POV Ellie:
Observei a mão do Caio, ainda estendida, segurando a caixa da Vivara. Seu rosto era uma máscara de remorso calculado, seus olhos lacrimejantes. Naquele momento, uma parte de mim, a antiga e ingênua eu, quase acreditou nele. Quase esperou que talvez, apenas talvez, ele se arrependesse genuinamente de tudo. Eu costumava cair nessa toda vez. As palavras suaves, os apelos desesperados, os pequenos gestos que imitavam sinceridade. Eu costumava pensar: É isso. Este é o momento em que ele finalmente me vê.
Mas então, um toque agudo e quase imperceptível cortou o silêncio tenso. Era o celular da Bruna, vibrando insistentemente em seu bolso. Ela olhou para ele, um lampejo de aborrecimento cruzando seu rosto antes de pegá-lo suavemente.
"Ah, é só a Sara", disse ela, a voz um pouco casual demais. Seus olhos encontraram os do Caio, uma comunicação silenciosa passando entre eles, um olhar apressado e cúmplice. "Ela tá perguntando se a gente ainda vai na festa pós-esqui. Sabe, já que alguém acabou de voltar de uma viagem incrível."
Ela enfatizou "viagem incrível", seu olhar dardejando para mim, uma provocação cruel. Caio estremeceu, mas não protestou.
"Sabe de uma coisa?", Bruna continuou, guardando o celular no bolso, sua voz subitamente mais firme, menos preocupada. "Caio, amor, talvez a gente devesse ir. A Ellie obviamente não aprecia nada que você faz. Olha pra ela. Fria como gelo." Ela se virou para mim, um sorriso venenoso nos lábios. "Algumas pessoas simplesmente não conseguem ser felizes, não é, Ellie?"
Ela agarrou o braço do Caio, seu aperto surpreendentemente forte. "Vamos, vamos embora. Ela não te merece. Você merece alguém que aprecie uma pulseira da Vivara e um pedido de casamento. Alguém que não seja um porre total."
Caio hesitou, seus olhos demorando em meu rosto. Um momento fugaz de confusão genuína, talvez até arrependimento, cintilou em seu olhar. Ele deu um pequeno passo em minha direção, seus lábios se separando como se para falar.
Meu coração deu um pequeno e quase imperceptível solavanco. Não, pensei. De novo não.
Bruna puxou seu braço com mais força. "Para de ser tão frouxo, Caio! Você vai deixar ela pisar em você de novo? Ou vai finalmente criar coragem e perceber o que está deixando para trás?" Sua voz estava carregada de um desafio, uma provocação que apenas alimentava seu ego.
Seus olhos encontraram os meus uma última vez, um brilho patético de indecisão, então ele endureceu. A escolha foi feita. De novo.
"Tá bom!", ele rosnou, puxando o braço do aperto da Bruna, mas não para ficar. Foi um gesto de desafio, direcionado a mim. "Se é isso que você quer, Ellie, então tá bom! A gente terminou!"
Ele passou por mim furioso, Bruna seguindo triunfante atrás dele. A porta do apartamento bateu com um baque doentio, sacudindo os quadros na parede. O som vibrou pelo assoalho, pelos meus próprios ossos.
Eu estava sozinha. De novo.
O silêncio que se seguiu foi ensurdecedor. Fiquei no meio da sala, o cheiro persistente do perfume da Bruna e da colônia do Caio pesado no ar. No balcão da cozinha, o jantar elaborado que eu havia planejado ainda estava lá, meio preparado. Seu frango assado favorito, a salada de macarrão intrincada, o tiramisu caseiro para a sobremesa. Tudo isso, um monumento a um amor que agora estava irrevogavelmente morto.
Uma risada amarga e histérica escapou dos meus lábios. Eu tinha cozinhado, afinal. Ele esperava que eu cozinhasse, e de uma forma distorcida, eu tinha.
Sentei-me à mesa de jantar, o único prato já posto para dois, e comecei a comer. Comi devagar, mecanicamente, cada mordida uma luta. Os sabores ricos se transformaram em cinzas na minha boca. Meu celular vibrou no meu bolso. Era a Bruna.
Seu story no Instagram. Um boomerang dela e do Caio brindando com taças de champanhe no teleférico. "Um brinde aos novos começos!", dizia a legenda, seguida por um emoji piscando.
