POV de Ada Magalhães:
O nome pairou no ar úmido de Bali, uma verdade frágil finalmente vocalizada. "Juliano", repeti, meu olhar inabalável, encontrando os olhos crus e estilhaçados de Caio. "Eu fiz tudo por Juliano."
Caio me encarou, seu rosto perdendo a cor, a descrença lutando com uma compreensão crescente e terrível. "Juliano?", ele murmurou, o nome um som estranho em seus lábios. "Você... você se casou comigo por Juliano?"
Sua voz estava rouca, um sussurro estrangulado. "Você suportou cinco anos de... isso... pelo meu irmão morto?" Ele gesticulou vagamente entre nós, depois para o mercado caótico. Sua mente, tão brilhante em decifrar algoritmos complexos e tendências de mercado, parecia incapaz de compreender essa verdade simples e devastadora.
"Para realizar o último desejo dele", esclareci suavemente, as palavras um bálsamo para minha alma sofrida. "Para espalhar suas cinzas em Marte."
Sua cabeça estalou para trás como se tivesse sido atingido. "Marte? Era disso que se tratava? Um memorial espacial? Você se casou comigo por causa de algum protocolo bizarro da AEB para ele?"
Seu peito arfava, uma tempestade se formando em seus olhos. "Você bancou a esposa devota, a tola apaixonada, você tolerou a Gisela, você foi buscar as pílulas dela - tudo por Juliano? Você me usou, Ada? Você realmente me usou?"
A acusação, embora verdadeira, soou vazia. Ele também me usou. Fomos duas entidades transacionais, cada uma satisfazendo uma necessidade da outra, sem saber das moedas vastamente diferentes que trocávamos.
"Nós dois conseguimos o que queríamos, Caio", respondi, minha voz firme. "Você conseguiu uma esposa submissa que não interferia no seu estilo de vida. Eu consegui acesso ao sonho de Juliano."
Gisela, que estava ouvindo com uma mistura de confusão e alarme crescente, finalmente interveio, sua voz estridente. "Caio? Do que ela está falando? Quem é Juliano? O que está acontecendo?" Ela alcançou o braço dele, seus olhos dardejando entre nós. "Você parece... doente."
Caio não respondeu a Gisela. Seus olhos ainda estavam fixos em mim, um turbilhão de emoções girando dentro deles: raiva, traição e uma dor crua e agonizante que parecia rasgá-lo.
Então, com um movimento súbito e violento, ele empurrou a mão de Gisela. "Fique longe de mim, Gisela", ele rosnou, sua voz um ronco baixo e perigoso. "Apenas... vá embora."
Gisela recuou, seu rosto contorcido de choque. "O quê? Caio! O que você está dizendo? Você acabou de prometer se casar comigo! Estamos noivos!"
"Não", ele disse, seus olhos ainda em mim, ainda queimando. "Não estamos. Acabou, Gisela. Vá."
"Acabou?", Gisela gritou, sua voz ecoando pelo mercado. "Você não pode fazer isso! Não depois de tudo! Não depois de cinco anos sendo sua namorada pública! Você vai se arrepender disso, Caio! Eu vou te arruinar!"
Ele finalmente desviou o olhar de mim, virando-se para Gisela, mas seus olhos estavam frios, desprovidos de qualquer calor ou preocupação. "Faça o que quiser, Gisela", ele disse, sua voz plana, sem emoção. "Diga o que quiser. Eu não me importo mais."
Ele enfiou a mão no bolso, tirou a carteira e extraiu um maço grosso de dinheiro. Ele o jogou aos pés dela. "Aqui. Pelos seus problemas. Agora vá."
Gisela olhou para o dinheiro, depois para ele, seu rosto uma máscara de descrença. "Você está... você está terminando comigo? Por ela?" Ela apontou um dedo trêmulo para mim. "Depois que ela acabou de admitir que te usou?"
Caio a ignorou completamente. Ele deu um passo hesitante em minha direção, seus olhos agora cheios de um apelo desesperado. "Ada", ele sussurrou, sua voz rouca de dor. "Eu... eu cometi um erro. Um erro terrível."
