Capítulo 4 Reencontrando Levi

A paisagem do lado de fora da janela se desfazia em borrões enquanto o carro avançava velozmente pela estrada.

Noelle, com o olhar perdido no movimento das árvores e prédios, logo percebeu que Ethan não havia sequer tocado na pilha de documentos que repousava ao seu lado desde o momento em que ela entrou no veículo. Em vez disso, seus dedos longos e elegantes deslizavam de forma quase distraída sobre uma cicatriz fina, bem visível no seu pulso esquerdo. Era sutil, mas nítida o bastante para chamar a atenção e, para o olhar atento de Noelle, parecia estranhamente com uma marca de mordida.

Percebendo o foco dela, Ethan quebrou o silêncio com um tom casual, quase brincalhão: "Uma pessoa indomável me deixou isso."

Noelle piscou, surpresa, sem saber exatamente o que dizer.

Ethan arqueou levemente as sobrancelhas, como se acabasse de revisitar uma lembrança antiga. "Temperamento explosivo, língua afiada... uma verdadeira tempestade em forma de gente."

Noelle continuava calada. Uma pessoa indomável? Temperamento explosivo? Língua afiada?

A cicatriz tinha que estar relacionada à infância deles. Uma lembrança vívida surgiu: uma das muitas brigas de criança. Num acesso de raiva, ela havia cravado os dentes no pulso dele, com força.

Noelle nunca pensou que ele lembraria, muito menos que ainda teria a marca.

Por que ele não havia usado um creme cicatrizante ou algo assim? Por que a marca de mordida ainda estava tão visível? Seria possível que, toda vez que olhava para a marca, ele se lembrava dela com rancor?

Incomodada, Noelle franziu o cenho e esfregou a ponte do nariz, fingindo admirar a paisagem.

Ethan, por outro lado, permanecia em silêncio, recostado no banco, a observando. Seus dedos continuavam a traçar a cicatriz, como se o gesto tivesse um significado maior do que ela podia compreender.

O ar entre os dois parecia mais pesado agora. Inquieta com o olhar dele sobre si, Noelle se mexeu no banco e virou o rosto, pronta para confrontá-lo.

Mas, no instante em que seus olhos se encontraram, ela esqueceu completamente o que pretendia dizer.

Ethan sorriu de canto e falou com a voz baixa, quase arrastada, carregada de uma diversão inesperada: "O que foi, Noey? Está pensando em me morder de novo?"

Noey.

O apelido escapou dos seus lábios com tanta naturalidade que fez o coração dela acelerar. Era como voltar no tempo, pois ele sempre a chamava assim quando eram crianças.

Mas... o quê? Como ela estaria pensando em mordê-lo de novo?

Antes que ela pudesse formular qualquer resposta, o carro reduziu a velocidade e parou diante da Mansão Scenery - um dos lugares mais nobres pertencentes à família Martin.

Os portões altos de ferro forjado se abriram devagar, revelando uma vasta área verde perfeitamente cuidada.

O jardim era de tirar o fôlego: flores exóticas preenchiam os canteiros com cores vibrantes, e um lago artificial espelhava o céu com uma tranquilidade serena.

Mais adiante, os olhos alcançavam fileiras de parreiras e um pomar frondoso.

O lugar todo era muito mais impressionante do que a vila da família Moss.

O carro parou diante de uma grande fonte, e ali, aguardando com uma bengala à mão e cercado por algumas empregadas, estava um senhor de cabelos prateados. Embora a idade tivesse deixado marcas no seu rosto, seus olhos permaneciam vivos, cheios de sabedoria e calor.

Noelle o reconheceu imediatamente - era Levi.

Assim que desceu do carro, ela correu até ele, a emoção transbordando no seu olhar. "Levi! Que saudade eu senti de você!"

"Noelle, minha querida! Esperei tanto por este momento." Ele sorriu com ternura, pegando a mão dela entre as suas. Sua voz tremia com calor.

"Como está se sentindo? Está bem?", ela perguntou, preocupada.

O homem sorriu, os olhos marejados. "Agora isso não importa. Este corpo velho ainda aguenta o tranco. Mas olhe só para você... ficou mais magra. Continua linda, é claro. Sempre tão encantadora."

Noelle respondeu com um sorriso calmo, que iluminou seu rosto suavemente. Seus olhos se curvaram como luas crescentes, refletindo um brilho doce que a tornava ainda mais bela.

