Acordei com o som de um fecho sendo puxado.
Demorei um segundo para lembrar onde estava. A suíte luxuosa. A cama enorme. O lençol egípcio envolvendo meu corpo nu. E o cheiro dele ainda no travesseiro.
Virei o rosto, ainda meio sonolenta, e o vi.
Leonardo De Santis estava de costas, vestindo a camisa preta que havia deixado sobre a poltrona. Seus movimentos eram firmes, automáticos, como se ele tivesse feito aquilo mil vezes antes. Talvez tivesse.
Ele estava impecável novamente. Cabelo ajeitado com os dedos, a barba levemente sombreada, o perfume voltando a preencher o ar do quarto. O mesmo homem que, horas antes, tinha me deixado despida de corpo e alma, agora era apenas... distante.
Profissional.
Frio.
- Você dorme profundamente - ele disse, sem virar para mim.
Minha garganta secou. Eu me sentei devagar, puxando o lençol para cobrir o peito.
- Que horas são?
- Pouco antes das sete.
Ele pegou o relógio de pulso da mesa e o encaixou no braço, com a precisão de quem tem pressa, mas não corre. Tudo nele era controlado. Calculado. Como se até os segundos com ele fossem cronometrados.
- O valor de quinze mil foi transferido para sua conta - disse, como quem comenta o clima. - Você deve receber a notificação ainda hoje.
Senti um frio no estômago. Mesmo tendo vindo por isso, ouvir a quantia me causou um desconforto estranho. Como se minha alma tivesse preço. E ele acabara de pagá-lo.
- Leonardo...
Ele finalmente se virou. Os olhos verdes me encontraram com aquela intensidade de sempre, mas agora sem qualquer vestígio do homem que me beijou a noite toda.
- Deixe sua agenda livre duas vezes por mês.
Meu coração pulou no peito.
- Como assim?
- Gosto de continuidade. - Ele ajeitou a gola da camisa. - E você me serviu bem.
Aquilo me atravessou como uma facada. "Serviu". Como se eu tivesse sido um prato, uma refeição. Um serviço.
- Achei que seria só uma noite...
Ele deu um sorriso de canto. Frio. Como se já tivesse escutado aquilo antes.
- Ache o que quiser, Isabela. Mas a realidade é simples. Eu pago, você vem. E nós dois saímos satisfeitos.
Tentei conter a expressão. Mas ele percebeu. Sempre percebia.
- Vai querer mais ou não?
Minha boca se abriu, mas nenhuma palavra saiu.
Ele caminhou até mim. Pôs a mão no meu queixo e ergueu meu rosto. O toque foi leve, mas não havia ternura ali. Era como se quisesse me fazer entender algo com a proximidade.
- Não confunda intensidade com sentimento - ele disse. - Eu gosto de prazer, não de confusão.
E então se afastou, pegou a carteira, o celular, e caminhou até a porta.
- Cinthia vai cuidar dos encontros. Ela entra em contato. - Fez uma breve pausa. - Use a saída privativa. Não gosto de deixar rastros.
E então... ele foi embora.
A porta se fechou. E com ela, parece que uma parte de mim também se fechou.
Fiquei ali. Sentada. Nua, embrulhada no lençol, sozinha naquele quarto caro demais para quem lutava para pagar a conta de luz. A cabeça rodava. O corpo ainda vibrava com lembranças da noite. Mas algo dentro de mim... doía.
Era como se a realidade estivesse despencando sobre meus ombros agora que o calor dele havia ido embora.
Levantei devagar. As pernas ainda trêmulas - não mais de prazer, mas de confusão. Caminhei até o banheiro e me encarei no espelho.
Cabelos bagunçados. Pele marcada por beijos. Olhos vermelhos. Não sei se era do sono ou da vergonha.
Toquei os próprios lábios, como se tentasse lembrar se tudo tinha sido real.
Foi.
E, pior ainda... eu tinha gostado.
Muito.
Senti meu estômago revirar com a constatação. Como podia ter me entregado com tanta facilidade? Como pude me perder tanto nos braços de um homem que, no fim, me tratou como... um contrato?
Entrei no chuveiro. Liguei a água quente e deixei cair sobre mim. O calor escorria pela pele, mas nada lavava a sensação de sujeira que começava a me consumir.
Chorei.
Primeiro em silêncio. Depois, com o rosto nas mãos. Deixei as lágrimas se misturarem com a água até o corpo inteiro tremer.
Não por ele.
Por mim.
Por ter gostado. Por ter sentido prazer. Por ter acreditado - mesmo que só por minutos - que havia algo mais naquele toque.
Mas não havia.
Leonardo De Santis não era um homem. Era um sistema. Um método. Uma equação onde sentimentos não entram.
E eu? Eu era só mais uma peça no jogo dele.
Quando finalmente saí do chuveiro, os olhos estavam inchados. A toalha envolvia meu corpo, mas nada me protegia da dor que tinha ficado por dentro.
Caminhei até a poltrona, onde ainda estavam minhas roupas. Peguei o celular com dedos trêmulos.
Notificação:
"Transferência recebida - R$15.000,00 - Leonardo De Santis."
Era real.
Tudo.
Cada centavo. Cada toque. Cada lágrima.
Respirei fundo. Me vesti devagar, sentindo o pano da roupa grudar na pele ainda úmida. Antes de sair, dei uma última olhada naquele quarto luxuoso.
Era bonito.
Frio.
Vazio.
Assim como ele.
Assim como eu me sentia agora.