"Mãe, estou comemorando com minha equipe", eu disse, tentando manter a irritação fora da minha voz. "Foram meses difíceis, e acabamos de terminar um grande projeto."
"Isso é mais importante", ela insistiu, seu tom frágil. "É sobre família. Adolfo quer todos aqui. É um anúncio importante."
"Não pode esperar?", suspirei, olhando para meus colegas risonhos. A ideia de voltar para aquela cobertura estéril, para a fria realidade da minha 'família', fez meu estômago se contrair.
"Não ouse me questionar, Bianca!" Sua voz se elevou, estridente de indignação. "Você tem alguma ideia do quanto Adolfo faz por você? Por nós? Seu estúdio, sua faculdade, tudo! Tudo vem dele. O mínimo que você pode fazer é mostrar algum respeito. Ele espera que você esteja aqui. Não o irrite."
Fechei os olhos, um cansaço familiar me invadindo. Este era o refrão constante de Carina, sua ansiedade perpétua em apaziguar Adolfo, em manter sua posição precária. Lembrei-me dela anos atrás, quando se casou com Adolfo, um poço de nervos, correndo pela cobertura, desesperada para agradar. Ela havia trocado uma forma de subserviência por outra, trocando a dignidade silenciosa de nossa antiga vida pelas correntes brilhantes da riqueza. Ela estava sempre me lembrando dos sacrifícios que fez "pelo meu futuro", sempre me lembrando de ser grata, de me conformar. Muitas vezes me perguntei se ela realmente acreditava na fachada que construiu, ou se estava com muito medo de admitir sua própria infelicidade.
Ela costumava ser tão diferente. Depois que meu pai morreu, ela estava perdida, frágil. Eu a vi murchar, seu espírito antes vibrante diminuindo sob o peso da dor e das dívidas crescentes. Quando Adolfo Aguiar, o viúvo poderoso e charmoso, entrou em sua vida, lembro-me de seu desespero, suas lágrimas silenciosas se transformando em sorrisos esperançosos, embora frágeis. Ela se agarrou às suas promessas de segurança, proteção, um futuro para nós duas.
Mas também me lembrei dos sussurros do passado. As conversas abafadas entre os amigos do meu pai. Os olhares de cumplicidade. As dicas sutis de que o relacionamento de Carina e Adolfo poderia ter precedido a morte do meu pai. Eu os havia descartado então, agarrando-me à imagem da minha mãe enlutada. Mas agora, após a revelação de Heitor, as peças estavam se encaixando, formando um mosaico grotesco. Minha mãe, a viúva de coração partido, era também a mulher que havia buscado conforto, ou talvez oportunidade, nos braços de outro homem enquanto seu marido ainda estava vivo. Ela pregava a dependência, mas seu próprio caminho estava pavimentado com ela, um caminho que a levou a se tornar nada mais do que o troféu de Adolfo, uma mulher bonita para adornar seu braço, sem poder real ou voz própria. Eu o vi menosprezá-la, descartar suas opiniões, tratá-la como um acessório. Eu a vi se encolher, seus olhos baixando, seu espírito encolhendo a cada insulto casual.
Lembrei-me da vez, anos atrás, quando eu ainda era adolescente. Adolfo a humilhou publicamente em um jantar, fazendo um comentário sarcástico sobre sua falta de perspicácia para os negócios. O rosto dela se desfez, suas mãos tremendo. Fiquei tão furiosa, tão protetora, que quase o ataquei. Mas Heitor, então apenas uma presença silenciosa e observadora, chamou minha atenção. Ele me deu um sutil aceno de cabeça negativo, um aviso silencioso. Mais tarde, na solidão silenciosa da biblioteca, em nosso cantinho secreto, ele me ofereceu um raro momento de conforto. "Não lute as batalhas dele por ele, Bianca", ele disse, sua voz baixa. "Não ajuda. Só piora as coisas para ela." Ele apertou minha mão, seu olhar invulgarmente terno. "Algumas batalhas, você apenas tem que suportar."
Eu acreditei nele então. Pensei que éramos aliados, duas almas forçadas a uma família antinatural, encontrando consolo na compreensão silenciosa um do outro. Eu via a dor da mãe dele, o sofrimento silencioso de uma mulher presa, e pensei que ele via a da minha mãe também. Pensei que éramos iguais. Dois filhos de pais falhos, navegando pelos destroços de suas escolhas.
Agora, eu sabia a verdade. Heitor não tinha sido um aliado. Ele tinha sido um observador silencioso e calculista, coletando dados, alimentando sua vingança amarga. Nosso lugar secreto compartilhado, nossas confidências sussurradas, suas palavras reconfortantes – tudo fazia parte de sua fachada cuidadosamente construída. Ele havia usado minha vulnerabilidade, meu desejo de conexão, contra mim. Eu não era sua camarada de armas; eu era sua cúmplice involuntária, um peão em seu longo e brutal jogo. E o sofrimento de sua mãe era meramente uma justificativa, uma narrativa conveniente para suas crueldades.
"Bianca? Você está ouvindo?" A voz de Carina, afiada e impaciente, me arrastou de volta ao presente.
"Sim, mãe", eu disse, minha voz plana. "Estou indo."
Pedi desculpas à minha equipe perplexa, deixando a celebração e voltando para a realidade arrepiante da minha vida. A cobertura se erguia, um gigante de vidro contra o céu crepuscular.
