Ele realmente acreditava que eu era o problema. Que meu "passado", minha natureza "complicada", era a raiz de sua infidelidade e crueldade. Ele me manipulou tão completamente, distorceu a realidade de tal forma, que por um momento aterrorizante, eu quase acreditei nele. Eu era o problema? O pensamento era um sussurro arrepiante no vazio do meu desespero. Mas então a imagem do pé de Bia esmagando o patuá do meu filho, a lembrança das mãos de Christian em volta do meu pescoço, o eco do batimento cardíaco perdido do meu bebê – eles me trouxeram de volta. Não. Ele era o problema. Sua obsessão, sua crueldade, sua covardia.
Os dias seguintes foram um borrão de existência entorpecida. Christian não voltou para casa. Sua ausência, antes uma fonte de dor, era agora uma estranha forma de alívio. O silêncio na cobertura era sufocante, mas era melhor do que suas palavras odiosas.
Comecei a arrumar minhas coisas. Não com raiva, mas com uma finalidade silenciosa e devastadora. Cada item que eu tocava, cada fotografia, cada presente que ele me dera, parecia contaminado. Eu os separei com uma precisão clínica e distante, separando o que era meu do que pertencia ao nosso passado compartilhado, agora estilhaçado. As joias caras, as grandes lembranças sentimentais – tudo foi embalado, destinado a um depósito, ou talvez aos cantos mais profundos do oceano. A foto de casamento emoldurada, antes um símbolo de amor eterno, foi colocada de bruços em uma caixa e depois jogada em uma caçamba de lixo. Parecia uma purificação, um ato desesperado de me reivindicar.
Justo quando eu estava limpando a última prateleira vazia no que costumava ser nosso closet, meu celular vibrou. Christian. Meu estômago revirou.
"Onde você está?", sua voz era impaciente, carregada de um irritante senso de direito. "Se arrume. Vamos sair."
"Eu não vou a lugar nenhum com você", eu disse, minha voz plana, sem emoção. Eu estava farta de suas farsas.
Uma risada fria.
"Não seja tola, Elena. Ou eu vou vazar aqueles vídeos. Não gostaria que sua imagem cuidadosamente construída fosse manchada, gostaria? Especialmente agora que você está prestes a ser uma mulher livre." Sua ênfase em "mulher livre" era uma alfinetada mal disfarçada ao meu divórcio iminente.
Meu sangue gelou. A ameaça novamente. Era sua arma final, e ele a empunhava com uma precisão arrepiante. Meu coração disparou, mas me forcei a respirar. Uma última vez, eu disse a mim mesma. Uma última humilhação. Então, eu estaria verdadeiramente livre.
"Onde?", perguntei, minha voz mal um sussurro.
"No Jockey Club. E não se atrase. A Bia tem algo importante para comemorar."
O Jockey Club. Nosso clube. O lugar onde ele declarou seu amor por mim pela primeira vez, em voz alta, sem vergonha. E agora, eu seria exibida lá como sua esposa descartada, forçada a testemunhar sua nova alegria.
Cheguei, vestida com um simples vestido preto, um contraste gritante com a multidão brilhante. O ar zumbia com risadas, copos tilintando e a conversa bajuladora da elite de São Paulo. Christian estava em uma mesa particular, cercado por sua comitiva habitual, Bia pendurada em seu braço, parecendo radiante e presunçosa.
Ele me viu, e um sorriso cruel tocou seus lábios. Ele gesticulou para que eu me juntasse à mesa. Minhas pernas pareciam de chumbo, mas eu caminhei, de cabeça erguida, recusando-me a lhe dar a satisfação de ver minha dor.
"Elena, querida, você conseguiu", Christian ronronou, seu braço apertando em volta de Bia. "A Bia teve um pequeno susto com a... gravidez hoje. Mas está tudo bem agora. Estamos comemorando."
