Levantei, tomei um copo de água e fui direto para o treino. Sempre gostei de cuidar do corpo, não só pela estética, mas porque me ajuda a manter a mente firme. Coloquei o tênis, liguei a esteira e deixei o suor falar por mim. Trinta minutos correndo, mais vinte levantando peso. Quando terminei, estava com a camiseta encharcada, mas com a cabeça no lugar.
No banho, fiquei parado por alguns segundos, deixando a água quente cair sobre os ombros. Fechei os olhos e pensei: Hoje não posso ser o playboy das colunas sociais. Hoje eu preciso ser o herdeiro que todos esperam ver.
Depois, passei a navalha no rosto, caprichei no perfume e escolhi a roupa com calma. Terno azul marinho, gravata vinho, sapatos engraxados. O reflexo no espelho mostrava um homem impecável, pronto para enfrentar qualquer sala de reunião. Mas por dentro eu ainda sentia aquele frio na barriga.
No caminho para a empresa, encarei a cidade pela janela do carro. Trânsito caótico, buzinas, gente apressada. Tudo normal, exceto pelo fato de que meu nome logo estaria em todas as manchetes econômicas.
Cheguei na sede da Martinez alguns minutos antes da hora marcada. O prédio imponente, de vidro espelhado, refletia a luz da manhã. Entrei sendo cumprimentado por recepcionistas, seguranças, funcionários que claramente já me conhecem, mas que agora olhavam com mais atenção.
A reunião foi marcada no auditório principal, onde cabiam todos os funcionários administrativos e diretores. Entrei junto com meu pai. Ele, como sempre, imponente, com aquela postura que intimida até quem não tem motivo pra ter medo.
Subimos ao palco improvisado e, por um instante, senti todos os olhares sobre mim. Diretores, gerentes, secretárias, cada um com sua opinião formada antes mesmo de me ouvir. Respirei fundo.
Meu pai tomou a palavra primeiro:
- Bom dia a todos. - A voz dele ecoou firme pelo auditório. - Hoje é um dia importante para esta empresa. Como vocês sabem, a Martinez sempre foi construída sobre os pilares da excelência, do respeito e da liderança.
Alguns assentiram, outros apenas aguardaram em silêncio.
- A partir de hoje, meu filho, Heitor Martinez, assumirá o cargo de CEO interino.
Houve um burburinho leve na plateia. Eu podia sentir as dúvidas pairando no ar.
- Quero deixar claro que essa decisão não se baseia em questionar sua capacidade profissional. - continuou ele, olhando diretamente para mim, mas falando para todos. - Heitor já demonstrou, em diversos momentos, que tem talento e competência. Contudo, este será um período de experiência. Existem outros motivos, de ordem pessoal, que me fizeram tomar essa decisão.
Meu estômago revirou. Eu sabia exatamente do que ele estava falando. O maldito ultimato. Mas, claro, ele não revelaria isso em público.
- Quero que todos recebam meu herdeiro com honra, como merecem aqueles que carregam o nome Martinez. - finalizou ele, em tom solene.
Aplausos começaram tímidos, mas logo ecoaram pelo auditório. Eu me aproximei do microfone.
- Bom dia. - comecei, tentando manter a voz firme. - Eu sei que muitos de vocês me conhecem das reuniões, mas talvez também das colunas sociais. E eu entendo perfeitamente as dúvidas que podem existir. Mas hoje, quero deixar claro que estou aqui para trabalhar. Minha vida pessoal não entra nessa sala. Aqui, sou apenas Heitor Martinez, e vou fazer de tudo para que essa empresa continue crescendo e inovando.
Houve um silêncio respeitoso. Continuei:
- Sei que a confiança não se conquista com palavras, e sim com resultados. Então é isso que eu vou entregar. Resultados.
Os aplausos foram mais fortes dessa vez. Meu pai assentiu discretamente, como quem diz "agora é com você".
E era mesmo.
Naquele instante, percebi que o jogo tinha começado de verdade.
Depois da apresentação na empresa, e um dia cheio, meus amigos decidiram comemorar. Claro, não iam perder a chance de me zoar e, ao mesmo tempo, brindar ao meu novo cargo. O destino escolhido? A boate Singles, reduto conhecido pelas noites quentes e pelo entretenimento exclusivo.
Peguei o celular e mandei mensagem para o gerente da casa:
- Reserva uma sala exclusiva. E eu quero a melhor dançarina de vocês.
Assim que saí da empresa, passei no apartamento. Nada de repetir o terno do dia. Tomei um banho demorado, deixei a água levar a tensão acumulada e me arrumei com calma: camisa preta ajustada, calça de alfaiataria escura, sapatos italianos impecáveis. Completei com um relógio de pulseira de couro e perfume na medida certa. Eu queria ser notado.
Cheguei à boate e encontrei meus amigos já no bar, animados, taças na mão. Rimos, trocamos piadas, e logo fomos conduzidos para a sala exclusiva que eu havia reservado. O ambiente era luxuoso: iluminação baixa, sofás de couro, garrafas de champanhe e uísque sobre a mesa. No centro, um pole dance iluminado por holofotes discretos.
Foi quando ela entrou.
A porta se abriu devagar e, por um instante, o tempo pareceu desacelerar. Ela surgiu usando apenas lingerie vermelha rendada, salto alto que alongava ainda mais as pernas e uma máscara que cobria parte do rosto. O que escapava dela já era suficiente para me deixar sem ar: olhos claros, profundos, que hipnotizavam; lábios vermelhos, desenhados como uma obra de arte.
O corpo? Perfeito. Curvas precisas, pele suave, postura sedutora. Uma verdadeira deusa mascarada.
A música começou a tocar e ela se aproximou do pole com confiança. Cada movimento era calculado, cada giro, cada descida, tudo feito para incendiar o ambiente. Meus amigos vibravam, gritavam, batiam palmas. Eu? Eu não conseguia tirar os olhos dela.
Era como se o resto da sala tivesse desaparecido. Só existiam aqueles olhos me encarando, aquele sorriso discreto nos lábios vermelhos, aquele corpo que parecia esculpido sob medida.
Quando a música terminou, ela se recolheu com a mesma elegância com que entrou. Nenhuma palavra. Apenas virou as costas e saiu, como se nada tivesse acontecido.
Foi nesse momento que perdi o controle.
Levantei de repente, quase derrubando a taça de um dos meus amigos.
- Heitor! Onde você vai? - gritou um deles.
Não respondi. Meu coração batia acelerado, a respiração curta. Virei no corredor a tempo de vê-la entrar em uma das salas da boate. Sem pensar duas vezes, empurrei a porta e entrei.
Ela se assustou, levando a mão aos peitos e segurando a máscara.
Por trás dela, vi algo que não esperava.
Mais linda do que jamais imaginei. A máscara escondia não apenas uma dançarina, mas um rosto angelical, delicado, quase etéreo. Cabelos soltos caindo pelos ombros, expressão inocente em contraste com a sensualidade que tinha acabado de exalar no palco.
Uma deusa. Uma tentação.
E naquele instante, eu soube: não importava quem fosse, eu precisava dela na minha cama. Nem que seja por uma noite.