O pânico, frio e agudo, perfurou a névoa em meu cérebro. Torci meus pulsos, e a textura áspera das tiras de couro mordeu minha pele. Eu estava amarrada a uma cama. Uma cama de hospital.
Por que eu estava amarrada?
A porta se abriu e Alex entrou. Ele parecia exausto, seu rosto tenso e pálido, mas seus olhos continham uma determinação fria e dura que eu nunca tinha visto antes.
"Alex?" Minha voz era um sussurro rouco. "O que está acontecendo? Me solte."
Ele ficou ao pé da cama, apenas me olhando. Havia um lampejo de algo em seus olhos - culpa? arrependimento? - mas foi rapidamente extinto por uma certeza arrepiante.
"A Kaila está completamente destruída, Amélia", ele disse, sua voz plana. "Os médicos dizem que ela tem TEPT grave pelo que você fez com ela. Ela não consegue comer. Não consegue dormir. Ela só chora e grita seu nome."
"Eu não fiz nada!" Tentei me sentar novamente, puxando as amarras. "Ela está mentindo, Alex! Você não consegue ver isso?"
Ele balançou a cabeça lentamente, um olhar de profunda decepção em seu rosto.
"Ainda negando. Mesmo agora. Eu pensei... pensei que você fosse melhor que isso."
Suas palavras foram como um golpe físico. Os últimos vestígios do homem que eu amava, o parceiro, o amigo, evaporaram, deixando para trás este estranho frio e cruel.
"Sinto muito, Amélia", ele disse, e quase soou como se estivesse falando sério. "Mas ações têm consequências. Você a machucou. Gravemente. E agora... agora você precisa entender como é isso."
Ele se virou para um homem de jaleco branco que havia entrado silenciosamente atrás dele. O homem tinha um sorriso cruel nos lábios e olhos pequenos e porcinos. Não era meu médico da clínica.
"Ela é toda sua, Doutor", disse Alex. Ele deslizou um pedaço de papel sobre uma pequena mesa - um formulário de consentimento. Meu sangue gelou quando vi meu nome, meus detalhes e a assinatura dele na parte inferior. *Alexander Martins (Noivo, Parente Próximo).*
Ele tinha o direito. Ainda estávamos legalmente noivos. Ele tinha o direito de tomar decisões médicas por mim.
Ele tinha o direito de me internar.
"Alex, não!" Eu gritei seu nome, o som rasgando minha garganta. "Alex, por favor! Não faça isso!"
Ele não olhou para trás. Apenas saiu do quarto, fechando a porta para minhas súplicas.
O médico com os olhos porcinos sorriu, uma expressão arrepiante e predatória. Ele pegou dois eletrodos de metal conectados por fios a uma máquina no canto.
"O Sr. Martins foi muito generoso", disse o médico, sua voz untuosa. "Ele me pediu para ter... um cuidado especial com você. Para garantir que você tenha uma experiência verdadeiramente... memorável."
Ele estava se aproximando. A máquina zumbia.
"Isso não é terapia de eletrochoque, minha querida", ele disse, seu sorriso se alargando. "Isso é punição."
Ele pressionou os discos de metal frios em minhas têmporas.
O mundo explodiu em uma supernova de agonia branca e quente.
Não era o procedimento controlado e supervisionado medicamente que eu havia consentido. Era eletricidade crua e brutal queimando meu cérebro. Um grito foi arrancado dos meus pulmões, um som de puro terror animal. Meu corpo se arqueou contra as amarras, convulsionando violentamente.
Tentei lutar, pensar, me agarrar a quem eu era. Mas a dor era absoluta. Queimava pensamentos, memória, identidade.
Quem era o culpado? Kaila, por sua inveja patológica? Alex, por sua fraqueza e crueldade? Bia e meus amigos, por sua traição cega? Minha mãe, por me ensinar que o amor era condicional e que eu era indigna?
As perguntas se dissolveram em outra onda lancinante de dor.
Eu estava tão cansada. Tão cansada de lutar, de tentar, de ser a forte.
O rosto do médico pairava sobre mim, uma máscara distorcida de preocupação profissional.
"Pronto, pronto. Tudo vai acabar em breve."
Outro choque. Meu corpo se sacudiu, uma marionete em uma corda. Lágrimas escorriam dos meus olhos, quentes contra minha pele fria.
Apenas deixe acabar, uma pequena voz nos destroços da minha mente sussurrou. Apenas me deixe desaparecer.
Dias se misturaram em uma névoa de dor e confusão. Às vezes eles me davam choques. Às vezes eles apenas me deixavam amarrada na cama, olhando para o teto, minha mente uma bagunça embaralhada e caótica.
Então, um dia, a porta se abriu, e Alex estava lá novamente. Ele parecia exausto, a culpa gravada em cada linha de seu rosto. Ele segurava meu casaco.
"Acabou", ele disse, sua voz mal um sussurro. "Você pode ir."
Ele desfez as amarras. Meus braços caíram frouxamente ao meu lado, meus pulsos em carne viva e machucados. Sentei-me lentamente, meu corpo doendo, minha cabeça um tambor oco.
Ele tentou colocar o casaco em meus ombros, seu toque um fantasma de uma ternura há muito morta.
"Deixe-me te levar para casa, Amélia."
Casa. A palavra não tinha sentido.
Deslizei para fora da cama, minhas pernas trêmulas. Deixei o casaco escorregar dos meus ombros e cair no chão. Quando ele alcançou minha mão, eu me afastei.
"Não", eu disse, minha voz uma coisa seca e arranhada que eu não reconheci. "Nunca. Mais. Me. Toque."
Ele recuou, seu rosto chocado.
"Amélia, eu... eu fiz isso por você. Para te ensinar uma lição. Para que você parasse de machucar a Kaila. Eu vou compensar, eu prometo."
O absurdo de suas palavras era tão imenso que eu não conseguia nem reunir energia para ficar com raiva. Eu estava vazia.
Seu telefone tocou, uma melodia alegre e estridente. Ele atendeu, sua voz mudando instantaneamente para uma de preocupação gentil.
"Kaila? O que há de errado? Você está bem? Não, eu estou... estou apenas terminando aqui. Já estou indo."
Ele desligou e olhou para mim, seu rosto dividido.
"Eu tenho que ir."
Claro que ele tinha.
Ele saiu correndo, deixando-me sozinha no quarto que fora minha prisão.
Eu não fui para "casa". Peguei um táxi direto para a clínica de eletrochoque. Para o Dr. Albuquerque, meu verdadeiro médico. Eu tinha uma sessão restante. Um apagamento final.
A enfermeira gentil, Eva, segurou minha mão enquanto me preparavam.
"Você parece exausta, querida. Tem certeza de que está pronta para isso?"
Eu apenas assenti, uma única lágrima traçando um caminho pela sujeira na minha bochecha.
"Ok, Amélia", disse o Dr. Albuquerque suavemente. "Estamos começando o anestésico. Apenas conte de dez para trás."
Fechei meus olhos.
Dez. Pelos anos da minha vida que eu estava prestes a queimar.
Nove. Pelos amigos que me abandonaram.
Oito. Pela carreira que construí e perdi.
Sete. Pela casa que não era mais minha.
Seis. Pela cicatriz que marcaria para sempre minha testa.
Cinco. Pela irmã que me destruiu.
Quatro. Pelo homem que ordenou minha tortura.
Três. Pelos últimos vestígios de um amor que se transformou em veneno.
Dois. Pelo ato final e abençoado de deixar ir.
Um.
Escuridão.
E então, silêncio.