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Na manhã seguinte, Helena voltou à praça como quem retorna a um lugar onde esqueceu um pedaço de si. A praça era simples, quase sem nada - uma fonte pequena no centro, alguns bancos de pedra, árvores magras, e um cheiro suave de pão doce que vinha do café ao lado. Mas ali havia algo que nem as fotografias seriam capazes de guardar: uma espécie de quietude que parecia falar com o coração.
Ela escolheu um banco perto da fonte, abriu o livro que Luca lhe dera, mas não leu. Apenas o manteve aberto sobre o colo, como se a história entrasse por osmose, como se bastasse estar ali para ser tocada por algo maior.
Foi quando viu a cadeira.
Uma daquelas cadeiras de ferro forjado, separada do conjunto de mesas do café, estava afastada, vazia, apontada diretamente para o centro da praça. Como se esperasse alguém.
Helena a olhou por longos minutos. Parecia uma cadeira comum, mas nela havia uma presença ausente, um espaço que gritava silêncio. Uma ausência com forma.
Um garçom jovem passou por ela carregando uma bandeja e, vendo seu olhar curioso, comentou:
- Aquela cadeira é do senhor Matteo. Ele vinha todo dia. Mesma hora, mesmo café, mesmo silêncio.
- E agora?
- Ele se foi faz dois meses. Mas ninguém tem coragem de tirar a cadeira dali. Parece que a cidade ainda espera por ele.
Helena sorriu com os olhos.
Esperar por quem já partiu é uma forma bonita de honrar quem ficou.
O vento balançava as folhas da árvore acima dela. Era como se tudo respirasse num compasso só: a praça, o banco, o livro, a cadeira vazia... e seu próprio peito, onde a saudade dormia inquieta.
Ela anotou no caderno:
"Algumas ausências são tão inteiras que continuam sentadas diante de nós, mesmo quando já não têm corpo."
Fechou o livro. Não era dia de leitura. Era dia de escuta.
E naquela praça, até o silêncio parecia contar histórias.