"Coitadinha", disse ele, envolvendo-me em seus braços. O abraço dele parecia uma jaula. Cada palavra, cada toque era uma mentira. "Minha reunião foi até muito tarde. Deveríamos fazer algo para comemorar o fechamento do negócio. E... já se passaram cinco anos."
Eu o encarei, minha expressão cuidadosamente vazia.
"Cinco anos desde o quê?"
"Desde que a Kiara... foi embora", disse ele, seus olhos cheios de falsa compaixão. "Sei que foi difícil para você, o que ela fez. Pensei que talvez nós, e seus pais, pudéssemos ter um jantar tranquilo. Para marcar a data. Para celebrar o quão longe chegamos."
A audácia era de tirar o fôlego. Eles queriam celebrar o aniversário da mentira que construíram ao meu redor. Senti uma raiva fria e afiada cortar a dor.
"Isso é... uma ideia atenciosa, Ivan", eu disse, minha voz firme. "Vamos fazer isso."
O rosto dele se iluminou de alívio.
"Ótimo. Vou avisar seus pais. Eles ficarão muito felizes por você estar bem com isso."
Ele estava tão seguro de mim, tão confiante em seu engano. Ele saiu para o trabalho, assobiando, me deixando sozinha no apartamento estéril e bonito que agora parecia uma prisão. No momento em que a porta se fechou, fui direto para o escritório dele.
Estava sempre trancado. Ele me disse que era por causa de documentos de trabalho sensíveis. Eu costumava respeitar isso. Agora, eu sabia que era um cofre para seus segredos. Mas eu era médica. Eu conhecia pontos de pressão, sabia como encontrar fraquezas. E eu conhecia Ivan. A senha dele não era complexa; era arrogante. Era a data em que ele me pediu em casamento.
Eu digitei. A fechadura estalou.
A sala era impecável, dominada por uma grande mesa de mogno. Comecei por ali. Em uma gaveta trancada, encontrei um pequeno álbum de fotos de couro. Minhas mãos tremiam enquanto eu o abria.
Não estava cheio de fotos nossas. Eram fotos e mais fotos de Ivan, Kiara e o filho deles, Léo. No parque, na praia, comemorando aniversários com bolos e velas. Uma família perfeita e feliz. Em uma foto, meus pais também estavam lá. Minha mãe segurava Léo, radiante, enquanto meu pai estava com o braço em volta de Kiara. Eles pareciam mais felizes naquele momento roubado do que eu jamais os vira comigo.
A evidência era esmagadora, mas eu precisava de mais. Fui para o notebook dele. A senha era a mesma. Seus arquivos estavam meticulosamente organizados. Encontrei uma pasta chamada "Pessoal". Dentro, outra pasta: "L".
Era tudo. Vídeos dos primeiros passos de Léo. Suas primeiras palavras. Cópias da certidão de nascimento dele, listando Ivan como o pai. E uma subpasta chamada "Finanças".
Cliquei nela e meu sangue gelou. Havia transferências bancárias mensais de uma conta conjunta pertencente aos meus pais, Ricardo e Eleonor Mendonça, para uma empresa de fachada. Os valores eram impressionantes. Milhões de reais ao longo de cinco anos. A descrição em cada uma era a mesma: "Despesas de Vida K.R."
Eles não apenas permitiram isso; eles financiaram. Cada palavra gentil que já me disseram, cada presente caro, cada promessa vazia de família, foi pago com o mesmo dinheiro que usaram para sustentar a mulher que tentou me arruinar e a família secreta que meu noivo estava criando com ela.
A ilusão do amor deles não era apenas uma mentira; era uma transação. Eu era o preço que eles pagavam para acalmar a culpa que sentiam por Kiara.
Copiei tudo para um pequeno pen drive criptografado. Cada foto, cada vídeo, cada extrato bancário. Enquanto os arquivos eram transferidos, meu celular vibrou. Uma mensagem de um número desconhecido.
"Se divertindo de detetive? Você nunca vai encontrar nada. Eles me amam, Alina. Sempre amaram. Você foi apenas uma substituta conveniente."
Era Kiara. Ela devia ter uma câmera escondida no escritório. O pensamento fez minha pele arrepiar.
Ela enviou uma foto. Era da foto de família que eu tinha acabado de ver, aquela com meus pais.
"Ficamos bem juntos, não acha? Como uma família de verdade."
Outra mensagem se seguiu.
"O Ivan só está com você por pena. E seus pais? Eles estão apenas pagando o que devem. Você sempre será a intrusa, a garota do orfanato que não pertence a este lugar."
As provocações eram para me quebrar. E por um momento, elas conseguiram. Apoiei-me na mesa, com o pen drive na mão, e uma única lágrima quente de raiva e dor escorreu pelo meu rosto.
Mas então, a dor se transformou em outra coisa. Algo frio e claro.
Ela estava errada. Eu não ia quebrar. Eu ia queimar o mundo deles até as cinzas.