Fiona observava tudo à distância, através dos tablóides e das redes sociais. A dor da substituição era aguda. Ela não era especial. O seu "amor único" era replicável, transferível para o próximo objeto de desejo. O seu coração, que ela pensava ter morrido, encontrou uma nova forma de se partir.
Numa tarde cinzenta, ela foi visitar o irmão. Ele estava a dormir, a sua respiração regulada pela máquina que Liam pagava. Ela sentou-se ao seu lado, segurando a sua mão frágil.
"Ele deu-lhe um estúdio, sabes?" ela sussurrou para o seu irmão inconsciente. "Ele costumava dizer que a minha voz era a sua arte preferida. Agora, ele tem uma artista de verdade. Acho que fui apenas um rascunho."
Ela falava, confessando a sua dor, a sua desilusão, a sua raiva. O seu irmão era o seu único confidente, a única pessoa no mundo que a amava incondicionalmente.
De volta à vivenda, agora fria e vazia, Fiona começou os seus preparativos. Ela vendeu discretamente as joias que Liam lhe dera, guardando apenas o dinheiro que tinha ganho a cantar antes de o conhecer. Contactou um especialista em apagar identidades digitais e criar novas. Ela ia tornar-se um fantasma.
Numa noite, ela estava no jardim, a queimar as cartas e fotografias antigas. As chamas consumiam as memórias de uma década de amor e mentiras.
"O que estás a fazer?"
A voz de Liam fê-la sobressaltar-se. Ele e Raegan estavam parados na porta do terraço, a observá-la.
"A limpar o passado," respondeu Fiona, sem se virar.
"Isso cheira a desespero," disse Raegan com um sorriso trocista.
Liam ignorou o comentário. O seu olhar estava fixo numa caixa que Fiona ainda não tinha atirado ao fogo.
"Fiona, preciso do colar."
Fiona sabia a que colar ele se referia. A herança da família Gordon, um colar de filigrana de ouro antigo, passado de geração em geração para a esposa do herdeiro. Liam tinha-lho dado no dia do casamento, dizendo que simbolizava que ela era a sua para sempre.
"Vou dá-lo à Raegan. Vamos anunciar o nosso noivado na gala da família amanhã à noite."
A humilhação era tão profunda que quase não doía. Era apenas um entorpecimento frio. Ela foi buscar a caixa, abriu-a e entregou-lhe o colar.
Raegan pegou nele, os seus olhos a brilhar. "É lindo, Liam."
No dia seguinte, na gala anual da família Gordon, Fiona foi obrigada a comparecer. Liam insistiu. "Tens de mostrar que não há ressentimentos. Pela família."
Ela estava num canto, a observar Raegan a exibir o colar a todos os que a quisessem ouvir. Mais tarde, quando Fiona estava perto do topo da grande escadaria, Raegan aproximou-se dela.
"Sabes, este colar é um pouco antiquado," disse Raegan, a sua voz um sussurro venenoso. "Acho que precisa de um toque moderno."
E com um movimento deliberado, ela partiu o fecho do colar. As delicadas filigranas de ouro caíram no chão.
"Oh, meu Deus!" gritou Raegan, a sua expressão a transformar-se em choque e medo. "Fiona, porque fizeste isso? Eu sei que estás chateada, mas destruir uma herança de família?"
Ela então empurrou Fiona com força. Fiona, apanhada de surpresa, perdeu o equilíbrio e caiu, rolando pelos degraus de mármore.
A dor explodiu na sua anca e nas suas costas. Ela ficou caída no fundo da escada, a olhar para cima enquanto Liam corria, não para ela, mas para Raegan.
"Estás bem, meu amor?" ele perguntou a Raegan, ignorando completamente Fiona no chão.
"Ela atacou-me, Liam! Ela partiu o colar e empurrou-me!"
Liam olhou para Fiona com uma fúria gelada. Ele não questionou, não hesitou. Ele acreditou nela instantaneamente.
"Na minha família," disse ele, a sua voz a ecoar no silêncio chocado do salão, "a desobediência e a desonra são punidas. É uma velha tradição."
Ele foi até uma vitrina na parede, tirou uma pequena chibata de equitação e voltou para junto de Fiona.
"Isto é para te ensinar a respeitar o que é meu."
Ele levantou a chibata. Fiona fechou os olhos, lembrando-se do dia em que ele lhe prometeu que nunca ninguém lhe faria mal enquanto ele estivesse vivo. A primeira chicotada cortou o ar e atingiu as suas costas. A dor foi ofuscante. Mas a dor da sua promessa quebrada foi muito, muito pior.