Capítulo 3 Acrônimo

Depois que o doutor Baumann e sua equipe receberam a tecnologia japonesa as coisas andaram de vento em popa, tudo parecia estar mais fácil. O projeto ultrassecreto que estavam desenvolvendo estava tomando forma, e de um jeito que eles mesmo jamais imaginaram. Eram instruções concisas e diretas, a cada dia que se passava as conquistas foram imensas, sem a ajuda japonesa o mesmo projeto iria levar o dobro do tempo.

E os japoneses não implantaram o projeto porque não tinham o conhecimento prévio que a equipe de Baumann tinha, ou seja, sozinhos nenhuma das duas equipes conseguiria realizar tal façanha.

Conforme os novos relatórios eram enviados parecia que alguém lá nos escalões superiores estava gostando da ideia, os mantimentos e coisas variadas que Baumann e sua equipe precisavam estavam ficando mais abundantes. E isso fazia com que os soldados ficassem mais irritados, pois tinham que descarregar mais caixas que o de costume, as coisas estavam ficando mais complexas e de certo ponto mais arriscadas.

A rotina de entrega estava demorando mais, e conforme o verão ia chegando mais tropas aliadas começavam a passar pela cidade. Nos anos anteriores os cientistas escutavam uma ou duas a cada seis meses, mas em agosto de 1945 eram pelo menos uma por semana. O que mais os intrigava era como nunca tiveram a curiosidade de verificar se não tinha ninguém naquele prédio, mas até isso o coronel Krüger, tinha feito da maneira certa. Quem iria verificar um subsolo de um prédio em uma cidade arrasada e sem ninguém já nos primeiros anos da guerra?

Nem quando a cidade era habitava tinha gente, mesmo antes da guerra tudo não passava de um recanto bucólico, onde até o progresso esqueceu de passar. A única coisa que Baumann e sua equipe tinham que cuidar era na hora de fazerem um experimento que envolvesse um pouco mais de barulho. Mas isso não era problema, pois faziam na madrugada, aquela cidade nunca foi ponto de parada de nenhum exército, era mesmo apenas uma rota de passagem.

Até que um dia o projeto ganhou nome, na verdade era o nome que os japoneses tinham dado, e era algo bem complicado, ou extenso de se pronunciar. Sistema Autômato Bélico Universal de Resposta Ofensiva, pelo menos era o que foi traduzido para eles. Uma coisa que ficou na memória de Baumann por muito tempos era a cara que Falkenberg fez quando leu aquilo. Seus olhos se arregalaram e ele ficou mais de trinta segundos tentando entender. Uma coisa que lhes deu trabalho era encontrar uma forma de como iriam fazer dessa nomenclatura uma coisa que pudesse ser explicada para os generais.

Os oficiais dos altos escalões não queriam e não tinham tempo para ouvir o que chamavam de baboseiras de engomadinhos com jalecos, falar difícil não era uma coisa que eles tinham tempo e nem mesmo estômago. O que queriam era demonstrações do projeto funcionando, queiram exemplos práticos e objetivos de como aquilo tudo iria ajuda-los a vencer uma guerra. E assim eles olharam para aquele nome imenso que os japoneses tinham dado ao projeto e não sabiam como iriam chamar aquilo de verdade.

Até mesmo para os circuitos que haviam dentro dele era quase impossível grafar uma etiqueta e colar na lateral, precisam de uma abreviação, alguma coisa que fosse mesmo o seu nome. Alguma forma de batizar aquilo que estava diante os seus olhos. Então os quatro se sentaram lado a lado e ficaram admirando o projeto, ali na sua frente estava personificado o que eles levaram quatro anos de trabalho árduo. Foram anos de reclusão e privações para que aquilo estivesse ali na frente deles.

- Será mesmo que isso vai funcionar? - pergunta o incrédulo Vogt para os outros.

- Só mesmo se a tradução estiver errada - responde Baumann sem tirar os olhos de sua obra-prima.

Mas no fundo eles achavam que alguém em algum lugar tinha feito as coisas certas, seria muita estupidez darem a tradução de algo tão complexo para alguém tão despreparado a ponto de traduzir errado as instruções. Pelo menos era o que eles pensavam. Até que o brilhante doutor Friederich Altman fala alto e com o dedo levantado acima da cabeça.

- Acrônimo! Vamos usar um acrônimo!

Todos os outros olham para ele com cara de estranheza, Baumann até chega a pensar que ele passou muito tempo preso ali embaixo, mas logo descartou a possiblidade. Pois é claro que não era pelo fato de ele ser o único com permissão de ir pegar as caixas que os outros não viram a luz do dia. Sempre que dava, ou sempre que eles achavam que era oportuno, um de cada vez ia até o topo do prédio para tomar um banho de sol, é claro que precisavam ficar escondidos, mas era uma boa alternativa. De lá de cima podiam ver se alguma tropa estava chegando, aquele era o único prédio em quilômetros, apesar de não ser muito alto, tinha apenas cinco andares, mas podiam ver além das montanhas.

