"Júlia, meu amor, você voltou!", disse Caio, com a voz alegre, como se tivesse acabado de voltar de uma viagem de negócios normal. "Eu estava tão preocupado. Você não estava atendendo o telefone."
Olhei para ele, depois para o cachorro, e de volta para ele. Não disse nada.
"Eu sinto muito, muito mesmo, pela sua mãe", disse Helena, sua voz escorrendo falsa compaixão. Ela deu um puxãozinho na coleira. Caesar ofegava, a língua para fora. Ele era apenas um cachorro, um instrumento da malícia dela. Minha raiva não era por ele. Era por eles.
Caio deu um passo à frente.
"A Helena se sente péssima com o que aconteceu. Viemos aqui para nos desculparmos apropriadamente."
Ele colocou o braço em volta de Helena, que se inclinou nele, olhando para ele com olhos de adoração.
"Ele tem sido tão doce, cuidando do pobre Caesar. A coisa toda foi tão traumática para ele, sabe. Ele mal tem comido."
Meu olhar estava fixo no cachorro. O animal que havia rasgado a carne da minha mãe. E eles o trouxeram aqui. Para o meu escritório.
"Queremos consertar as coisas", disse Caio com seriedade. "Mas só podemos fazer isso se você estiver disposta a nos encontrar no meio do caminho, Júlia."
Um pedido de desculpas com condições. Típico do Caio.
Finalmente encontrei minha voz. Estava firme, desprovida de emoção.
"O cachorro também quer se desculpar?"
A pergunta pairou no ar.
O rosto de Helena se contraiu.
"O que isso quer dizer?"
"Quer dizer", eu disse, voltando toda a minha atenção para ela, "que foi ele quem mordeu. Ou você se esqueceu dessa parte? Talvez ele devesse se ajoelhar nas patas e implorar pelo meu perdão."
O rosto de Helena ficou vermelho e manchado.
"Você está sendo ridícula! Ele é só um animal!"
"Exatamente", eu disse. "E minha mãe era só uma pessoa."
"Júlia, já chega!", Caio retrucou, sua voz afiada. A máscara de arrependimento havia caído. "Você está magoando a Helena."
Ele a puxou para mais perto, acariciando seu cabelo.
"Ela já passou por muita coisa. Ela está aqui, tentando ser a pessoa madura e se desculpar, e você a está atacando."
Uma dor, tão aguda e familiar, atravessou meu peito. Ele a estava defendendo. De novo. Mesmo agora.
Por que eu pensei que seria diferente? Por que, por um segundo, pensei que ele tinha vindo aqui por mim?
Helena começou a fungar, enterrando o rosto no peito de Caio.
"Eu só queria dizer que sentia muito", ela choramingou. "Eu nunca quis que nada disso acontecesse."
"Eu sei, Lena, eu sei", Caio arrulhou, fuzilando-me com o olhar por cima da cabeça dela. "Ela só está de luto. Não está em seu juízo perfeito."
Então ele olhou para mim, o rosto duro.
"Você deve um pedido de desculpas à Helena. Você foi cruel e injusta."
A exigência era tão absurda, tão grotescamente injusta, que quase ri. Pedir desculpas? Para ela? A mulher que sorriu enquanto meu mundo desmoronava?
"Não", eu disse.
A palavra foi baixa, mas teve a força de um tiro.
"O que você disse?"
"Eu disse não."
"Júlia Soares!", ele rugiu, usando meu nome completo pela primeira vez em todo o nosso relacionamento. Soou como uma acusação. "O que deu em você? Você está sendo completamente irracional!"
"Estou?", perguntei, minha voz ainda perturbadoramente calma. "Deixe-me te perguntar uma coisa, Caio. Quando enterraram minha mãe, ela parecia irracional para você?"
Ele recuou, o rosto pálido. Ele não tinha resposta.
Virei-me, peguei minha caixa de pertences e caminhei em direção à porta.
"Onde você vai?", ele exigiu.
Eu não olhei para trás. Ao passar pela mesa de sua secretária, coloquei um envelope branco sobre ela.
"Minha demissão", eu disse à mulher de aparência atônita. "Efetiva imediatamente."
Como vice-presidente sênior, eu não precisava da aprovação dele para sair. Eu tinha essa autoridade. Era uma das poucas coisas que eu tinha que era verdadeiramente minha.
Não fui para casa. Não suportava a ideia de estar naquela casa, um espaço que um dia foi nosso e agora parecia contaminado. Fiz check-in em um hotel no centro.
Meu celular vibrava incessantemente. Uma enxurrada de mensagens de Caio.
*Júlia, onde você está?*
*Não faz isso. Podemos conversar.*
*Me desculpe. Eu fui um idiota. Por favor, volte para casa.*
*Eu te amo.*
Olhei para as mensagens, uma após a outra, e não senti nada além de um vazio profundo e cansado.
Desliguei meu celular.