Era uma transmissão ao vivo. Késia Prince estava no pódio, seu rosto um quadro cuidadosamente construído de vulnerabilidade. Ela estava obviamente respondendo a uma recente onda de imprensa negativa, provavelmente alimentada por algumas de suas próprias artimanhas manipuladoras nas redes sociais. Seu lábio inferior tremia, seus olhos se enchendo de lágrimas. Revirei os olhos. Outra performance.
Então a câmera se moveu. Caio estava ao lado dela, seu braço uma barreira protetora em volta de seus ombros. Seu olhar, geralmente tão aguçado e analítico, estava suave, cheio de preocupação. Ele olhava para Késia da maneira que costumava olhar para mim, nos raros momentos em que pensava que ninguém mais estava assistindo. Uma dor profunda e agonizante se espalhou pelo meu peito.
"Késia é uma artista talentosa e compassiva", a voz de Caio ressoou, cortando o silêncio. "Esses ataques, essas acusações infundadas, são vis. São um sintoma de um problema maior de bullying online e misoginia." Ele continuou, uma defesa apaixonada e articulada de Késia, sua voz cheia de uma raiva justa que eu nunca, nem uma vez, o ouvi usar em minha defesa.
Fiquei ali, olhando para a tela, uma risada sem alegria borbulhando na minha garganta. Era tão irônico, tão total e devastadoramente cruel. Ele estava se manifestando contra o assédio online, contra a mesma coisa a que eu fui submetida por meses, alimentada por seu próprio comportamento ambíguo e pelos movimentos calculados de Késia. Mas ele estava fazendo isso por ela. Não por mim. Nunca por mim.
Uma lágrima escapou do meu olho, traçando um caminho quente pelo meu rosto. Limpei-a rapidamente, envergonhada mesmo na minha própria sala de estar vazia. Eu odiava chorar. Odiava me sentir fraca. Mas a pura injustiça daquilo, o contraste gritante entre sua indignação pública por ela e sua indiferença privada à minha dor, era sufocante.
Afundei no sofá, o controle remoto caindo dos meus dedos dormentes. Meu celular vibrou com uma mensagem. Era uma amiga, encaminhando uma captura de tela do discurso de Caio, com uma legenda: "Seu homem é um herói por defender a Késia! Tão inspirador!" Olhei para as palavras, a ironia delas quase fisicamente dolorosa.
Lembrei-me da enxurrada de comentários odiosos depois que ele "oficialmente" anunciou nosso relacionamento. "Ela provavelmente o está forçando a ficar", dizia um. "Olha para ela, tentando se agarrar à fama dele." "Ela é feia, Késia é mais bonita." As palavras me assaltaram, dia e noite, infiltrando-se em meus sonhos, roubando meu sono. Desenvolvi olheiras, um tremor constante nas mãos. Meu mundo, antes vibrante, havia se estreitado para as quatro paredes de nossa casa, a internet uma presença constante e maliciosa.
Eu liguei para ele, desesperada, chorando, implorando para que ele dissesse algo, qualquer coisa, para acabar com aquilo. Ele estava no set, é claro. "Apenas ignore, Alana", ele disse, sua voz plana. "É só a internet. Eles vão superar. Não dê a eles essa satisfação." Ele me disse que era "parte do trabalho", um "mal necessário". Ele me disse que eu era "sensível demais", que eu precisava "desenvolver uma pele mais grossa".
Então, ele desligou, provavelmente para voltar a consolar Késia, para defendê-la de seus trolls, para ser o herói dela.
E agora, aqui estava ele, na televisão nacional, sendo o campeão que Késia merecia. Ele era seu cavaleiro de armadura brilhante, enquanto eu, sua namorada de verdade por sete anos, era deixada para sangrar no escuro, minhas feridas meticulosamente ignoradas.
A câmera focou em Caio novamente. Ele havia envolvido Késia com os dois braços, puxando-a para perto, enterrando o rosto dela em seu peito. Seus olhos, fixos na plateia, estavam cheios de uma tristeza profunda, uma simpatia que parecia perturbadoramente íntima. Ele estava desempenhando o papel do protetor devotado à perfeição. E eu? Eu era a figurante esquecida, a verdade inconveniente que ele desejava que simplesmente desaparecesse.
Uma onda de náusea me invadiu. Senti-me uma tola. Uma tola patética e ridícula. A dor era tão aguda, tão clara agora. Não era apenas negligência. Era um desrespeito completo e absoluto pela minha existência, pelos meus sentimentos, pela nossa história compartilhada. Ele podia estar lá por ela, mas nunca por mim. Ele podia defendê-la, mas me deixar apodrecer.
Peguei meu celular, meus dedos voando pela tela. Eu não me importava com sua agenda, sua turnê de imprensa, seu "laboratório de personagem". Eu não me importava com mais nada. Eu só precisava sair.
Meu polegar pairou sobre o contato dele. Então, com uma respiração profunda e trêmula, eu toquei. A mensagem foi curta. Doce, quase.
"Acabou, Caio. Não volte para casa."