Eu rolei. Outro. Caio, agasalhado em seu equipamento de esqui, rindo enquanto Bruna limpava neve de seu rosto de forma brincalhona. "Algumas pessoas simplesmente tornam tudo melhor", a legenda cantava.
Cada post era um golpe calculado, desferido com precisão e malícia. Eles estavam aproveitando meu fim de semana, o fim de semana pelo qual eu lhe dei um ultimato. O fim de semana que ele escolheu em vez de mim.
Continuei comendo, forçando cada último bocado, um ato perverso de autopunição. A comida parecia pesada no meu estômago, um caroço frio e indigesto.
Finalmente, quando o prato estava limpo, uma onda de náusea me invadiu. Meu estômago revirou violentamente. Tropecei até o banheiro, desabando sobre o vaso sanitário, esvaziando o conteúdo do meu estômago, lágrimas escorrendo pelo meu rosto. Não era apenas a comida que eu estava expurgando. Era a dor, a traição, a humilhação.
Os dias seguintes foram um borrão de intensos ataques de ansiedade. Meu peito parecia apertado, minha respiração superficial. Cada pensamento era uma tempestade caótica, cada memória uma ferida fresca. Eu não conseguia comer, não conseguia dormir. O mundo fora do meu apartamento se desvaneceu em um pesadelo distante e nebuloso.
Na terceira noite, a dor no meu estômago se tornou insuportável. Uma dor aguda e lancinante que me dobrava ao meio. Consegui ligar para uma amiga, a Emily, minha voz um sussurro fino.
"Ellie? O que foi? Você parece péssima!", ela gritou.
Eu mal conseguia falar, agarrando meu abdômen, lágrimas quentes embaçando minha visão. Emily, abençoada seja, estava lá em vinte minutos. Ela me encontrou enrolada no chão do banheiro, tremendo, meu rosto pálido.
Ela me levou às pressas para o pronto-socorro. As luzes fluorescentes da sala de emergência zumbiam, uma trilha sonora cruel para minha miséria. Eles me ligaram a um soro, o líquido frio se infiltrando em minhas veias. A médica, uma mulher de rosto gentil, falou suavemente sobre gastrite induzida por estresse, beirando uma úlcera estomacal.
"Você esteve sob muita tensão emocional, não é?", ela perguntou, seus olhos gentis.
Eu apenas assenti, incapaz de formar palavras.
Mesmo ligada a um soro, com uma dor latejante nas entranhas, eu não consegui me conter. Meu polegar encontrou o aplicativo do Instagram.
Os stories da Bruna continuavam, um ataque implacável ao meu espírito já fraturado. Uma foto dela e do Caio, silhuetas contra um nascer do sol deslumbrante, empoleirados no pico de uma montanha. "Algumas pessoas simplesmente tornam tudo melhor", a legenda dizia novamente, um eco direto de seu post anterior, uma celebração zombeteira de sua nova conexão.
Então, uma nova foto. Caio, sorrindo, o braço em volta do ombro da Bruna, um brilho travesso no olho. Eles pareciam felizes. Despreocupados. Como se eu nunca tivesse existido. Os comentários choviam: "OMG, vocês são tão fofos!", "Finalmente, o universo se alinhando!", "A Ellie nunca o entendeu, você entende!"
Caio tinha até curtido alguns deles. Ele tinha visto o post dela, ele tinha visto os comentários, ele tinha curtido. Enquanto eu estava no pronto-socorro, lutando contra uma doença induzida pelo estresse causada por suas ações, ele estava validando as provocações públicas da Bruna.
Não era apenas negligência. Era uma crueldade consciente e deliberada. Ele estava permitindo que ela torcesse a faca, que me humilhasse publicamente, e ele estava endossando isso.
O gotejamento do soro, o cheiro de antisséptico, a dor surda no meu estômago – nada disso importava mais. Naquele quarto estéril e impessoal, uma clareza profunda me invadiu. Não era apenas sobre a viagem de esqui. Era sobre tudo. Seu descaso casual, sua manipulação emocional, sua covardia mascarada de liberdade.
Ele não apenas escolheu a viagem em vez de mim. Ele escolheu deixar a Bruna me destruir. E eu tinha permitido.
Aquele foi o momento. O ponto de ruptura absoluto e inegável. A dor no meu estômago não era nada comparada ao vazio completo que se instalou em meu coração. Ele não apenas partiu meu coração. Ele estilhaçou toda a minha visão de mundo. E eu estava farta de deixá-lo fazer isso.