Os olhos de Bia, grandes e inocentes, encontraram os meus, um lampejo de triunfo escondido lá no fundo. Ela estava grávida. Do filho de Christian. As palavras me atingiram com mais força do que qualquer soco. Meu filho, morto. O filho dela, prosperando. Era uma ironia distorcida e grotesca.
"À Bia", Christian anunciou, erguendo sua taça. Todos seguiram o exemplo. "E aos novos começos."
Ele então deslizou um copo em minha direção. Era um coquetel verde vibrante, guarnecido com uma fatia de limão. Meu estômago revirou. Eu tinha uma alergia severa e fatal a frutas cítricas, especialmente limão. Christian sabia disso. Ele testemunhou meu choque anafilático anos atrás, me levou às pressas para o pronto-socorro.
"Beba, Elena", ele disse, sua voz enganosamente suave. "Um brinde à Bia. E ao seu... futuro."
Minha garganta se apertou. Minhas mãos tremiam. Isso não era um brinde; era uma punição. Uma execução pública da minha dignidade, do meu bem-estar, da minha própria vida. Ele queria que eu sofresse. Ele queria que eu me lembrasse.
"Christian, eu...", comecei, minha voz falhando.
Seus olhos se estreitaram.
"Beba. A menos que queira que meus amigos aqui vejam aqueles vídeos. Pense na sua reputação, Elena. Sua carreira artística. Tudo se vai. Assim." Ele estalou os dedos.
Os rostos ao redor da mesa se turvaram. Eles estavam todos assistindo, pequenos abutres esperando pelo banquete. Ninguém ajudaria. Ninguém desafiaria Christian Bittencourt.
Minha mão, entorpecida e sem resposta, alcançou o copo. O líquido verde vibrante brilhava sob as luzes do clube, um veneno belo e mortal. Levei-o aos lábios, o cheiro doce e cítrico fazendo minha pele arrepiar.
Um gole. Depois outro. O calor se espalhou pela minha garganta, depois um formigamento estranho. Minha pele começou a pinicar, depois a coçar. Minha respiração ficou superficial. Eu podia sentir minhas vias aéreas se contraindo, um terror familiar subindo em meu peito.
Engoli, forçando para baixo, forçando outro gole. Minha visão nadava. Minha cabeça latejava. Christian me observava, um lampejo de algo em seus olhos – era preocupação? Ou apenas curiosidade mórbida?
Meu corpo convulsionou. Deixei o copo cair, o líquido esmeralda espirrando pela mesa polida. Minhas mãos voaram para minha garganta, arranhando o torno invisível que se apertava em volta da minha traqueia. Eu não conseguia respirar. Meus pulmões queimavam.
Ouvi gritos abafados, a voz de Christian, a preocupação fingida de Bia. Mas tudo estava distante, desaparecendo. Meus joelhos cederam. Caí no chão, minha visão se afunilando para o preto. A última coisa que vi foi o rosto de Christian, embaçando acima de mim, uma expressão fugaz de... algo.
"Posso... ir agora?", grasnei, minha voz mal um sussurro, enquanto a escuridão começava a me consumir.
"Claro, querida", a voz de Christian, chocantemente clara, cortou os sons que se desvaneciam. "Vá para casa. Descanse um pouco. Te vejo mais tarde. Bia e eu temos muito o que conversar."
"Você... você quase a matou", ouvi um sussurro frenético de um de seus amigos.
"Ela vai ficar bem", o tom desdenhoso de Christian. "Apenas uma pequena lição."
O mundo girou. Meu corpo convulsionou. Tropecei em direção ao banheiro, uma necessidade desesperada e animalesca de expelir o veneno. Mal cheguei a uma cabine antes de desabar, vomitando violentamente. Não era apenas a bebida. Era a bile de sua traição, o ácido de suas mentiras.
E então, eu vi. Em meio ao líquido esverdeado, um respingo de vermelho. Sangue. O meu próprio.
O último pensamento antes que a escuridão me tomasse por completo: Ele realmente me quer morta.