"O chef fez sua especialidade só para você. Um creme de cogumelos."
Eu podia sentir o cheiro. O leve, quase indetectável, aroma de amêndoas do benzodiazepínico misturado. Eles nem tentaram ser criativos. Eram arrogantes.
"Obrigada, mãe", eu disse, pegando minha colher. Olhei para ela, depois para meu pai. "Significa muito que vocês todos estejam aqui. Que possamos finalmente deixar o passado para trás."
Seus rostos se suavizaram de alívio. Eu estava desempenhando meu papel perfeitamente. Tomei uma colherada da sopa. Depois outra. Comi metade da tigela, meu estômago se contraindo a cada gole, não pela droga, mas pela traição.
Depois de alguns minutos, pressionei a mão na testa.
"Estou me sentindo um pouco... tonta. Acho que o cansaço do plantão no hospital finalmente me pegou."
"Oh, coitadinha", disse Eleonor, sua preocupação uma obra-prima de ficção. "Claro. Você deveria descansar."
"Vocês se importariam se eu fosse... ao toalete por um momento?", perguntei, minha voz intencionalmente fraca.
"Vá, vá", insistiu Ricardo. "Estaremos bem aqui."
Dei-lhes um último olhar. Meus pais. As pessoas que deveriam me amar incondicionalmente.
"Vocês já se arrependeram?", perguntei, a pergunta escapando antes que eu pudesse pará-la. "Pelo que aconteceu comigo? Por todos os anos que estive fora?"
Eles me encararam, seus sorrisos vacilando. Havia um lampejo de algo em seus olhos - culpa, talvez - mas foi rapidamente extinto.
"Claro que sim, Alina", disse meu pai, sua voz um pouco firme demais. "Todos os dias."
Uma mentira. Outra. Eu não insisti. Apenas assenti.
"Fico feliz."
Caminhei em direção aos fundos do restaurante, meus passos firmes. Uma vez dentro do banheiro opulento e vazio, tranquei a porta, ajoelhei-me diante do vaso sanitário e me forcei a vomitar, meu corpo convulsionando até que a sopa e o veneno se foram. Enxaguei a boca, meu rosto pálido, mas meus olhos claros no espelho.
A tontura era um ato, mas a náusea era real.
Quando voltei para o apartamento que um dia dividi com Ivan, ele estava esperando. Estava vestido para a festa, a festa de Kiara, seu rosto brilhando de antecipação. Ele estendeu uma taça de champanhe.
"Um brinde", disse ele, sorrindo. "A nós. Ao nosso futuro."
Vi o pó fino no fundo da minha taça. Uma segunda dose. Eles estavam se certificando.
Desempenhei o papel da noiva apaixonada uma última vez.
"A nós", ecoei, minha voz leve e arejada. Deixei-o pensar que eu estava tonta por causa do jantar, apoiando-me levemente nele.
"Preciso ir ao hospital um pouco", disse ele, a mentira rolando de sua língua com facilidade praticada. "Uma consulta de emergência. Voltarei o mais tarde que puder."
"Não se preocupe comigo", eu disse. Peguei a taça de champanhe e, olhando-o diretamente nos olhos, bebi tudo de uma vez. O sorriso dele se alargou. Ele pensou que tinha vencido.
"Te vejo mais tarde", disse ele, me dando um beijo rápido. Ele saiu pela porta sem um segundo olhar. Ele nunca olhou para trás.
No momento em que ele se foi, corri para o banheiro e expurguei o champanhe, meu corpo tremendo com o esforço. Quando terminei, senti-me estranhamente calma. Limpa.
Troquei para roupas simples e escuras. Fui para a sala de estar, onde uma única caixa de presente elegantemente embrulhada estava na mesa de centro. Eu a havia preparado naquela tarde.
Liguei para o mordomo da mansão Mendonça, um homem que me havia mostrado pequenas gentilezas ao longo dos anos.
"Júlio", eu disse. "Tenho um pacote que precisa ser entregue na festa às 22h em ponto. Nem antes, nem depois. Você pode fazer isso por mim?"
"Claro, Dra. Mendonça", disse ele, sua voz firme.
Dentro da caixa estava o pen drive, um pequeno alto-falante portátil e um único cartão escrito à mão.
Minha última parada foi uma rua tranquila com vista para a mansão secreta. A festa estava a todo vapor. Eu podia ver todos eles através das janelas - Ivan, Kiara, Léo, meus pais - rindo, celebrando uma vida construída sobre a minha dor. Eles pareciam tão felizes.
Meu celular vibrou. Uma mensagem de Debi.
"Decolagem em 30. Você está livre."
Olhei para a cena uma última vez, um quadro de sua felicidade perfeita e falsa. Não senti nada. Nenhuma raiva, nenhuma tristeza. Apenas uma paz profunda e vazia.
Joguei meu celular em um bueiro, a tela se estilhaçando no concreto abaixo. Eu já havia cancelado o número, apagado os dados.
Alina Mendonça se foi. Virei as costas para a mansão reluzente e caminhei em direção ao aeroporto, em direção à minha nova vida, sem olhar para trás.