervosa?" ele perguntou, sua voz calma me acalmando instantaneamente.
"Um pouco. Ou muito."
"Não se preocupe. Vai dar tudo certo. Apenas respire fundo. Estou aqui por você."
Suas palavras eram um bálsamo. Naquele momento, ele era minha âncora em um mar de incertezas. Eu me agarrei a essa sensação de segurança, esperando que fosse o suficiente para nos carregar através da noite que viria.