Lá dentro, Adolfo estava invulgarmente jovial. Minha mãe pairava por perto, um sorriso frágil estampado no rosto. Então Adolfo soltou a bomba.
"Heitor trará sua noiva para casa esta noite", ele bradou, um largo sorriso no rosto. "Aline. Uma garota adorável. E eles vão anunciar o noivado."
As palavras me atingiram como um golpe físico. Noivos. Com Aline. A estagiária. A garota que ele usou para repassar minhas lições. Meu estômago revirou. Engoli o gosto amargo da bile, uma dormência fria se espalhando por meus membros. Eu deveria ter esperado isso. Ele havia deixado suas intenções claras em seu escritório. Mas ouvir, a finalidade disso, ainda parecia uma ferida fresca. Aline, a inocente, a pura, a intocada. Ele ia se casar com ela.
Assenti, meu rosto uma máscara cuidadosamente construída de indiferença. O que mais eu poderia fazer?
A campainha tocou, um som musical que irritou meus nervos em frangalhos. Heitor entrou, uma mão possessiva nas costas de Aline. Ela era uma visão em um vestido rosa suave, seu cabelo perfeitamente penteado, seus olhos grandes e brilhantes. Ela parecia em todos os aspectos a noiva inocente. Um troféu.
Minha mãe correu para frente, seu rosto iluminado com uma ansiedade quase desesperada. "Aline, querida! Você está absolutamente radiante!" Ela envolveu Aline em um abraço, depois se virou para Heitor, um sorriso bajulador no rosto. "Heitor, parabéns!"
Adolfo também sorriu para Aline, um calor raro suavizando suas feições geralmente severas. Ele parecia genuinamente satisfeito, mimando-a com uma ternura desconhecida. Heitor, por sua vez, era atencioso, sua mão nunca a deixando. Ele puxou a cadeira dela na mesa de jantar, serviu seu vinho, ouviu com atenção absorta enquanto ela tagarelava sobre seu dia. Era uma exibição cuidadosamente coreografada de devoção.
Comi em silêncio, a comida cara sem gosto na minha boca. Cada tilintar de talheres, cada risada educada, era um novo tormento. Aline, ciente da minha presença silenciosa, ocasionalmente olhava para mim, um sorriso sutil brincando em seus lábios antes de se virar de volta para Heitor, inclinando-se em seu toque, seus olhos brilhando com malícia triunfante.
"Ah, Bianca!", Aline exclamou de repente, sua voz escorrendo surpresa fingida. "Eu nem te vi aí! Heitor mencionou que você era uma artista bastante ocupada. Estamos tão animados com nosso projeto juntos, não é, querido?" Ela apertou o braço de Heitor, seu olhar fixo em mim, desafiador.
"De fato", eu disse, minha voz plana, recusando-me a morder a isca dela. "É certamente... uma colaboração única."
"Ah, você é muito gentil!", Aline riu, depois se virou para minha mãe. "Sra. Harper, sua casa é simplesmente requintada. Só posso sonhar em ter um lugar tão bonito. Você e o Sr. Aguiar têm tanta sorte de ter um ao outro." Ela suspirou com nostalgia. "Deve ser maravilhoso ter um homem tão forte para cuidar de tudo. Para construir um império assim."
As palavras, entregues com uma inocência infantil, eram uma flecha farpada, apontada diretamente para o ponto mais vulnerável de Carina. Elas implicavam sua dependência, seu status de segunda classe nesta casa. O sorriso da minha mãe vacilou, seu rosto se contraindo quase imperceptivelmente.
Uma fúria fria se acendeu em mim. Heitor a usara, mas Aline estava ativamente torcendo a faca. Minha mãe podia ser falha, podia ter feito escolhas terríveis, mas ainda era minha mãe. E ninguém, especialmente não essa estagiária conivente, iria humilhá-la assim.
Pousei meu garfo, o tilintar ecoando na súbita calmaria. "Aline", eu disse, minha voz calma, quase perigosamente. "Você está certa. Deve ser maravilhoso ter um homem construindo um império. Especialmente quando você não construiu nada por si mesma. É preciso um certo tipo de... talento... para se agarrar ao sucesso, não é?"
O sorriso de Aline congelou. Seus olhos se estreitaram, a inocência se foi, substituída por um lampejo de raiva venenosa. Ela abriu a boca para retrucar, mas Adolfo, sentindo a tensão crescente, pigarreou alto.
"Já chega", ele retrucou, sua voz autoritária. "Vamos manter o jantar civilizado."
A conversa morreu, substituída por um silêncio constrangedor. Heitor me observava, sua expressão indecifrável, mas um lampejo de algo, talvez surpresa, cruzou suas feições. Minha mãe olhou para mim, uma estranha mistura de choque e gratidão em seus olhos.
Empurrei minha cadeira para trás. "Se me dão licença, estou bastante cansada."
Saí da sala de jantar, minhas costas retas, deixando-os todos no silêncio desconfortável. No andar de cima, tranquei a porta do meu quarto, o silêncio do meu quarto um bálsamo bem-vindo para minha alma machucada. A amargura da noite, a pura audácia da exibição pública de Heitor, pesou em meu peito. Ele ia se casar com ela. E eu ficaria com nada além das cinzas de um amor que uma vez pensei ser real.