Depois do jantar, me sentei na cama com o laptop.
A internet em Sierra Creek era lenta, mas bastou digitar "família Blackwood" para encontrar... nada.
Nenhum registro, nenhuma rede social, nada.
Como se ele não existisse.
Uma rajada de vento fez a janela bater.
Olhei para fora - o bosque escuro balançava ao longe, e uma névoa começava a subir, iluminada pela lua.
Então ouvi de novo.
O mesmo uivo.
Baixo, distante, mas impossível de ignorar.
Meu corpo reagiu antes que eu pensasse.
Peguei o casaco e saí, seguindo o som.
Os galhos estalavam sob meus pés enquanto eu me embrenhava na floresta, o coração acelerando a cada passo.
De repente, algo passou rápido à minha frente - uma sombra grande, veloz, que desapareceu entre as árvores.
Tentei dar um passo atrás, mas escorreguei.
E antes que pudesse cair, mãos fortes me seguraram pela cintura.
- Eu disse pra você não vir aqui sozinha - a voz dele soou grave, perto demais do meu ouvido.
Noah.
O calor das mãos dele atravessava o tecido do meu casaco.
Por um instante, fiquei sem ar.
- O que... o que era aquilo? - perguntei, tentando recuperar a voz.
- Um lobo - respondeu, sem hesitar. - Eles aparecem quando a lua está quase cheia. Você devia ter ficado em casa.
Mas havia algo estranho no jeito como ele falava - como se não estivesse apenas me alertando, mas também lutando contra algo dentro dele.
Seus olhos, sob a luz prateada, pareciam brilhar.
- Por que se importa tanto comigo, Noah? - ousei perguntar.
Ele me soltou devagar, recuando um passo, o olhar duro.
- Porque há coisas aqui que você não entende.
- Então me explica.
O silêncio se estendeu.
Só o som da respiração dele - profunda, contida - preenchia o ar.
Quando finalmente falou, sua voz era um sussurro:
- Eu não posso... não ainda.
E, como antes, ele se virou e desapareceu na névoa.
Deixando para trás o eco do seu perfume - madeira, chuva e algo selvagem.
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Noah
Eu a senti antes de vê-la.
O batimento acelerado do coração dela ecoava entre as árvores, puxando o lobo dentro de mim para a superfície.
Ela era imprudente.
Curiosa demais.
E linda demais para o meu próprio bem.
Quando a segurei, o calor do corpo dela atravessou minhas barreiras.
Meu controle vacilou.
Por um instante, o mundo sumiu, e só existia o som da respiração dela - suave, trêmula, perigosa.
Eu devia tê-la deixado ir.
Mas a cada vez que ela me olhava, algo em mim mudava.
O lobo reconhecia algo que eu não queria admitir.
De volta à clareira, o cheiro de sangue me fez parar.
Um coelho morto. Rasgado.
Eles estavam caçando de novo.
Outros da minha espécie.
- Ainda tentando fingir que é humano, primo? - a voz rouca de Dylan soou atrás de mim.
- Não é fingimento - respondi sem olhar. - É sobrevivência.
Ele riu, um som baixo e sombrio.
- A garota está te mudando.
- Fica longe dela - rosnei.
Mas ele só sorriu, mostrando um brilho ameaçador nos olhos.
- Se você não contar a verdade, Noah, a lua cheia vai fazer isso por você.
E quando ela descobrir o que você é... será tarde demais.
Fiquei ali, sozinho, com o gosto metálico da noite na boca.
A fera em mim pulsava, exigindo sair.
E, no fundo, eu sabia que Dylan estava certo.
Eu podia tentar enganar a mim mesmo.
Mas não à lua.
E nem a ela.
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Lívia
Na manhã seguinte, os corredores da escola estavam cheios de murmúrios.
Um animal selvagem havia atacado uma casa próxima ao bosque.
Ninguém sabia o que era.
Mas quando Noah passou, o burburinho parou - como se todos soubessem que ele carregava algo que ninguém entendia.
Ele não olhou pra mim.
Mas eu senti.
O mesmo frio na espinha, o mesmo arrepio na pele.
E uma certeza:
Entre nós, algo já estava acontecendo.
Algo que nem o tempo, nem o medo, e nem a lua seriam capazes de deter.