"João! Está doendo tanto! Eu não aguento mais!", ela chorou de seu quarto. "É ela! A energia dela está me matando! Você precisa pegar a Phoenix, agora, ou nós dois vamos morrer!"
A hesitação momentânea de João desapareceu, substituída pela urgência fabricada por Sofia. A carnificina ao seu redor não significava nada. As vidas que ele acabara de tirar eram apenas um meio para um fim.
"Você ouviu?", ele disse a Maria, a voz novamente dura e controlada. "O tempo acabou."
Sofia, de seu santuário de dor fingida, gritou a sugestão final e monstruosa.
"Arranque o coração dela, João! O curandeiro disse que a Phoenix reside no coração da Rainha! É a única maneira!"
A sugestão pairou no ar, tão grotesca que parecia irreal. Mas para João, em sua obsessão cega, soou como a única solução lógica. Ele não questionou. Ele não hesitou.
Ele agarrou Maria pelo cabelo, arrastando-a para fora do salão principal e em direção ao sambódromo. O caminho da glória, a avenida sagrada onde ela fora coroada e celebrada, agora seria o palco de sua execução. O vento açoitava seu rosto, o céu escuro refletindo a escuridão em sua alma.
O sambódromo estava vazio e silencioso, uma concha oca de suas antigas glórias. A grandiosidade do lugar agora parecia opressiva, um monumento à sua queda. Ele a jogou no chão de concreto, no exato ponto onde a comissão de frente sempre iniciava o desfile. O lugar do nascimento da magia do Carnaval.
"Eu te dei tudo, João", Maria disse, não com súplica, mas com um fato frio e duro. "Eu te fiz Rei. E é assim que você me paga."
"Silêncio!", ele gritou, pairando sobre ela. "Você não me deu nada. Você amaldiçoou tudo o que tocou. Eu estou apenas limpando a sua sujeira."
Ele se ajoelhou sobre ela, prendendo seus braços com os joelhos. Ele ergueu a faca ensanguentada. A lâmina, que já havia tirado a vida de toda a sua comunidade, agora estava apontada para o seu peito.
"A Phoenix será minha", ele sussurrou, mais para si mesmo do que para ela. "Ela dará vida ao meu filho. Um verdadeiro herdeiro, nascido do poder, não da fraqueza."
Maria olhou para o céu escuro acima. Ela pensou em seu filho, na pequena alma de luz que se apagara. Ela pensou em Clara, em seu Mestre-Sala, em cada rosto amigo que agora estava frio e sem vida. A vingança não era mais apenas um desejo. Era um propósito.
Ela fechou os olhos.
João não perdeu tempo. Com um grunhido de esforço, ele enfiou a faca no peito dela. A dor foi aguda, ofuscante, mas breve. Ela sentiu o rasgar de sua pele, de seus músculos. Ela sentiu as mãos dele, brutais e desesperadas, entrando em sua caixa torácica, procurando pelo prêmio que ele acreditava estar lá.
Ele arrancou seu coração.
Ele o segurou em suas mãos, uma massa sangrenta e pulsante. Ele o examinou, virando-o, procurando por um brilho, por um sinal de poder, por qualquer vestígio da mítica Phoenix.
Mas não havia nada.
Era apenas um coração. Um órgão humano, que agora parava de bater em suas mãos manchadas de sangue.
Ele olhou para o corpo sem vida de Maria no chão. Seus olhos estavam abertos, mas vazios. Um filete de sangue escorria do canto de sua boca.
"Não... não pode ser", ele gaguejou, a confusão começando a perfurar sua certeza fanática. "Onde está? Onde está a Phoenix?"
Ele não compreendia. Em sua crueldade e ignorância, ele havia realizado o ato final e mais inútil de todos. Ele a matara, mas o prêmio que ele tanto cobiçava não estava lá. Ele não sabia, e não podia saber, que Maria havia morrido de verdade. O corpo que ele profanara estava verdadeiramente sem vida. A Rainha do Samba estava morta.