Ele agarrou o braço de Cristal, puxando-a bruscamente em direção à porta. Ela tropeçou, lançando um olhar venenoso para mim. Ao chegar à soleira, Heitor se virou uma última vez, seus olhos queimando nos meus. "Não pense que vai conseguir um tostão de mim. Todas as contas estão congeladas. Todos os ativos bloqueados. Você vai ficar na rua, como merece."
Então eles se foram. A porta bateu, deixando um silêncio ecoante no quarto.
Deitei-me, a adrenalina recuando lentamente, deixando-me completamente exausta. Contas congeladas. Na rua. Por um momento, uma onda de medo me invadiu. Eu tinha sido tão confiante, tão ingênua. Acreditei em seu amor, em nosso futuro compartilhado, pensando tolamente que minha felicidade estava entrelaçada com a dele. Eu lhe dei meu coração, minha vida e, sem saber, as chaves da influência oculta da minha família. E ele usou tudo para construir seu império, e depois me descartar.
Mas o medo rapidamente se transformou em uma resolução fria e dura. Ele queria jogar sujo? Tudo bem. Ele não tinha ideia contra quem estava jogando.
O hospital me deu alta naquela tarde. Peguei um táxi, dando ao motorista o endereço da minha casa. O endereço da minha casa conjugal. O lugar que eu enchi de calor, de memórias, com os restos de um sonho despedaçado.
O portão da frente, geralmente deixado entreaberto para mim, estava fechado, trancado. Tentei meu cartão de acesso. Inativo. Toquei o interfone. Nenhuma resposta. Meu coração afundou, um calafrio familiar percorrendo meu peito. Ele não apenas congelou minhas contas; ele me trancou para fora da minha própria casa.
Quando eu estava prestes a me virar, a porta da frente rangeu ao abrir. Cristal estava lá, emoldurada na porta, vestindo meu roupão de seda - aquele azul claro que Heitor me comprou no nosso primeiro aniversário. Seu cabelo estava desgrenhado, um sorriso presunçoso e triunfante estampado em seu rosto. E em seu dedo anelar esquerdo, um diamante brilhava, grande demais, ostensivo demais. Meu anel de noivado. Aquele que Heitor me deu.
"Procurando por algo?" ela ronronou, encostando-se no batente da porta, exibindo o anel com destaque. "Oh, Ayla querida, você não pode esperar simplesmente entrar aqui. Esta é a minha casa agora. Heitor disse que você é oficialmente persona non grata. E além disso," ela gesticulou para o jardim impecavelmente paisagístico, "você não gostaria de morar em um lugar tão apertado e modesto, não é? Não para uma mulher de sua... independência radical."
Meu sangue ferveu. A audácia. A pura e descarada petulância.
"Saia do meu caminho, Cristal", eu disse, minha voz baixa, perigosa.
Ela riu, um som frágil e zombeteiro. "Ou o quê? Vai me dar outro tapa? Heitor não será tão compreensivo desta vez. Ele é muito protetor com sua propriedade, sabe." Ela piscou, me provocando abertamente.
Foi o fim. Meu último resquício de paciência se esgotou. Eu avancei, passando por ela, ignorando seu grito de surpresa. Eu estava dentro. A casa. Minha casa.
Mas não era mais minha.
A sala de estar, antes cheia de minhas obras de arte cuidadosamente escolhidas e fotografias de família, estava nua. A mesa lateral antiga, uma herança querida da minha avó, havia sumido. Minha manta de caxemira favorita, aquela em que eu sempre me aninhava em noites frias, foi substituída por um cobertor de pele sintética berrante. A parede onde nossas fotos de casamento estavam penduradas agora estava vazia, um retângulo fraco de tinta mais clara a única evidência de sua existência.
"Procurando suas bugigangas?" A voz de Cristal deslizou atrás de mim. "Ah, aquelas? Heitor mandou jogar fora. Disse que estavam bagunçando o lugar. Precisávamos de um novo começo, sabe. Nova energia."
Meus olhos se fixaram em uma pequena e ornamentada caixa de madeira na lareira - a caixa de joias da minha mãe, aquela que ela herdou de sua mãe. Era preciosa, cheia de peças sentimentais, não valiosas, mas insubstituíveis. Cristal a deixou. Por uma fração de segundo, uma pequena faísca de esperança brilhou. Talvez nem tudo estivesse perdido.
Corri em direção a ela, meu coração batendo forte. Mas Cristal foi mais rápida. Com um sorriso cruel, ela agarrou a caixa e a atirou no chão. Ela se estilhaçou em cem pedaços, espalhando rendas antigas, fotografias desbotadas e delicadas correntes emaranhadas pelo chão polido.
"Ops", disse ela, seu sorriso se alargando, seus olhos brilhando de malícia. "Desajeitada, não sou? Assim como você, Ayla. Sempre quebrando as coisas." Então, com um pisão deliberado, ela esmagou um minúsculo pássaro de porcelana pintado à mão, um presente do meu pai para minha mãe em seu primeiro aniversário.
Um grito gutural rasgou minha garganta. Não era apenas o pássaro. Era minha mãe. Era meu pai. Era cada memória, cada momento querido, sendo pisoteado por essa mulher vil.
"Pare!" gritei, avançando sobre ela, desesperada para salvar os últimos vestígios da minha família.
Nesse momento, a porta da frente se abriu novamente. Heitor estava lá, seus olhos caindo instantaneamente na caixa quebrada, em Cristal, que havia desabado no chão em outra pilha dramática, e em mim, minhas mãos estendidas em uma tentativa fútil de proteger o legado quebrado da minha mãe.
"Em nome de Deus, o que está acontecendo?" ele rugiu, não para Cristal, mas para mim. Ele me empurrou bruscamente para o lado, seu braço forte me pressionando contra a parede. "Cristal, querida, você está machucada? Ayla, saia! Saia da minha casa! Você é uma ameaça!"
Cristal olhou para ele, seus olhos arregalados e lacrimejantes, um sorriso triunfante brilhando em seu rosto enquanto ela encontrava meu olhar por cima do ombro de Heitor. Ela conseguiu. Ela orquestrou isso perfeitamente.
Olhei para os pedaços quebrados no chão, para o homem frio e insensível que um dia fora meu marido, para a mulher venenosa que ele embalava em seus braços. Os últimos fragmentos do meu coração se transformaram em pó. Não havia mais nada para mim aqui. Nenhum amor, nenhuma casa, nenhuma esperança. Apenas destroços.
Silenciosamente, ajoelhei-me, ignorando os gritos furiosos de Heitor. Comecei a pegar os pedaços quebrados, os cacos de vidro, as fotografias espalhadas, o pássaro de porcelana esmagado. Cada peça parecia uma facada na minha alma, mas eu as juntei com cuidado, meticulosamente. Eram tudo o que me restava do meu passado, da minha família.
"Saia!" Heitor gritou novamente, sua voz ecoando na casca oca do que um dia foi nosso lar.
Eu não respondi. Apenas continuei coletando os fragmentos, minha resolução endurecendo a cada caco quebrado. Este não era o fim. Este era o começo. Ele havia destruído meu passado, mas não controlaria meu futuro. Ao sair daquela casa, com os restos quebrados cuidadosamente agarrados em minhas mãos, peguei meu telefone e disquei um número que não usava há anos.
"Preciso de um detetive particular", eu disse, minha voz firme, fria. "Preciso de tudo o que você puder encontrar sobre Heitor Bastos e Cristal Barros. Cada segredo. Cada mentira. Eu quero tudo."