Heitor, é claro, permanecia alheio atrás de sua porta fechada. Ou talvez, ele simplesmente não se importasse. A porta, grossa e à prova de som, era uma barreira, não apenas para o barulho de fora, mas para a realidade de seu favoritismo descarado, seu desprezo por aqueles que pacientemente seguiam suas regras. Era uma barreira que me mantinha do lado de fora.
Fiquei sentada ali, minha mente uma bagunça turbulenta. Eu, sua esposa por quase uma década, fui obrigada a esperar indefinidamente, enquanto sua estagiária, Kaila, entrava sem hora marcada. O mundo dele girava em torno dela, não de mim. Eu era apenas uma relíquia descartada, uma parte esquecida de seu passado. As regras se aplicavam a todos os outros. Não a ela. E certamente não a mim, não mais.
Os minutos se arrastaram pelo que pareceram horas. O zumbido silencioso do ar condicionado, o farfalhar de jornais, as conversas abafadas – tudo isso me irritava. As reclamações dos outros clientes ficaram mais altas, mais insistentes. Mas a porta permaneceu teimosamente fechada.
Finalmente, depois do que pareceu uma eternidade, a porta se abriu com um rangido. Kaila emergiu, o rosto corado, um sorriso triunfante nos lábios. Seus olhos encontraram os meus do outro lado da sala e, por um segundo fugaz, seu sorriso se alargou, uma pitada de algo presunçoso, vitorioso, em suas profundezas. Ela sabia exatamente o que estava fazendo. Ela sabia que eu estava esperando.
Então Heitor apareceu na porta, seus olhos percorrendo a sala de espera. Eles pousaram em mim e, por uma fração de segundo, vi um lampejo de surpresa, talvez até um toque de desconforto. Mas desapareceu rapidamente, substituído por sua habitual postura fria e profissional.
"Próximo," ele chamou, sua voz desprovida de qualquer calor ou reconhecimento. Ele olhou além de mim, além dos outros clientes que esperavam, como se eu fosse apenas mais um nome em uma lista.
Ele não me reconheceu. Ele não perguntou por que eu estava lá. Ele apenas se virou, e a porta pesada se fechou atrás dele mais uma vez, me selando do lado de fora. De novo.
Fiquei sentada ali, entorpecida, até que a recepcionista começou a apagar as luzes, anunciando o horário de fechamento. Os outros clientes, derrotados, pegaram suas coisas e saíram. Eu fui a última.
Levantei-me, minhas pernas rígidas, e caminhei em direção ao elevador. Bem quando as portas estavam prestes a se fechar, eu os vi. Heitor e Kaila, caminhando lado a lado, seus ombros quase se tocando. Kaila estava rindo, um som leve e arejado, e Heitor sorria para ela, um sorriso genuíno e desprotegido que revirou meu estômago.
"Heitor," eu chamei, minha voz crua, desesperada.
Ele parou, seu sorriso desaparecendo. Kaila enrijeceu ao lado dele, sua mão sutilmente escorregando de seu braço. Ele se virou, uma carranca impaciente no rosto.
"Cora? O que você ainda está fazendo aqui?" ele perguntou, seu tom carregado de aborrecimento. "Você mudou de ideia sobre os papéis? Já está se arrependendo?" Ele sorriu com desdém, aquele brilho familiar e arrogante em seus olhos. "Tentando voltar rastejando, é?"
Minha mão disparou, agarrando seu antebraço. Meus dedos se fecharam em seu bíceps, segurando-o como se minha vida dependesse disso. "Não, Heitor, não estou aqui por isso," eu disse, minha voz tremendo. "É a Aline. Minha irmã. Ela... ela foi agredida. Pelo chefe dela, Kevin Bauer. Ele é poderoso, bem relacionado. Ela precisa de ajuda legal. Ela precisa da sua ajuda."
Minha voz falhou. "Ele usou a posição dele, Heitor. Ele a destruiu. Ela está quebrada. Por favor. Você é o melhor. Você tem que pegar o caso dela. Por favor."