Tatiana
Bip. Bip. Bip.
Um bip constante. O cheiro nauseante de desinfetante por toda parte.
Sangue. Alvejante. Frieza estéril.
O perfume de Adrian me envolveu, cítrico e de sândalo, mas também tinha um toque de especiarias. Talvez fosse apenas o hospital.
Havia sons de vozes abafadas.
- É melhor você curá-la se quiser viver. - A voz era dura. Fria. Sotaque russo. Não era a voz do meu irmão.
Mas de quem?
- Senhor, faremos o nosso melhor.
- Você fará tudo, - rugiu ele. - Não o seu melhor.
Mais comoção. Os sons de uma luta e gritos. Mais vozes.
Adrian estava aqui? Instantaneamente, imagens de seus olhos mortos inundaram meu cérebro. O sangue escorria pelo canto da boca que eu costumava beijar. O gosto de cobre inundou minha boca.
Pele fria e úmida sob a ponta de meus dedos. O beijo frio da morte.
- Respire. - Um grito. Meu. Talvez? Eu não tinha certeza. Minha boca na de Adrian.
Um. Dois. Três. Ar em seus pulmões. Um. Dois. Três.
Uma explosão. Muito alta. A terra tremeu.
Tudo estava confuso. Meu peito se apertou, um soluço sufocou minha garganta. No entanto, nada saiu.
Mas ouvi os gritos que perfuravam meu cérebro. Ouvi os gritos. Senti o gosto do sangue.
Eu senti a perda.
Não, Adrian não estava aqui. Ele tinha ido embora. Eu sabia disso no fundo da minha alma. No meu coração. E isso doía pra caramba. Parecia que uma bala havia se alojado em meus pulmões e se recusava a sair. Doía até respirar. Uma dor que inchava dentro de mim, até me afogar.
- Eu o encontrarei novamente, - murmurei.
Ou talvez meu cérebro tenha sussurrado as palavras. Eu não tinha certeza. Não conseguia sentir minha boca se mover. Cada centímetro de mim estava dormente.
- Ela está acordada. - A mesma voz grave gritou. Um par de mãos agarrou meus ombros. - Tatiana, olhe para mim. - Eu segui a voz, mas meus olhos não conseguiam se concentrar. Minha cabeça doía. Até meu cérebro doía. - Olhe para mim, moya luna.
Moya luna. Eu já tinha ouvido isso antes. As palavras estavam enterradas na névoa. Por que não consigo fazer meu cérebro funcionar?
Virei a cabeça na direção da voz. Não havia ninguém lá. Pisquei os olhos e depois pisquei novamente. A luz estava muito forte. Eu não conseguia ver ninguém.
- Um sonho ruim, - eu disse enquanto um soluço irrompia de meus lábios. Não consegui ouvi-lo, nem as palavras. Mas eu as senti. Na medula de meus ossos, junto com um medo que sussurrava pesadelos.
Lambi os lábios e senti o gosto de sangue.
Olhos sem nenhuma luz me encaravam. Os olhos do meu marido. Ele se foi, sussurrou o pesadelo. Isso me fez sentir uma dor de arrepiar a alma em cada centímetro de mim. Eu não conseguia lidar com isso. Eu precisava de dormência.
Mais palavras foram gritadas. Eu não conseguia ouvi-las nem as entender. Eu estava muito dentro da minha cabeça, onde o desespero me consumia. Os olhos mortos de Adrian. O sangue cobrindo os lábios que costumavam me beijar.
Os lábios que costumavam dizer palavras gentis para mim. Os mesmos lábios que costumavam colocar os valentões no lugar deles. Os mesmos lábios que me chamavam de 'pirralha' quando eu era uma garotinha.
- Adrian! - gritei, meu coração se despedaçando, um pesadelo me consumindo.
Meu corpo começou a tremer. Meus dentes rangeram. Minha alma se dividiu. O som de vidro quebrando e metal batendo no chão. Mãos sobre mim.
Em seguida, uma picada em minha carne e o mundo deixou de existir novamente.