E se alguma coisa se aproximasse bastava se esconder em uma caixa de madeira com fundo falso que eles fizeram, e sempre deu certo, durante todos aqueles anos as tropas passaram por ali sem sequer desconfiaram. E eles eram tão cautelosos que apenas uma vez, quando foi a vez de Falkenberg ele avistou canhões vindo ao longe, há muitos quilômetros de distância, apenas desceu as escadas rapidamente e ainda deu tempo de se esconderem e ainda esperar muito tempo até aquelas montanhas de aço cruzarem a frente do prédio.

Então definitivamente Altman não estava sofrendo de nada relacionado a estar preso, na verdade ele estava muito certo do que estava falando.

- Claro! - responde Falkenberg - um acrônimo, que nada mais é que uma sigla para o projeto.

E então escreveram no quadro do laboratório a imensa frase que os japoneses deram como título do projeto. Sistema Autômato Bélico Universal de Resposta Ofensiva. E juntaram as primeiras letras desse imenso nome.

- Saburo! - responde Baumann com um sorriso no rosto.

- Até que não soa tão mal assim - diz Altman com a mão apoiada no queixo.

Então eles fizeram uma placa e colaram na lateral da caixa onde iriam embalar tudo e levar para os generais verem, e assim nasceu o nome do maior projeto que a humanidade pôde conceber, ali na frente daqueles quatro cientistas. Os responsáveis por construir e agora testar o projeto Saburo, e então decidiram que assim iriam chama-lo, esse seria acima de tudo o seu nome.

Ele atenderia por Saburo quando alguém perguntasse a ele qual o seu nome.

- Senhores, vamos colocar a camada dérmica, e fazer os testes - convida Baumann demostrando empolgação.

E assim eles retiraram os cabos de energia que o prendiam as estruturas mecânicas e o colocaram amarrado na cama vertical.

- Mas e se algo der errado e ele não fizer o que queremos? - pergunta Falkenberg.

- Vamos usar o código secreto - responde Baumann.

E eles tinham um código secreto, uma frase que era dita e Saburo desligava automaticamente, era algo que apenas os quatro sabiam, foi o único jeito de poderem liga-lo sem colocar suas vidas em risco. Então colocaram a camada dérmica, e assim Saburo tinha uma pele, igual à dos seres humanos.

Então os quatro se colocam em suas mesas, diante os monitores, cada um sabe que tem uma tarefa distinta em relação aos outros, medir frequências, analisar os reflexos e monitorar voltagens, entre outras coisas era o que cada um deveria fazer. E quando ligaram a chave no compartimento interno, não funcionou. Nada correu como o planejado.

Naquela noite todos eles se sentiram profundamente arrasados, era como um balde de água fria, o que parecia ser algo promissor se transformou em nada. Nada vezes nada é o que tinham a sua frente, tinham apenas um monte de aço e circuitos que nem sequer acendia uma lâmpada. Não tinham nem coragem de se olhar no espelho, mas o principal medo de todos era o que iriam fazer daquele momento em diante, a principal arma que estavam incumbidos de construir não funcionava. Nada mais do que a pior coisa que pode acontecer a um cientista estava acontecendo ali, na frente de todos, o famoso e temido: "Nada funciona".

- Senhores, não vamos desistir. Não chegamos tão perto assim para agora sucumbir a um problema tão pequeno - diz Baumann.

- Baumann, não seja tolo. Essa porcaria não funciona! - esbraveja Vogt.

Mas Baumann sabia que poderia e tinha que funcionar, não tinha outra alternativa. Tinha de haver um jeito, pelo menos era a única coisa que passava em sua cabeça, e ali parado na frente daquilo tudo, ele apenas o encara com os braços cruzados. Todos os companheiros de Baumann apenas ficaram calados, estavam esperando que ele se desse conta que tudo estava perdido.

- Baumann, com todo o respeito, desista. Isso tudo era mesmo muito bom para ser verdade.

- Não posso Falkenberg. Preciso termina-lo, foi com isso que em comprometi todo esse tempo e não vou desistir - responde o chefe da pesquisa ainda se recusando a tirar os olhos de Saburo.

Escutar aquilo soou como um banho de água fria para Falkenberg, pois para ele tudo estava acabado, aquele projeto tinha ido por água abaixo. Parecia ser um consenso para eles que a única coisa que tinham a fazer era aceitar a morte ou a prisão por desacato ou qualquer que fosse o veredito que os generais iriam fazer. Cabisbaixos eles tentam se recompor apenas movidos por um sentimento de coleguismo a Baumann, por um lado eles admiravam o fato de o chefe da pesquisa não desistir nunca.

Eles respiram fundo e olham para suas pranchetas tentando encontrar onde erraram ou onde está o problema, mas sabiam que abandonar Baumann não seria a coisa certa a se fazer. Por mais que eles odiassem a ideia todos estavam presos ali e de uma forma ou de outra iriam sair de dentro daquele laboratório da mesma forma, ou dentro de caixões ou com o dever cumprido. Mesmo que isso custasse o último pingo de sanidade de cada um deles.

            
            

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