Capítulo 4 Abra os olhos!

E durante toda aquela noite eles revisaram todos os cálculos, refizeram todas as partes, todas as engrenagens e testaram novamente todos os componentes. E todos funcionavam, apenas quando eram colocados juntos e interligados, é que algo parecia estar errado. E novamente testaram mais uma vez, a eletricidade passava por tudo, estava tudo certo e fielmente igual ao que os japoneses descreveram.

E eles precisavam ser mais rápidos, pois no dia seguinte era terça, o dia que os soldados passariam para entregar as caixas de comida. Mas isso era algo que assustava os outros, para Baumann era apenas mais um a espécie de protocolo. Aqueles dois soldados queriam apenas entregar as caixas e irem embora, e que o doutor Baumann e sua equipe que fossem para o inferno.

E depois de ficarem mais de vinte horas acordados, não chegaram a uma conclusão ou sequer descobriram o que estava acontecendo, não havia uma resposta do porque nada funcionava. E isso os deixava mais frustrados. A coisa mais importante sobre aquilo tudo tomou o pensamento de todos ali. O acordo era simples, ou terminavam o projeto e o faziam funcionar ou iriam ficar presos ali.

- Deveríamos ter construído um carro e dado o fora dessa espelunca - afirma Altman.

- E se estamos do lado Francês? Como iriámos passar a fronteira? - pergunta Falkenberg.

- Do mesmo jeito que aqueles soldados passam - retruca Altman.

- E aí seriamos caçados por todo o país e executados como traidores. O coronel Krüger não iria nos perdoar - afirma Baumann.

Todos ficam em silêncio e voltam as suas pranchetas de cálculos, naquele momento perceberam mais uma vez que a única opção que tinham era terminar logo aquilo, de uma forma ou de outra. E assim fizeram mais uma vez, revisaram tudo de novo, e testaram pela terceira vez. E quase sem coragem nenhuma ligaram novamente a chave no compartimento interno. E não funcionou. Baumann e sua equipe voltaram para e estaca zero, o projeto Saburo não funcionava.

Tudo começa novamente, desmontaram aquele monte de sucata, sim, para eles aquilo não passava de sucata. Deveria ter alguma forma de fazerem que aquela porcaria pudesse pelo menos ligar uma mísera lâmpada. E não restava outro jeito, pela primeira vez tiveram que mentir em um relatório e explicar como que os avanços foram por água abaixo. Mas isso não foi difícil para Baumann, no relatório explicou que a fonte de energia não era suficiente para suportar a carga necessária. E então depois de provarem com argumentos técnicos sólidos solicitaram algo que os faria ganhar alguns meses de vantagem. Precisavam de um conjunto de baterias de ferro-níquel ligadas em conjunto e que fossem menores que uma caixa de biscoitos, pois era o único espaço que tinham.

E a terça-feira a noite chegou, e como sempre os soldados não falaram nada, apenas jogaram a caixa no chão, mas antes de irem embora receberam o envelope de Baumann, pronto, agora eles tinham meses para tentar descobrir o que aconteceu. Naquela semana foram ao topo do prédio várias vezes para tomar sol e não viram nada, ninguém passou pela frente do prédio, tiveram uma semana do que puderam chamar de férias. Mas não durou muito, na terça seguinte os soldados chegaram com uma caixa maior.

O que tinha dentro assustou os cientistas, era o que tinham pedido, uma bateria de ferro-níquel do tamanho de uma caixa de biscoitos, do tamanho exato que estava no memorial de cálculo que haviam enviado. E coube exatamente no espaço vazio que não seria usado para nada.

- Baumann, mas como eles conseguem essas coisas? - pergunta Altman segurando a pequena bateria em suas mãos.

Seus olhos parecem não acreditar no que está vendo, agora eles têm o triplo de energia em menos da metade do tamanho, se soubessem o que tinham nas mãos não ficariam surpresos. Aquilo, vinte anos depois seria vendido nos supermercados ao preço de poucas moedas e com tamanho ainda menor, teriam o tamanho e espessura de um dedo de uma criança. E iriam ser chamadas de pilhas.

Para Baumann não iria fazer diferença nenhuma, aquele não era o problema, então apenas jogou aquela bateria em cima da mesa, não deu importância. Mas para os outros alguma coisa ali fazia sentido, talvez o chefe da pesquisa não quis perceber a coisa mais importante, eles precisavam mesmo de uma fonte de energia mais potente. E ela estava ali, na frente deles.

- Baumann, percebeu que essa bateria aqui é recarregável? - afirma Falkenberg.

- Só pode ser brincadeira - responde Baumann torcendo o pescoço.

- Sim, essa é similar aquela dos trens elétricos! - constata Vogt abismado.

Então naquela hora perceberam que um novo horizonte se abriu na frente deles, com uma fonte de energia recarregável, não teria como não funcionar. E então fizeram o teste, e realmente era isso, a energia que tinham descarregava totalmente no exato momento em que ligavam, separados os componentes funcionavam. E foi isso que não viram e sem perceber tinham achado a fonte do problema. E então prepararam tudo novamente e estavam prontos para ligar.

