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A porta da pequena livraria se abriu com o tilintar de um sino antigo. O cheiro de papel envelhecido e café recém-passado tomou o ar como uma lembrança boa que chega sem ser chamada. Helena entrou devagar, com a hesitação de quem não quer atrapalhar o silêncio.
Havia algo naquela livraria que lembrava uma igreja sem altar: tudo pedia respeito. As estantes de madeira escura, os livros empilhados com desordem intencional, a vitrola rodando um disco antigo de jazz. Ela se aproximou, quase em reverência.
Foi então que o viu pela primeira vez.
Atrás do balcão, um homem de camisa azul desbotada organizava uma pilha de romances. Tinha os cabelos escuros e desalinhados, como quem passava mais tempo com livros do que com espelhos. A barba por fazer e os olhos fundos o deixavam mais velho do que parecia. E o curioso é que ele não sorriu. Nem mesmo quando Helena, com seu sotaque suave, murmurou:
- Buongiorno...
Ele apenas levantou os olhos, assentiu com a cabeça e voltou ao que fazia. Sem simpatia, mas sem frieza. Era como se ele fosse feito da mesma madeira das estantes: discreto, firme, com marcas do tempo.
- Você tem algo leve... algo que ajude a respirar? - ela perguntou, olhando as lombadas gastas.
Ele não respondeu de imediato. Caminhou até o fundo da livraria e voltou com um livro em italiano de capa creme, com as bordas comidas pela poeira. Estendeu para ela sem dizer nada. Apenas olhou.
- Obrigada... - ela sorriu.
Ele assentiu de novo, desta vez com os olhos demorando um segundo a mais nos dela. Um segundo quase imperceptível, mas que deixou o ar mais denso.
Helena saiu dali com o livro nas mãos e o coração um pouco mais inquieto. Não sabia ainda que aquele homem era Luca. E que aquele silêncio seria o início de uma conversa longa, feita mais de gestos do que de palavras.
Enquanto ela caminhava de volta para sua hospedaria, sentiu que, pela primeira vez em muito tempo, o mundo estava mais devagar. E isso era bom. Porque só assim o amor encontra tempo para nascer.