De repente, a voz lamentosa e alta de um homem atravessou a cortina dos bastidores, ecoando pelo auditório quase vazio. "Socorro! Estão batendo em mim! Um militar está batendo em mim!"
A voz continuou, cheia de pânico e indignação. "Vou denunciar você! Vou denunciar!"
Como jornalista, o instinto de Sofia era extremamente aguçado para notícias. Ela e seu colega, sentindo o cheiro de uma história, correram rapidamente para os bastidores.
Mas, ao levantar a pesada cortina de veludo, Sofia ficou chocada ao ver o militar que estava distribuindo os socos.
Era Rafael Costa.
Naquele momento, os olhos de Rafael estavam mais frios e penetrantes do que nunca. As veias de seu pescoço e braços saltavam, e ele parecia querer espancar o homem com cicatrizes no rosto até a morte. O homem, que a princípio devia estar sendo arrogante, agora estava no chão, encolhido, implorando por misericórdia.
"Gerente Costa, eu juro, nunca mais vou incomodar a camarada Bia! Por favor, me perdoe! Não bate mais!"
Só então Sofia percebeu a causa do conflito. Encolhida em um canto, com o rosto pálido e os olhos arregalados, estava Bia. Naquele instante, Sofia se lembrou de um incidente semelhante em sua vida passada. Rafael havia voltado para casa com as mãos cheias de arranhões e hematomas. Preocupada, ela perguntou o que havia acontecido, mas ele apenas respondeu de forma evasiva: "Lidei com um bandido que estava causando problemas."
Pensando nisso agora, Sofia riu de si mesma. Que coincidência.
Seguranças do auditório finalmente chegaram e rapidamente arrastaram o homem com cicatrizes para fora. Assim que ele se foi, Bia correu para os braços de Rafael. Ela segurou a mão esfolada de Rafael com uma expressão de dor, chorando copiosamente.
"Desculpe, Rafael, desculpe... tudo isso aconteceu por minha causa, por eu ter te machucado..."
Qualquer um que visse a cena elogiaria o profundo amor e a proteção entre os dois. Mas, infelizmente para eles, a esposa legítima, Sofia, estava parada ali, observando tudo. Os olhares das outras pessoas nos bastidores, que também testemunharam a cena, tornaram-se estranhos e cheios de pena quando se voltaram para Sofia.
Rafael também pareceu perceber o constrangimento no ar. Ele gentilmente afastou Bia e virou a cabeça. Ao ver Sofia parada ali, com a câmera pendurada no pescoço e uma expressão indecifrável, ele hesitou por um momento e foi direto até ela.
"Seja como militar ou como cunhado da Bia, eu deveria ter dado uma lição naquele canalha!", ele disse, a voz alta o suficiente para que todos ouvissem. "Não pense bobagens de novo, e não culpe a Bia por isso!"
O coração de Sofia se apertou. Ela percebeu imediatamente que as palavras de Rafael, na superfície, eram uma explicação para ela, mas na verdade, eram uma explicação para a multidão que observava. Ele estava protegendo a reputação de Bia, deixando claro que sua ação era um dever familiar, não um ato de paixão.
Sofia não disse mais nada. Ela apenas assentiu lentamente. "Entendi."
Na vida passada, ela já estava acostumada com esse tipo de situação.
Nesse momento, Bia enxugou as lágrimas e se aproximou, forçando um sorriso frágil. "Sofia, da última vez você se desentendeu com a mamãe por minha causa. Desta vez, eu organizo. Você volta amanhã para jantar com a mamãe e fazer as pazes, que tal? E o Rafael me salvou hoje, então ele também merece ser agradecido."
Sofia não recusou. "Ok."
Ela tinha um motivo para aceitar. Para obter o visto de jornalista residente para sua missão na fronteira, ela precisava de seu registro de família. Desde que se casou, seu registro não foi transferido para a casa de Rafael; ainda estava na casa dos Mendes. Então, ela já estava pensando em encontrar um tempo para voltar lá e pegar o documento.
No dia seguinte, ao meio-dia, Sofia e Rafael chegaram à casa dos Mendes. Ao entrarem, a mãe de Sofia já havia preparado uma mesa cheia de pratos, esperando por eles, um sorriso forçado no rosto.
Durante o almoço, Sofia mencionou casualmente que precisava pegar seu registro de família para o visto de jornalista. Rafael olhou para ela por um instante, mas não disse nada. A mãe de Sofia, impaciente, apontou para o quarto dos fundos.
"Vá procurar você mesma. Está na gaveta da cômoda. Pegue apenas a sua página."
"Ok." Sofia se levantou e foi procurar o registro. Felizmente, a busca foi tranquila. Ela encontrou o documento e o guardou cuidadosamente na bolsa. Quando estava voltando para a sala de jantar, mal havia chegado à porta quando as palavras de queixa de sua mãe chegaram aos seus ouvidos, claras e dolorosas.
"A gente pensava que a Sofia nunca mais voltaria depois daquele intercâmbio, quem diria que ela ainda conseguiria voltar! Que desgraça, acabou separando vocês dois, um casal tão apaixonado."
