Coração Partido, Alma Curada
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Capítulo 4

Sofia ficou paralisada no beco, a arrogância substituída por um medo visível.

A imagem do seu rosto assustado me deu uma satisfação fria e passageira.

Voltei para dentro, não para a cozinha, mas para o pequeno escritório que eu dividia com Ricardo. Nosso escritório. A palavra agora soava estranha.

Ele estava lá, andando de um lado para o outro como um animal enjaulado. Tinha trocado de camisa e penteado o cabelo, uma tentativa patética de restaurar a normalidade.

Quando me viu, ele parou.

"Isabela, graças a Deus. Onde você estava? Eu te procurei por toda parte."

Ele tentou soar preocupado, mas a ansiedade em sua voz era palpável.

"Não se preocupe", eu disse, fechando a porta atrás de mim. "Eu não fiz a cena que você tanto temia. Seu precioso evento está intacto."

Ele relaxou visivelmente, passando a mão pelo rosto. "Ótimo. Ótimo. Eu sabia que você seria razoável."

"Razoável?", repeti, olhando ao redor do escritório. Nossas fotos, prêmios lado a lado, uma vida inteira de conquistas compartilhadas. Tudo parecia uma mentira. "Você me trai com a minha protegida, ela engravida, e eu sou a razoável por não gritar no meio do seu evento?"

"Por favor, não vamos começar de novo", ele pediu, o tom suplicante. "Podemos resolver isso. Nós somos uma equipe, Isa."

A ironia era tão espessa que eu quase podia tocá-la.

"Nós não somos uma equipe, Ricardo. Uma equipe não mente, não trai, não planeja pelas costas."

Caminhei até a minha mesa e comecei a juntar minhas coisas: meu livro de receitas pessoal, uma foto de Lúcia, minha caneta favorita.

"O que você está fazendo?", ele perguntou, o pânico voltando à sua voz.

"Eu estou fazendo o que deveria ter feito há muito tempo", eu disse, sem olhar para ele. "Estou vendo as coisas como elas realmente são."

Fiz uma pausa e finalmente o encarei.

"Sabe, eu sempre te admirei. O grande sommelier Ricardo, o homem que encanta a todos com seu charme e seu conhecimento. Eu te apoiei. Eu abri mão de convites, de oportunidades, de noites de sono para que você pudesse brilhar, para que pudéssemos construir isso juntos."

Meus olhos varreram a sala.

"Eu sacrifiquei tempo com a nossa filha para criar os pratos que te fizeram famoso, os pratos que você harmonizava com seus vinhos caros. Eu construí a fundação desta casa, tijolo por tijolo, enquanto você construía a sua imagem."

Ele ficou em silêncio, incapaz de negar.

"E enquanto eu estava na cozinha, trabalhando até a exaustão por 'nós', você estava... onde, Ricardo? Ocupado com a sua 'nova vida'?"

A culpa finalmente pareceu atingi-lo, ou talvez fosse apenas o medo de perder o conforto que eu proporcionava.

"Isa, eu sinto muito. Eu cometi um erro terrível."

"Não", eu o corrigi. "Um erro é algo que você comete uma vez. O que você fez foi uma escolha. Repetida. Deliberada."

Coloquei minhas coisas em uma sacola.

"Você quer ser razoável? Então vamos ser. Eu vou para a casa da Mariana hoje à noite. Amanhã, eu volto para pegar minhas roupas e as coisas da Lúcia. Eu preciso de espaço, Ricardo. Preciso pensar."

A palavra "divórcio" pairava no ar, não dita, mas pesada e inevitável.

"Espaço? Isabela, não seja ridícula!", ele protestou. "Nós temos uma filha! Não podemos simplesmente... nos separar."

"Eu não estou sendo ridícula", eu disse, caminhando em direção à porta. "Estou sendo a única adulta nesta sala. Você fez a sua escolha. Agora me deixe fazer a minha."

Abri a porta e saí, deixando-o sozinho com o eco das minhas palavras e o castelo de cartas que era a nossa vida desmoronando ao seu redor.

                         

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