Cada item parecia uma nova traição. Deixei-os cair, um por um, em um grande saco de lixo preto. O som era abafado, final.
A fechadura estalou. A porta se abriu.
"Oi, meu bem", disse uma voz, uma imitação perfeita do tenor baixo de Adriano. "Cheguei."
Era Danilo. Ele usava o suéter cinza favorito de Adriano, um sorriso suave brincando em seus lábios.
Eu não me virei. "Não me chame assim", eu disse. Minha voz era uma coisa crua e quebrada. "E você não é ele."
O sorriso em seu rosto congelou por um segundo antes que ele se recuperasse, sua expressão mudando para uma de preocupação. "Ana, o que há de errado? Fiquei sabendo do vídeo."
Ele se aproximou, tentando me abraçar. Eu me afastei com um solavanco.
"Eu sinto muito", ele disse, sua voz um bálsamo calmante de mentiras. "A residência... não é o fim do mundo, Ana. Haverá outras oportunidades. Temos nossas vidas inteiras pela frente."
Cada palavra corroía meus nervos em carne viva. Minhas unhas cravavam nas palmas das minhas mãos. A atuação deles era impecável. Um dueto perfeito e nojento.
Naquela noite, ele deslizou para a cama ao meu lado, seu corpo quente e familiar. Era o corpo que eu amara, o corpo em que eu confiara. Agora, parecia apenas uma violação.
Ele passou um braço pela minha cintura, seus lábios pressionando a parte de trás do meu pescoço. Fiquei ali, rígida como um cadáver, rezando para que acabasse logo.
Em algum momento no meio da noite, enquanto eu flutuava em um sono inquieto e superficial, ouvi-o murmurar um nome.
Não era o meu.
"Aline...", ele suspirou, sua voz densa de sono e um desejo que nunca, jamais, foi para mim.
Meus olhos se abriram de repente. O último fio frágil de esperança que eu nem sabia que estava segurando - de que talvez, apenas talvez, os afetos de Danilo tivessem sido reais - se estilhaçou em um milhão de pedaços.
Eu o empurrei para longe, com força.
"O que foi?", ele perguntou, sua voz grogue.
"Não estou me sentindo bem", engasguei, saindo da cama. "Minha menstruação."
Era a desculpa mais antiga do mundo, mas funcionou. Ele suspirou, um som de leve desapontamento, e simplesmente disse: "Ok. Então, só me deixe te abraçar."
Ele me puxou de volta para si, seu braço um peso de chumbo sobre meu estômago. Fiquei ali por horas, encarando a escuridão. A sensação da pele dele contra a minha era uma contaminação. Eu me sentia suja, usada e completa, absolutamente sozinha.
Na manhã seguinte, fui ao escritório da administração do hospital para preencher minha papelada de demissão. Quando eu estava saindo, uma colega correu até mim.
"Ana! Aí está você!", ela disse, sem fôlego. "O Dr. Pires quer te ver. Agora. Ele parecia... furioso."
Meu estômago despencou. Dr. Pires era o chefe do departamento de cirurgia.
Uma sensação fria e pesada de pavor me invadiu. Eu tinha um pressentimento terrível de que sabia do que se tratava.