As pontas dos dedos de Sofia tremeram, e seu corpo congelou. Então era isso. Quando seus pais a enviaram para o intercâmbio, eles nunca pensaram em tê-la de volta. Eles a viam como um obstáculo.
Em seguida, ela ouviu sua mãe pegar as mãos de Rafael e Bia, juntando-as. A voz da mãe era séria e conspiratória. "Rafael, dê uma resposta clara para a mamãe. Se você ainda quiser ficar com a Bia, a mamãe está disposta a ser a vilã e fazer a Sofia se divorciar de você!"
O mundo de Sofia desmoronou um pouco mais. Com o coração batendo forte de raiva e dor, ela abriu a porta e entrou na sala, olhando fixamente para Rafael, que ainda tinha sua mão sobre a de Bia.
"Sim! Rafael, se você disser sim, podemos ir agora mesmo dar entrada no pedido de divórcio."
Rafael, pego de surpresa, puxou a mão rapidamente. Ao vê-la ali, parada e desafiadora, sentiu uma inexplicável irritação.
Ele disse, a voz cheia de descontentamento: "Sofia Mendes, você não percebe que sua mãe está brincando? Você também leva tudo a sério?"
Brincadeira? Sofia não conseguia entender como ele, um militar que era sempre tão sério em tudo, podia ser tão confuso em um assunto tão grave como o casamento.
Ela o olhou seriamente, ignorando os olhares chocados de sua mãe e irmã. "Mas eu estou falando sério! Antes, eu interpretei mal os seus sentimentos, por isso me casei com você. Já que você não me ama, estou disposta a te deixar livre para a Bia."
Ao ouvir suas palavras, o rosto de Rafael mudou drasticamente. Ele a agarrou pelo braço novamente e a arrastou para fora, o almoço esquecido.
Atrás deles, a voz de sua mãe reclamava, perfurando seus ouvidos: "Que azar, toda vez que essa menina volta para casa, ela tem que deixar todo mundo infeliz."
Os olhos de Sofia ficaram vermelhos. Ela podia suportar a falta de amor de Rafael, afinal, não se pode forçar o amor. Mas ela não conseguia entender. Por que sua própria mãe não sentia um pingo de carinho ou compaixão por ela, sendo que ela também era sua filha? Ela chegou a duvidar se não era filha biológica, mas sua semelhança com os pais praticamente descartava essa possibilidade.
Felizmente, ela logo atenderia aos desejos deles. Depois que ela fosse para a fronteira, ela não voltaria mais.
Rafael segurou firmemente a mão dela, só a soltando quando chegaram em sua própria casa. O pulso dela estava vermelho e marcado, mas Rafael não pareceu notar. Ele apenas a olhou profundamente, a frustração evidente em seus olhos.
"Sofia Mendes, vou te dizer pela última vez, eu me casei com você e não vou me divorciar!"
Em seguida, como se percebesse a dureza de suas palavras, ele suavizou o tom, tentando explicar. "Além disso, eu e a Bia nunca tivemos nada. Nos anos anteriores, eu só a ajudei mais por ela ser sua irmã."
Tanto na vida passada quanto nesta, era a primeira vez que Rafael lhe explicava tanto. Se ela não tivesse visto com seus próprios olhos, na vida passada, ele se casar com Bia depois de sua morte, ela provavelmente teria acreditado nele naquele momento.
Mas Sofia também se lembrou claramente de outra coisa. Na vida passada, depois de sua morte, ela viu, em estado de espírito, Rafael, um dia antes de se casar com Bia, ir até seu túmulo. Ele queimou um pedaço de papel. Era um pedido de divórcio. Ele disse: "Este pedido de divórcio foi preparado no dia do nosso casamento. Nunca encontrei uma oportunidade para entregá-lo a você. Agora que o queimei, estamos quites."
Naquele momento, Sofia descobriu que, mesmo depois da morte, o coração ainda podia doer. E doía muito mais do que a dor de ter sido morta por um bandido.
Sofia voltou a si daquela memória dolorosa e olhou para a estante de livros na sala de estar. Ela sabia onde ele guardava seus segredos. O pedido de divórcio estava guardado no livro que Rafael costumava ler com mais frequência, um grosso volume intitulado "Manual de Habilidades Militares".
Ela levantou a mão para pegar o livro, para confrontá-lo com a prova de sua mentira.
Mas, nesse momento, um forte bater na porta foi ouvido, e a voz alarmada da mãe de Sofia chegou através da madeira: "Rafael, não é bom! A Bia está na ponte querendo pular, vá logo!"
Pular da ponte? Os olhos de Sofia se arregalaram em surpresa; isso nunca havia acontecido na vida passada.
Rafael, sem se importar com mais nada, esqueceu a conversa deles, puxou Sofia pelo braço e correu rapidamente para a ponte que ficava a alguns quarteirões de distância.
