- Não! - A palavra foi arrancada da minha garganta. Um instinto primal e protetor surgiu em mim. Eu era uma leoa defendendo seus filhotes, mesmo os fantasmas deles.
Nós lutamos, nossas mãos travadas ao redor da pequena bolsa. Foi uma luta patética e desesperada. O tecido rasgou, e a bolsa caiu de nossas mãos, espalhando seu conteúdo pelo chão.
Oito minúsculos cadeados de prata.
Eles rolaram pelo piso de madeira polida, cada um uma pequena e brilhante lápide para uma vida que nunca existiu.
Giselle olhou para eles, um sorriso torcido brincando em seus lábios. Então ela levantou o pé, seu salto agulha esmagando um dos pequenos cadeados no chão.
- Ops - disse ela, sem parecer nem um pouco arrependida. - Que pena. Mas eles nunca deveriam ter existido, não é mesmo?
- Pare com isso! - gritei, me jogando no chão, tentando proteger as pequenas peças de prata com meu corpo.
Eu me apressei para juntá-los, para resgatá-los de sua profanação. Quando alcancei o último, o salto dela desceu com força nas costas da minha mão, prendendo-a no chão. A dor, branca e ofuscante, disparou pelo meu braço.
Ela se inclinou, o rosto perto do meu, seu hálito cheirando a morangos e triunfo.
- Você é patética, Clara.
Antes que eu pudesse reagir, ela pegou um pesado peso de papel de vidro da minha escrivaninha e o bateu contra o lado da minha cabeça.
O mundo explodiu em uma chuva de estrelas. A dor rugiu em meus ouvidos. Mas através da névoa, uma onda de raiva pura e inalterada me deu força. Eu ataquei cegamente, minha mão conectando com o rosto dela.
Não foi um golpe forte, mas Giselle era uma atriz. Ela ofegou, cambaleando para trás, e se jogou no chão com um grito teatral de dor.
Assim que ela caiu, a porta se abriu com violência.
Arthur entrou correndo, seu rosto uma nuvem de fúria. Ele viu Giselle no chão, chorando, e eu, desgrenhada e com os olhos arregalados, com a mão ainda levantada.
Ele não hesitou. Ele pegou Giselle em seus braços, embalando-a como se ela fosse feita de vidro.
- O que você fez? - ele rugiu para mim.
Minha cabeça estava girando. Agarrei os minúsculos cadeados em minha mão machucada, as bordas afiadas cravando em minha palma.
- Ela me bateu, Arthur! - Giselle soluçou, apontando um dedo trêmulo para mim. - Eu só vim ver se ela estava bem, e ela me atacou! Ela é louca! Acho que ela está tendo algum tipo de colapso!
Abri a boca para me defender, para lhe contar a verdade, mas as palavras não saíam. Qual era o sentido? Ele já me havia julgado.
Seus olhos caíram para os cadeados de prata em minha mão. Um lampejo de algo - reconhecimento, culpa - passou por sua expressão. Ele sabia o que eram. Ele sabia o que significavam.
Mas ele não disse nada. Ele simplesmente alisou o cabelo de Giselle, sua voz um murmúrio baixo e calmante.
- Está tudo bem, estou aqui. Vou cuidar de você.
Ele voltou seu olhar frio para mim.
- Vou levar a Giselle ao médico para ver se está tudo bem.
- Você deveria internar a Clara - sussurrou Giselle, alto o suficiente para eu ouvir. - Ela está instável. Como seu tutor legal, você tem o direito. Para o bem dela.
Arthur considerou. Eu podia ver o cálculo frio em seus olhos. Ele estava realmente considerando me trancar em um hospital psiquiátrico.
- Não - sussurrei, balançando a cabeça. - Eu não sou louca.
Olhei para ele, meu último pingo de esperança se agarrando a um apelo desesperado.
- Arthur, eu estou grávida. É seu filho. Eu ia embora. Eu ia para a casa dos meus pais. Por favor, apenas me deixe ir.
Ele não reagiu. Era como se eu não tivesse falado. Ele e Giselle saíram, me deixando nas ruínas do meu quarto, cercada pelos fantasmas dos meus filhos.
Uma hora depois, eles vieram me buscar.
Dois homens grandes de uniforme branco. Eles não ouviram meus protestos, minhas súplicas desesperadas.
- Eu não sou louca! - gritei enquanto eles me arrastavam para fora da casa, meu lar. - Eu não sou louca!
Um deles me olhou com olhos entediados e sem simpatia.
- É o que todas dizem, senhorita.
Eles me forçaram a entrar em uma van. O mundo do lado de fora da janela se transformou em um borrão sem sentido enquanto minha última esperança morria. Eu estava sendo levada, e o homem que eu amava, o homem a quem eu dera tudo, foi quem assinou os papéis.
A van parou. Fui puxada para fora, meus braços presos em um aperto de ferro. Eu o vi então, parado sob as luzes cruas e impiedosas da entrada do hospital.
Arthur.
- Arthur, por favor! - gritei, lutando contra meus captores. - Me ajude! Como você pôde fazer isso? O que você vai dizer aos meus pais?
Por um momento, pensei ter visto um lampejo de dúvida em seus olhos. Um vislumbre do homem que eu conhecia. Pensei que ele estava ali para me salvar.
Eu era uma tola.
Ele caminhou em minha direção, o rosto sombrio. Ele parou a centímetros de distância, perto o suficiente para eu ver a luz fria e dura em seus olhos.
- Isso é para o seu próprio bem, Clara - disse ele, sua voz plana e desprovida de emoção. - Você machucou a Giselle. Você precisa ficar aqui, para refletir sobre o que fez.
Ele se inclinou mais perto, sua voz baixando para um sussurro conspiratório.
- Não se preocupe. Quando você aprender a lição, quando admitir que estava errada, eu venho te buscar.
Suas palavras eram uma sentença de morte. Ele não estava me salvando. Ele estava me aprisionando. Tudo por ela. Por Giselle.
Naquele momento, eu finalmente entendi. Eu não era nada para ele. Um peão em seu jogo de vingança, uma diversão temporária, um obstáculo a ser removido.
Meu amor, minha dor, meus filhos - todos eram sem sentido.