A Verdade Oculta Numa Pasta
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Capítulo 3

PONTO DE VISTA DE BRUNA:

Minhas bochechas pareciam em carne viva, ardendo como se alguém tivesse me esbofeteado repetidamente. Meu mundo cuidadosamente construído, erguido sobre alicerces de confiança e lealdade, estava se desfazendo em pó.

Guilherme estava ocupado na cozinha, cantarolando baixinho enquanto limpava os pratos do jantar. Ele se movia pelo nosso pequeno apartamento, arrumando as coisas, garantindo que tudo estivesse em seu lugar. Ele sempre fazia isso, um ritual silencioso após nossas refeições, um testemunho de sua natureza aparentemente atenciosa.

"Guilherme", chamei, minha voz ainda rouca de tanto chorar. "Me conta de novo sobre seu primeiro amor."

Ele parou, um prato na mão, e se virou para me olhar. Uma leve carranca franziu sua testa, mas rapidamente se suavizou em um sorriso gentil. "Por que, amor? Está se sentindo nostálgica?"

Eu me lembrava de sua história. Ele me contou como sua primeira namorada o traiu, como a traição o deixou quebrado. Ele jurou então que nunca faria ninguém que amasse passar por aquela dor. "Eu aprendi minha lição, Bruna", ele disse, com os olhos sérios. "Eu nunca, jamais, te trairia assim." Eu acreditei nele, total e completamente. Eu me agarrei àquela promessa como a uma tábua de salvação.

Ele terminou de lavar a louça, limpou as bancadas e depois veio se sentar ao meu lado no sofá. Ele se inclinou, sua mão alcançando meu rosto, pronto para me beijar.

Mas a imagem de Carla, exigindo sua lealdade, brilhou em minha mente. "Promete que nunca vai amá-la de verdade. Promete que sempre vai voltar pra mim. Que eu sou a única." O apelo desesperado dela, a afirmação inabalável dele. Era um loop, tocando sem parar na minha cabeça.

Seu hálito, quente e com cheiro de menta do jantar, estava a centímetros do meu rosto. Meu estômago se contraiu. Uma onda de náusea me atingiu, violenta e inesperada. Eu saltei do sofá, passando por ele, e corri para o banheiro, mal conseguindo chegar ao vaso sanitário antes de começar a vomitar.

Eu vomitei, meu corpo convulsionando, até que apenas um ácido amargo subiu. Lágrimas, involuntárias e quentes, ardiam em meus olhos, misturando-se com o suor na minha testa. Meu corpo inteiro parecia fraco e violado.

Guilherme estava imediatamente ao meu lado, sua mão nas minhas costas. "Bruna? Você está bem? O que há de errado? Devo chamar um médico? Você está tão pálida." Sua voz estava cheia de preocupação.

Ele me levantou, seu braço em volta da minha cintura, sua outra mão pegando um casaco. "Vamos, vou te levar para o hospital. Você está tremendo." Ele começou a me guiar em direção à porta, pronto para me pegar no colo.

Nesse exato momento, meu telefone tocou.

A tela piscou: Carla Reis.

No passado, eu teria imediatamente entregado o telefone a Guilherme. "É a Carla, querido. Sua maior fã." Eu teria rido, um som genuinamente feliz. Eu sempre quis que eles se dessem bem, mesmo com sua falsa implicância.

Mas agora, eu apenas fiquei ali, observando-o. Estudando seu rosto. A preocupação em seus olhos havia desaparecido, substituída por um brilho de outra coisa. Algo ansioso. Algo quase em pânico.

Ele me deitou gentilmente na cama. Pegou o celular, seus olhos indo de mim para a tela e de volta. Ele parecia dividido, uma atuação que eu poderia ter acreditado uma vez.

"É a Carla", disse ele, com a voz hesitante. "Eu realmente preciso atender. Você sabe como ela é. Ela vai criar caso se eu não atender, e depois vai tentar te envolver nisso." Ele sempre foi tão bom em fazer parecer que estava me protegendo dela, de sua suposta irracionalidade.

Ele não esperou por minha resposta. Saiu do quarto, fechando a porta suavemente atrás de si.

O clique daquela porta se fechando selou meu entendimento. Ele não estava me protegendo. Estava protegendo eles. Ele era tão descarado, tão absolutamente confiante na minha ignorância. E eu era tão estúpida. Tão, tão estúpida.

Através da porta fina, eu ouvi. A voz de Carla, um gemido se transformando em um choro convulsivo. E então, o murmúrio calmante de Guilherme, sua voz baixa e reconfortante. "Shh, meu bem. Está tudo bem. Me diga o que aconteceu." Mais soluços. "Estou indo. Estou a caminho."

Alguns minutos depois, ele voltou ao quarto, um sorriso forçado no rosto. "Nossa, essa mulher é um desastre ambulante", ele resmungou, mas seus olhos, notei, tinham um brilho distinto. Um toque de excitação. Não de aborrecimento. "Diz que sofreu uma batidinha de carro. Dá pra acreditar?"

Ele balançou a cabeça, fingindo exasperação. "Sinceramente, Bruna, você escolhe as piores pessoas para serem suas amigas. Ela é um ímã de problemas. Mas eu tenho que ir. Ela está completamente fora de si." Ele pegou as chaves. "Eu volto assim que puder, ok? Descanse. Não se preocupe com nada."

Ele ainda teve a audácia de me chamar de "meu bem", de me dizer para não me preocupar. Meu marido, que acabara de prometer à sua amante que estava "a caminho". Minha melhor amiga, que estava fingindo uma batida de carro para roubar meu marido. Minha vida era uma piada.

            
            

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