Seu cheiro familiar, uma mistura de colônia cara e algo unicamente dele, encheu meus sentidos. Era um cheiro que costumava significar segurança. Agora, apenas cheirava a mentiras.
- Você não jantou - ele murmurou, sua voz um ronco baixo na escuridão. Ele tocou meu ombro, um gesto casual e possessivo.
Minha pele se arrepiou. Eu me afastei de seu toque.
Sua respiração estava quente na parte de trás do meu pescoço, e eu podia sentir o calor de seu corpo se infiltrando pelo tecido fino da minha camisola. Ele costumava me abraçar assim todas as noites, seus braços uma jaula que eu confundira com um lar. Esta noite, meu coração era uma pedra no peito, frio e pesado. Não havia palpitação de excitação, nem aceleração do meu pulso. Havia apenas um vasto e vazio deserto onde meu amor costumava estar.
Tentei me sentar, para colocar distância entre nós.
- Estou cansada.
- Fique - ele ordenou, seu braço apertando minha cintura, me puxando de volta contra ele. - Só por um instante.
Seus lábios roçaram meu pescoço, movendo-se com uma confiança preguiçosa em direção à tatuagem sobre o meu coração. Minha marca. A reivindicação permanente que ele tinha sobre mim.
Uma onda de humilhação me invadiu, tão forte que me deixou tonta. Esta marca, antes um símbolo do meu amor eterno, agora parecia a marca de uma escrava. Um lembrete da minha própria estupidez.
Ele conhecia cada centímetro do meu corpo, cada curva secreta e ponto sensível. Sua mão se movia com uma familiaridade experiente que me dava vontade de gritar.
- Por favor, Arthur - sussurrei, minha voz trêmula. - Não.
Ele me ignorou, seus dedos traçando o contorno do meu quadril. Seu toque era clínico, praticado e totalmente desprovido da paixão que eu um dia imaginei que existia.
Ele estava prestes a me tomar, aqui e agora, como se nada tivesse mudado. Como se seu "verdadeiro amor" não estivesse dormindo no quarto principal, no fim do corredor.
Então, quando senti seu peso se acomodar sobre mim, ele parou.
- Sua menstruação está atrasada - ele disse, seu tom casual, quase entediado.
A raiva, fria e afiada, cortou meu medo. Ele nem se lembrava. Todas aquelas vezes, toda aquela dor, e nem sequer registrava. Para ele, meu corpo era apenas um calendário, uma coisa a ser gerenciada e controlada. Eu não era nada mais que um recipiente, uma conveniência.
O pensamento era tão vil que me deu enjoo. Empurrei seu peito, minha voz carregada de uma fúria que eu não sabia que possuía.
- Você não deveria estar com sua noiva? Tenho certeza de que a Giselle está esperando por você.
Isso funcionou.
O nome Giselle foi como um balde de água fria. Ele enrijeceu, cada músculo de seu corpo ficando tenso. Por um longo momento, ele não se moveu. Então, ele rolou para fora de mim, o calor de seu corpo substituído por um vazio súbito e arrepiante.
Ele se levantou, uma silhueta alta contra o luar que entrava pela janela.
- Você tem razão - disse ele, sua voz plana e fria. Ele saiu do quarto sem outra palavra, fechando a porta suavemente atrás de si.
Alguns minutos depois, ele voltou. Estava carregando uma bandeja. Nela, uma tigela de sopa de peixe, do tipo que ele sabia que era a minha favorita, do tipo que minha mãe costumava fazer.
Eu encarei a sopa. Ele tinha até tirado todas as espinhas minúsculas, como sempre fazia. Lembrei-me de uma das primeiras vezes que ele fez isso. Eu tinha dezesseis anos, lutando com um pedaço de bacalhau, e ele pegou meu prato sem dizer uma palavra, seus dedos longos e elegantes removendo metodicamente cada espinha antes de colocá-lo de volta na minha frente.
Foi uma das mil pequenas gentilezas que me fizeram apaixonar por ele.
Ele me conhecia. Conhecia meus hábitos, meus gostos, minhas aversões. Ele me conhecia melhor do que ninguém. E ele não me amava. O pensamento foi uma nova punhalada de dor.
O cheiro rico e saboroso da sopa atingiu meu nariz, e meu estômago se revoltou. Uma onda de náusea, mais forte desta vez, me atingiu. Saí da cama às pressas, pegando a pequena lixeira ao lado da minha escrivaninha bem a tempo.
Eu vomitei, meu corpo convulsionando com ânsias secas. Não havia nada no meu estômago para sair.
Quando os espasmos finalmente diminuíram, eu olhei para cima. Arthur estava parado na porta, seu rosto uma máscara de pedra.
- Você está grávida de novo? - ele perguntou, sua voz perigosamente quieta.
Gelo inundou minhas veias. Meu rosto, já pálido, deve ter ficado branco como um fantasma. Era isso. Este era o momento em que ele tiraria meu bebê de mim. Eu não podia deixá-lo. Eu não deixaria.
- Não - eu disse, forçando minha voz a ser firme. Olhei-o diretamente nos olhos, rezando para que ele não pudesse ver o terror em guerra com o desafio dentro de mim. - Não estou.
O silêncio no quarto se estendeu, denso e sufocante. Seu olhar era intenso, perscrutador, e por um segundo aterrorizante, pensei que ele pudesse ver através de mim, direto para a vida minúscula e cintilante que eu estava tão desesperada para proteger.
Mas então, a dureza em seus olhos se suavizou, substituída por algo que eu não conseguia ler. Alívio? Decepção? Eu não sabia. Eu não me importava.
- Bom - ele finalmente disse, sua voz seca. - É melhor assim.
Ele se virou para sair, depois parou na porta.
- Giselle e eu vamos nos casar no mês que vem.
As palavras foram o último prego no caixão do meu amor morto.
- Ok - eu disse, minha voz surpreendentemente calma. Eu estava entorpecida. Não havia mais nada que ele pudesse ferir.
Ele pareceu surpreso com minha falta de reação. Ele esperava lágrimas, súplicas. Ele esperava a garota quebrada que ele havia criado com tanto cuidado. Mas aquela garota se foi.
- Estou cansada, Arthur - eu disse, as palavras pesadas com um cansaço que ia até os ossos. - Estou apenas... tão cansada de tudo isso.
Eu até consegui um sorriso pequeno e triste.
- Parabéns. Espero que você e a Giselle sejam muito felizes.
Eu não iria ao casamento, claro. Mas mandaria um presente. Um generoso. Era o mínimo que eu podia fazer para garantir um rompimento limpo. Um adeus final e educado.