Desde pequena, ela era bonita - traços delicados, quase como os de uma pintura. Mas era seu olhar vivo e vibrante que mais chamava atenção.

Levi devolveu o sorriso com uma alegria genuína, como se estivesse diante de uma neta querida. Ele passou a bengala para uma das empregadas, segurou a mão de Noelle com uma das suas e estendeu a outra para Ethan. "Venham, entrem. Precisamos conversar."

Dentro da suntuosa sala de estar, os três se acomodaram nos sofás de veludo.

Uma empregada surgiu em silêncio com uma bandeja e serviu café com precisão.

Levi segurou a mão de Noelle com carinho. Respirou fundo antes de começar: "Minha saúde não tem sido das melhores nos últimos anos. Precisei ir ao exterior para um tratamento longo... e só agora estou suficientemente bem para voltar. Assim que cheguei, soube que as coisas não estavam fáceis para você com os Moss. Não consegui ficar parado diante disso, então pedi a Ethan que te trouxesse para cá. Se eles não sabem valorizar você, então deixe-os para trás. A partir de agora, esta é sua casa. Você não está sozinha. Eu sou sua família."

As palavras atingiram o coração de Noelle em cheio. Eram tão gentis e cheias de amor, que sua garganta se apertou. Sua voz saiu suave, carregada de emoção: "Levi..."

O homem acariciou a mão dela. "Pronto, querida, não precisa dizer nada. Sei que esses dois últimos anos foram difíceis."

Então, o clima mudou ligeiramente. Levi olhou para Ethan com um sorriso cheio de segundas intenções. "Você ainda se lembra de Ethan, não é? Vocês viviam grudados quando eram pequenos. Eram muito próximos naquela época."

Claro que ela se lembrava.

Noelle acenou com a cabeça educadamente, oferecendo um pequeno sorriso.

Ethan, ao lado dela, parecia completamente tranquilo.

Nenhuma expressão lhe escapava do rosto. Ele serviu uma xícara de café para Levi com gestos precisos, quase elegantes.

O olhar de Levi ganhou um brilho traquina enquanto ele perguntava casualmente: "Então, o que acha de Ethan?"

Noelle se engasgou levemente, pega de surpresa. A verdade era que os dois mal haviam conversado durante o trajeto. E, pela forma como ele se comportava, parecia que ainda guardava mágoas do passado. Ela não gostava dele, e tinha quase certeza de que o sentimento era mútuo.

Ainda assim, Levi não deixaria isso passar. "Diga, minha doce menina. Quero ouvir da sua boca."

Noelle suspirou, desviou o olhar e murmurou: "Ele... é bom."

Ethan continuou sereno, mas arqueou uma sobrancelha com leveza.

Então, ele se voltou para ela, a encarando por alguns segundos antes de desviar o olhar.

Já Levi parecia satisfeito como uma criança travessa. "Perfeito! Era tudo o que eu precisava ouvir. Agora posso ficar em paz."

Noelle o encarou, confusa. "O que quer dizer com isso?"

Levi soltou uma gargalhada calorosa enquanto explicava: "Anos atrás, seu avô e eu combinamos que você e Ethan iriam se casar. E vendo vocês juntos agora... ah, continuam um par maravilhoso. Noey, não há melhor momento do que agora. Por que você e Ethan não se casam hoje mesmo?"

Noelle o fitou, chocada. Em protesto, ela disse: "Levi, isso é muito repentino!"

Então, de repente, o rosto dele ficou sério. "Noey, não estou bem de saúde. Não sei quanto tempo me resta. Mas se eu puder ver você e Ethan começando uma vida juntos... isso me daria paz. Não precisa se preocupar, criança. A família Martin vai te proteger. Ethan estará ao seu lado. Sempre."

Noelle se calou. O amor na voz de Levi era palpável, e a última coisa que ela queria era decepcioná-lo.

Instintivamente, ela se virou para Ethan, em busca de apoio, suplicando com os olhos. Ela acreditava que ele certamente não queria isso também, pois eles não se davam bem. Ele sempre fora estranhamente distante com ela, parecendo incomodado com sua presença. Não havia chance de ele concordar.

Mas, com uma calma surpreendente, Ethan colocou a xícara sobre a mesa e olhou diretamente para o avô. "Tudo bem, vovô. Vou ao cartório com ela registrar o casamento hoje."

Noelle o encarou, atônita. O que diabos estava acontecendo?