Parecendo crianças no parque de diversão eles se sentam em suas mesas, colocam os óculos de proteção e quando Baumann estica a dedo para baixar a chave no compartimento interno, o barulho da rua trepidando parece ensurdecedor. Uma tropa estava a caminho, então eles tiveram que colocar tudo em uma caixa de madeira, se esconder no fundo falso e esperar. Mesmo eles estando escondidos no subsolo, um fundo falso era o esconderijo que nunca dispensavam.

Nunca sequer quiserem pensar no fato de que porventura uma daquelas tropas entrasse no prédio e desconfiasse que alguém estivesse se escondendo ali. Até as marcas dos pneus do jipe dos soldados que traziam comida eles sempre tomavam o cuidado apagar, mas não podiam cobrir tudo. Pelo menos em volta do prédio eles faziam, a madrugada de terça sempre era destinada para isso. Ficavam horas e horas cobrindo as marcas de pneus na rua de terra que dava acesso aos fundos do prédio.

Apenas quando chovia eles não precisavam fazer nada, pelo menos nessa hora a chuva era boa, pois desmanchava as marcas. E a tropa passou mais uma vez, marchando a caminho de algum lugar. Era uma tropa aliada? Ou não? Isso não importava, e eles nunca tiveram essa curiosidade, bastava apenas não serem descobertos. Depois de mais de meia hora de espera e quando todos concordaram que não havia mais perigo eles saíram do fundo falso no chão e voltaram para a sua pesquisa. Agora era a hora do teste derradeiro, ligar aquele monte de ferro e verem se realmente estavam certos.

A remontagem de tudo foi algo que levou alguns dias, foi trabalhoso, mas não cansativo, pois de tanto olhar para aquelas instruções tinham o projeto decorado na cabeça. E em poucos dias tudo estava pronto. Ali estava novamente o projeto amarrado na mesa vertical e os cabos desconectados, os ponteiros de relógio marcavam alguma coisa perto das quatro da tarde. E então o doutor Baumann baixa a chave que liga tudo.

Pela primeira vez eles escutam os circuitos serem carregados, o barulho da corrente passando pelos fios e as pequenas lâmpadas internas acendendo. Aqueles pequeninos pontos luminosos do tamanho de um grão de feijão foram se acendendo um a um, em uma sequência digna do relógio mais preciso do mundo. O disco horizontal de carbono começa a girar, os transistores e capacitores parecem estalar lá dentro. Da bateria nova que receberam começa a sair faísca de seus contatos, os ponteiros de energia começam a beirar o indicador máximo.

A luz da sala pisca uma vez e para. Depois pisca mais uma vez e tudo fica escuro novamente, os aparelhos que medem a potencia estão quase que sobrecarregando, a luz pisca varias vezes e depois para. Mas parece que alguma coisa queimou ali dentro dos compartimentos do Saburo queimou, nada funcionou.

- Que droga Baumann, acho que dessa vez quase conseguimos - afirma Altman fechando os olhos com força e socando a mesa.

- Calma, ele ainda não desligou, talvez nem todos os circuitos não tenham carregado - afirma Falkenberg olhando para o compartimento interno ainda aberto - Baumann, desligue a chave condutora dos diodos e a chave auxiliar dos semicondutores.

Quando Baumann faz o que seu assistente disse também não acontece nada, ele apenas fecha a porta do compartimento interno, mas quando abaixa o pino de travamento inúmeras faíscas e estalos começam a disparar por tudo dentro dos circuitos. Baumann precisa tirar rápido a mão de perto para não se queimar, para eles naquele momento tudo parecia que iria explodir, mas tudo fica em silêncio. E depois de alguns segundos em que todos ficaram inertes com os olhos fixos em Saburo o que eles mais desejavam aconteceu.

O androide Saburo abriu os olhos.

Aquilo foi como uma injeção de alívio, como se uma luz acendesse na escuridão total dos mistérios científicos, no rosto de todos os cientistas se abriu um sorriso largo de satisfação e acima de tudo de dever cumprido. O androide era agora algo concreto e estava ali diante dos olhos de cada um deles, por um momento eles desejam que a imprensa estivesse na porta. Que os flashes das câmeras começassem a disparar tentando buscar o melhor ângulo para retratar a conquista sem precedentes de quatro dos maiores cientistas do país. Mas não tinha imprensa, não tinha ninguém, eram apenas eles, sozinhos entre as paredes silenciosas do laboratório, e apenas elas seriam testemunhas do feito que acabou de acontecer.

Sem apertos de mãos, sem aplausos da equipe, sem congratulações, sem nada, eles não tiveram nada, a não ser uns aos outros para comemorar o esforço de anos dedicados a apenas ao androide. Eles sabiam que existia a possibilidade de não serem creditados como os cientistas que fizeram o androide funcionar, e isso era algo bem aceitável, pois sabiam que o orgulho dos generais do alto escalão era maior que qualquer coisa. No final de tudo seriam os generais que iriam posar para as fotos.

            
            

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