Evelyne olhou para a mesa abastada, depois para Cian, que estava em silêncio, observando o confronto sem intervir. O custo de desafiar a matriarca poderia trazer problemas maiores. "Cachorro velho que ladra... não sabe que eu mordo força", pensou, sentindo o sangue ferver. Com um controle férreo, ela suprimiu a raiva diante da humilhação.
- Vá buscar o chá, querida!
- Sim, Sra. Verran. - Ela se virou e caminhou em direção à saída.
Quando voltou, os seus movimentos foram precisos e elegantes enquanto servia o chá nas xícaras finas. Evelyne entregou as xícaras primeiro a Eleonora, depois à Dona Amélia, que a olhava com curiosidade divertida.
- Agradeço, querida - Eleonora tomou um gole, vitoriosa.
Cian deixou o tablet sobre a mesa quando a babá sentou e continuou cuidando de Maya como se aquilo não a afetasse. "Engole o orgulho agora, Evelyne. Esse teatro vai valer a pena", ela dizia a si mesma enquanto mantinha a face neutra.
- Evelyne, leve a minha filha para terminar de tomar o café na mesa perto do jardim - o senhor Verran decidiu quebrar o silêncio antes que Eleonora voltasse a implicar com ela.
- Sim, senhor! - Submissa, a babá pegou a criança.
Evelyne estava aliviada por não ter que aturar os dois membros mais arrogantes daquela família. Maya era a única doce e meiga e, no fundo, a babá torcia para que a menina não se tornasse como a avó e o pai.
Quando a filha saiu pulando, animada junto à babá, Cian ficou em pé.
- Onde vai? - Eleonora lhe deu um olhar inquisidor.
- Tenho uma reunião, mãe.
- Quero que demita essa babá ainda hoje mesmo! - Eleonora continuou, voltando-se para o filho.
- Não! - Ele recusou com veemência. - Há dois dias a Maya não faz pirraças e sempre está sorrindo. Evelyne tem paciência e cuida bem da minha filha.
- É porque sua filha acha que a babá é mãe dela - num tom ríspido, Eleonora respondeu Cian à altura. - Você está de luto. E eu não permitirei que use esta babá para cobrir o buraco que Mariane deixou. Eu te proíbo de se relacionar com aquela mulher.
Um sorriso de escárnio preencheu o ambiente quando ele tombou a cabeça para trás.
- Sou adulto e ninguém vai dizer o que devo ou não fazer! - Ele disparou, ainda com um leve sorriso no canto dos lábios.
- Essa mulher é uma aproveitadora, Cian.
Aquelas eram as mesmas palavras que Eleonora usava para convencê-lo de que sua falecida esposa só estava interessada no dinheiro dele. Pegando o tablet, Cian se afastou da mesa. Sua mente ainda estava muito conturbada; afinal, fazia poucos meses que Mariane tinha morrido num acidente de carro.
Pouco antes de partir, os dois tinham discutido porque a esposa insistia para que saíssem daquela casa, mas Cian se recusava a ouvi-la. Ambos discutiram e, naquele dia, Mariane tinha saído para ver um apartamento onde pretendia morar após o divórcio. Infelizmente, ela nunca mais voltou.
Os pensamentos do senhor Verran fervilhavam enquanto seguia para o jardim. Queria se despedir da filha antes de ir à empresa. Lá fora, a menina corria atrás de uma borboleta enquanto Evelyne a vigiava, gargalhando. A risada da babá era diferente da de Mariane, mesmo assim, compartilhava uma energia boa.
- Por que não dormiu no seu quarto ontem à noite? - Ele a questionou, pegando-a de surpresa.
- A Maya teve um pesadelo - mentiu ela, sem desviar o olhar.
- Devia ter voltado ao seu quarto.
- É que não queria deixar a Maya sozinha e acabei cochilando.
Os cílios deles piscavam sobre as duas pupilas cinzentas que a analisavam. No fim das contas, a desculpa esfarrapada o convenceu.
- Não quero que vista esse uniforme - mencionou ele, fitando o vestido preto com gola branca. - Vou pedir à dona Laura que leve algumas roupas da Mariane pra você.
- Agradeço, mas não aceito... - intrépida, ela retrucou ao chefe. - As roupas da sua falecida esposa são horríveis. Ela tinha um péssimo gosto e não era só pra escolher roupas, se é que o senhor me entende - com humor ácido, Evelyne o menosprezou.
Evelyne cruzou os braços, direcionando aquele olhar intenso e desafiador ao chefe. "Puxa o gatilho, Verran... vamos ver quem cai primeiro", ela pensava, sustentando a provocação.
- Você não vai usar mais uniforme - Cian repetiu, irritado. - Isso é uma ordem, senhorita Mendes. - Dando um passo à frente, ele se curvou sobre a mulher mais baixa, de maneira que o rosto dele quase encostasse no seu.