"Sofia, que bom que você veio", disse minha mãe, colocando um pedaço de lasanha no meu prato. "Agora podemos conversar sobre os arranjos."
"Arranjos?", perguntei, desconfiada.
"Sim. Com o seu irmãozinho chegando, vamos precisar de toda a ajuda possível", disse meu pai. "Você, como irmã mais velha, tem uma responsabilidade."
Eu olhei para ele, sem entender. "Que responsabilidade?"
"Ora, filha", disse minha mãe, com a maior naturalidade. "Você vai nos ajudar a criá-lo, é claro. E financeiramente também. Um menino custa caro, você sabe. Precisa de uma boa educação, um bom futuro."
Eu fiquei em silêncio, processando aquelas palavras. Eles não estavam pedindo ajuda, estavam me dando uma ordem. Meu estômago se revirou. Ajudar a criar? Ajudar financeiramente? Eu mal conseguia acreditar no que estava ouvindo. Eu tinha minha própria família para começar, minhas próprias contas para pagar.
Lembrei-me da minha adolescência. Quando eu quis fazer um curso técnico para melhorar minhas chances na faculdade, eles disseram que não tinham dinheiro. "Isso é luxo, Sofia. Você se vira." Quando eu passei na universidade pública em outra cidade e precisei de ajuda para o aluguel nos primeiros meses, a resposta foi a mesma. "Filha, você já é adulta. Corra atrás do seu." Eu trabalhei em dois empregos, comi mal, dormi pouco, mas me formei. Sem a ajuda deles. Quando anunciei meu casamento com Pedro, eles mal se envolveram, dizendo que era nossa responsabilidade arcar com tudo. E nós arcamos.
Agora, de repente, a "família" era importante. A "responsabilidade" era minha.
Minha mãe continuou, sem perceber meu choque. "Seu pai e eu já estamos com uma certa idade. Não teremos a mesma energia. Você é jovem, forte. E como você vai estar em casa cuidando do seu filho, pode muito bem cuidar de dois."
"Isso é um absurdo, mãe", eu disse, a voz trêmula de raiva.
"Não é absurdo, é o certo a se fazer", disse meu pai, com firmeza. "Somos uma família. E famílias se ajudam."
"E tem mais uma coisa", disse minha mãe, pousando os talheres. "Conversamos e decidimos que o melhor para o futuro dele é que esta casa fique no nome dele. É a casa da família, e ele será o homem da casa um dia."
Eu ri, um riso amargo, sem humor. "Vocês estão falando sério? Esta casa? E onde vocês esperam que eu e Pedro moremos?"
"Não se preocupe com isso", disse meu pai. "Vocês têm aquele apartamento que sua avó deixou para você."
A menção ao apartamento da minha avó foi o golpe final. Aquele apartamento era a única coisa de valor que eu tinha, um presente da única pessoa da família que sempre me apoiou incondicionalmente. Minha avó me deu aquele apartamento quando entrei na faculdade, para que eu tivesse um porto seguro, uma garantia para o meu futuro.
"É uma boa solução, não acha?", disse minha mãe, com um sorriso que me pareceu diabólico. "Vocês ficam com o apartamento, e nós garantimos o futuro do seu irmão com a casa. Todos saem ganhando."
Ela olhou para o meu pai, que assentiu. Depois, seus olhos se fixaram em mim, esperando minha concordância. O olhar dela era frio e calculista, e eu entendi que aquilo não era uma conversa, era uma intimação. Eu estava sendo encurralada.
Senti a mão de Pedro, que tinha vindo me encontrar para o jantar, apertar a minha por baixo da mesa. Ele não disse nada, mas seu toque era um lembrete de que eu não estava sozinha. Ele estava ali, e ele também estava ouvindo aquele delírio. Respirei fundo, tentando encontrar forças.
A pressão era imensa. Eles eram meus pais. A imagem de desapontá-los, de criar um conflito familiar aberto, era assustadora. Eu sempre fui a filha que evitava confrontos, que engolia sapos para manter a paz. Cedi, naquela noite, à primeira parte da exigência. Concordei, com a voz baixa, que a casa da família ficaria para o meu futuro irmão. Eu só queria sair dali, fugir daquela atmosfera sufocante.
Pedro me abraçou quando entramos no nosso carro. Seu silêncio dizia tudo. Ele entendia a armadilha em que eu estava caindo, mas também sabia que eu precisava chegar a minhas próprias conclusões. Naquele momento, eu só sentia um vazio imenso, como se tivessem arrancado um pedaço de mim.