Ele alcançou minha mão, seus dedos tremendo ao roçarem os meus. "Eu entendo agora. Eu entendo por que você fez isso. Mas por favor, Ada. Não vá embora. Não me deixe agora. Podemos consertar isso. Podemos começar de novo. Um casamento de verdade. Eu juro, serei diferente. Serei o marido que você merece. Eu serei... Juliano para você, se é isso que você precisa."
Suas palavras, destinadas a ser uma confissão sincera, foram um insulto perverso. Ser Juliano para mim? Juliano se foi. Ele nunca poderia ser Juliano. E eu não queria que ele fosse. Eu queria que ele não fosse nada.
Puxei minha mão, meu olhar firme. "Não, Caio. Não há nada para consertar. E eu não quero que você seja Juliano. Juliano está morto."
Seus olhos se arregalaram, seu rosto se contorcendo de dor. "Ada, por favor! Não faça isso! Eu te amo! Eu sei agora! Eu te amo!" Ele tentou agarrar meu braço, mas eu o desviei.
Minha mão estalou, um tapa forte e agudo ecoando pelo mercado. Minha palma ardeu. Sua cabeça virou para o lado, uma marca carmesim florescendo em sua bochecha.
Ele ficou congelado, seus olhos arregalados de choque, sua mão subindo lentamente para tocar a marca vermelha em seu rosto. Ele parecia totalmente perplexo, como se não pudesse compreender o que acabara de acontecer.
Gisela, que havia ficado momentaneamente atordoada, de repente gritou. "Sua vadia! Como ousa bater nele!" Ela se lançou sobre Caio, arranhando seu peito, suas unhas rasgando sua camisa cara. "Você o mudou! Você o deixou assim!"
Caio mal se mexeu, seus olhos nunca deixando os meus. Ele agarrou os pulsos de Gisela, sua voz um apelo baixo e urgente. "Ada, por favor! Não vá! Eu preciso de você! Eu te amo mais do que tudo!" Ele olhou para mim, um apelo desesperado e cru em seus olhos, mesmo enquanto Gisela continuava a lutar contra seu aperto.
"Gisela, pare", ele disse, sua voz tensa. "Não é culpa dela. É minha. Toda minha." Ele empurrou Gisela para longe, não bruscamente, mas com uma finalidade que não admitia discussão. "Eu nunca te amei, Gisela. Eu te usei. Assim como deixei Ada me usar. Era tudo um jogo para mim. Mas não é mais um jogo."
Ele enfiou a mão na carteira novamente, tirando um cartão de crédito. "Pegue isso, Gisela. Vá para onde quiser. Compre o que quiser. É seu. Apenas nos deixe em paz."
Gisela olhou para o cartão, depois para o rosto atormentado de Caio. Sua fúria se dissolveu lentamente em uma mistura de descrença e uma compreensão arrepiante. Ela pegou o cartão, seus olhos ainda estreitos, mas sua voz estava surpreendentemente calma. "Você vai se arrepender disso, Caio", ela jurou, suas palavras uma profecia arrepiante. Então ela se virou e foi embora, seus saltos clicando rapidamente, sua cabeça erguida.
Caio a observou ir, depois se virou para mim, seus olhos suplicantes, desesperados. "Viu, Ada? Ela se foi. Somos só nós agora. Eu farei qualquer coisa. Qualquer coisa que você quiser. Apenas me diga o que fazer. Eu vou mudar. Eu prometo."
Olhei para ele, para o desespero em seus olhos, a marca machucada em sua bochecha. Ele estava vulnerável, quebrado. E, no entanto, eu não senti nada. Nenhuma pena, nenhum desejo de confortá-lo. Ele era um estranho.
"Eu não te amo, Caio", eu disse, minha voz plana, desprovida de emoção. "Eu nunca amei. E nunca amarei. Acabou para nós. Não existe 'nós'. Nunca existiu."