Ele franziu a testa, um lampejo de algo que não consegui decifrar em seus olhos. "Tão generosa, Alice. Qual é a pegadinha? Você geralmente não desiste tão fácil." Ele estendeu a mão, pairando sobre a minha, fingindo preocupação.
Eu recuei, puxando minha mão como se seu toque queimasse. O contato era repulsivo.
Nesse momento, a campainha tocou. Biel, cujo quarto era o mais próximo da entrada, gritou de alegria. "A Sheron chegou!"
Eu congelei. Sheron? Aqui? Minha fachada cuidadosamente construída ameaçou rachar.
Ela entrou, usando exatamente o mesmo lenço de seda de edição limitada que Bruno me deu no nosso aniversário no ano passado. Só que o dela era um fúcsia vibrante, enquanto o meu era um azul safira discreto. Era uma declaração direta e descarada.
"Oh, espero não estar interrompendo nada importante", Sheron disse com uma voz doce, seus olhos passando de Bruno para os papéis em sua mesa. Seu tom era inocente, mas seu olhar era tudo menos isso.
Eu observei, meu maxilar tenso. Bruno evitou meu olhar, mexendo-se desconfortavelmente.
Ele pigarreou. "A Sheron está aqui para levar o Biel para a aula de equitação. O Caio vai junto também. Ele precisa de um amigo, Alice. Você sabe como isso é importante para uma criança."
Um amigo? Bruno, o homem que uma vez insistiu que Biel só brincasse com crianças de famílias 'apropriadas', agora estava usando o filho de Sheron como desculpa para sua presença constante. Sua hipocrisia era espantosa.
Bruno casualmente empurrou os papéis do divórcio para o lado, uma pilha de contas atrasadas agora os cobrindo. Ele minimizou a importância deles, assim como minimizou meus sentimentos.
"Podemos conversar sobre isso mais tarde, Alice", ele disse, dispensando-me com um aceno de mão. "Agora, se nos der licença, o Biel está esperando."
Uma hora depois, eu estava no haras, atraída por um impulso maternal desesperado. Biel insistiu que eu fosse, um pedido raro que eu não podia recusar, mesmo que significasse vê-los.
Mas o que eu vi destruiu qualquer esperança remanescente. Bruno, Sheron e seus dois filhos, rindo, cavalgando juntos. Pareciam uma família perfeita e feliz. Uma família da qual eu não fazia parte.
As palavras da minha advogada ecoaram em minha mente: 'Precisamos usar isso, Alice. Faça-o pagar.' Mas o que eu queria era dignidade, não vingança, não mais.
Eu ainda me lembrava do dia em que nos casamos. Os votos que ele fez, as promessas de para sempre. Pareciam uma piada cruel agora.
Eu estava escondida atrás de uma fileira de baias, observando a família falsa, quando ouvi. A voz baixa de Bruno, falando com o Sr. Dantas, o dono do haras.
O Sr. Dantas parecia desconfortável. "Mas Sr. William, o Caio não é exatamente... o calibre de criança que costumamos ter para o Biel. E suas habilidades de equitação são bem... agressivas."
Bruno riu, um som arrepiante. "Não se preocupe com isso, Dantas. O Caio fará parte da família em breve. Biel precisa de um irmão. E com a Alice fora de cena, Sheron será uma madrasta maravilhosa."
Uma risada engasgada e amarga escapou dos meus lábios. Era quase um soluço. 'Parte da família em breve?' Então esse era o plano dele. Não apenas um caso, mas uma substituição calculada.
A cabeça de Bruno se virou bruscamente, seus olhos se estreitando ao me ver. O ar instantaneamente crepitou com uma tensão não dita.
O Sr. Dantas, sentindo a mudança, murmurou uma desculpa sobre precisar verificar um cavalo e desapareceu rapidamente.
"Há quanto tempo você está espionando, Alice?" A voz de Bruno era afiada, acusadora.
Minha risada foi seca, sem humor. "Tempo suficiente para saber que você prefere conduzir seus casos à vista de todos, Bruno. Ou talvez, você apenas presuma que sou estúpida demais para notar."
Ele passou a mão pelo cabelo, um gesto nervoso. "Não é o que você pensa. O Caio é um bom garoto. Eu estava apenas... pensando em voz alta sobre como integrá-lo na vida do Biel. Como um afilhado, sabe."
Um afilhado. A palavra tinha gosto de veneno. Meu coração, já machucado e maltratado, finalmente se calcificou. "Eu quero o divórcio, Bruno. Agora. Sem mais atrasos. Sem mais jogos."
Ele se aproximou, seus olhos suplicantes, manipuladores. "Não, Alice. Podemos consertar isso. Você está chateada. Não jogue tudo fora."
Nesse momento, Biel gritou: "Caio, cuidado!"
Virei-me bem a tempo de uma flecha passar zunindo pelo meu rosto, errando meu olho por pouco, as penas roçando minha bochecha. Uma dor aguda e ardente explodiu.
Biel, alheio ao meu quase ferimento, correu para o filho de Sheron, envolvendo-o com os braços. "Caio, você está bem? Foi por pouco! Você quase acertou a mamãe!"
Caio, um sorriso presunçoso no rosto, calmamente pegou seu arco. Seus olhos encontraram os meus, um lampejo de maldade em suas profundezas. Ele tinha mirado em mim. Deliberadamente.
Minha mão voou para o meu telefone. "Vou chamar a polícia", eu disse, minha voz tremendo com uma raiva que eu não sabia que possuía.
Bruno arrancou o telefone da minha mão. "Não seja ridícula, Alice! Foi um acidente! Ele é só uma criança!"
Biel interveio: "É, mãe! Você é sempre tão dramática! Peça desculpas ao Caio por deixá-lo chateado!"
Ele olhou para mim, seus olhos arregalados e acusadores. "Se você machucar a Sheron ou o Caio, eu nunca vou te perdoar, mãe. Nunca!"
Olhei para meu filho, depois para Bruno, cujo rosto era uma máscara de fúria fria. Uma risada oca me escapou. "Tudo bem. Chame seus advogados, Bruno. Você não vai me parar."
Ele agarrou meu braço, seu aperto machucando. "Você realmente quer seguir por este caminho, Alice? Você sabe o que minha equipe jurídica pode fazer. Eles vão te enterrar." Era uma promessa e uma ameaça.