Quando chegaram, uma multidão já lotava a ponte. E lá estava Bia, em pé do lado de fora da grade de proteção, agarrada a um poste, com o rosto cheio de desespero, chorando copiosamente.
Assim que viu Sofia, ela imediatamente gritou, a voz cheia de indignação e dor. "Sofia, não foi minha culpa ter sido assediada ontem! Por que você ainda deixou que espalhassem boatos sobre mim na sua agência de publicidade? Agora todo mundo na vizinhança está dizendo que sou desavergonhada, que seduzi o Rafael... Mas no começo, foi você quem se intrometeu entre nós!"
Ela continuou, suas acusações ficando mais altas. "Até o emprego na agência de publicidade, você roubou de mim! Agora que finalmente entrei no grupo de dança e teatro, você ainda quer que me excluam, que me chamem de desavergonhada e me force a sair! Será que só quando eu morrer você ficará satisfeita? Então eu vou morrer para você ver!"
As palavras chorosas de Bia fizeram todos os transeuntes olharem para Sofia com desprezo e acusação.
"Como pode uma irmã fazer tanto mal à própria irmã!"
"É verdade, e ela é jornalista, uma verdadeira mancha na profissão!"
O rosto de Sofia empalideceu. Bia estava inventando tudo. Ela não havia falado com ninguém. Mas antes que ela pudesse se defender, um tapa sonoro atingiu seu rosto novamente. Uma dor ardente se espalhou por sua bochecha.
A mãe de Sofia apontou para ela com raiva, gritando: "Por que você não pede desculpas à sua irmã! Você realmente vai vê-la pular?!"
Sofia olhou para a mãe, incrédula. "Ela está distorcendo a verdade! Por que eu deveria pedir desculpas?"
Rafael, porém, a puxou para o lado, o rosto sombrio. "De qualquer forma, em um momento de vida ou morte, o mais importante é salvar a pessoa primeiro! Apenas peça desculpas!"
Os olhos de todos se voltaram para Sofia como agulhas. Parecia que, se ela não cedesse, seria considerada uma assassina. Ela era a vilã daquele teatro grotesco.
Sofia levantou os olhos para Bia, que a observava por cima do ombro, um brilho triunfante em seus olhos marejados. Sofia disse calmamente: "O que você quer que eu faça?"
Bia, engasgada com seus próprios soluços, disse: "Só quero justiça. Quero que você publique um pedido de desculpas para mim no jornal."
Um pedido público de desculpas em um jornal. Isso significava que ela teria que admitir publicamente que todas aquelas coisas infundadas foram feitas por ela. Uma vez que fosse acusada de problemas de conduta moral, ela poderia esquecer a missão na fronteira. Sua carreira como jornalista estaria acabada.
Sofia cerrou os dentes. "Eu não vou..."
Mas antes que terminasse de falar, Rafael a interrompeu, respondendo por ela a Bia.
"Ok, eu prometo em nome dela!"
Só então Bia pareceu se acalmar. Ela enxugou as lágrimas e estendeu a mão para Rafael, que prontamente a segurou e a ajudou a voltar para o lado seguro da grade. A mãe de Sofia, com o coração apertado, abraçou Bia e a ajudou a ir para o hospital para "se acalmar".
A multidão se dispersou gradualmente, comentando sobre a crueldade de Sofia.
Ela puxou o braço de Rafael, que estava prestes a seguir sua mãe e irmã. "Eu não vou publicar um pedido de desculpas. A regra mais básica do jornalismo é a verdade. Eu não vou publicar uma reportagem falsa."
Ao ouvir isso, o ambiente ao redor pareceu ficar em silêncio. Sofia olhou para o homem à sua frente, o homem com quem ela era casada, e esperou por um longo tempo. O que ela ouviu em resposta foi uma frase que quebrou o que restava de seu coração.
"O que ela disse não é verdade?", ele perguntou, o desgosto em seus olhos claro como o dia.
Sim. Tanto na vida passada quanto nesta, sempre que se tratava de Bia, ele sempre a favorecia incondicionalmente, sem questionar.
Em um momento de distração dela, Rafael já havia soltado sua mão. "Volte para casa e escreva o pedido de desculpas!", ele ordenou. Em seguida, ele se virou e saiu apressadamente na direção do hospital.
O vento frio soprou forte na ponte, emitindo um gemido baixo. Sofia ficou sozinha, olhando para a superfície calma do lago abaixo, sentindo um frio que lhe gelava os ossos.
Ela entendeu. Ela não podia contar com ele, nem com ninguém. Ela teria que encontrar outra maneira de se libertar.
Depois de um tempo, Sofia se dirigiu para casa. Com as mãos trêmulas, ela foi até a estante, pegou o "Manual de Habilidades Militares" e o abriu.
Lá dentro, exatamente como ela se lembrava, estava um pedido de divórcio ligeiramente amarelado. Olhando para a assinatura elegante de Rafael no final do documento, embora já esperasse, o coração de Sofia ainda doeu.
O pedido de divórcio que ela viu queimar em seu túmulo na vida passada estava agora em suas mãos.
---