-Como vocês fazem empréstimo para as mesmas pessoas que já devem? - Eu pergunto para um dos vapores - Tá me achando com cara de banco? De otário? Caralho porra - Jogo a pasta longe.
O vapor não me responde e começa a se tremer todo.
- Calma aí Fael - Felipe fala entrando na boca.
- Tem maior grana solta por aí nas mãos desses drogados do morro. E isso que eu nem peguei a porra do caderno de dívida de droga e dos aluguéis - Ele me olha.
- Vamos resolver isso aí. - Ele diz me olhando.
- Filipe eu quero que cobrem geral. Não quero ficar com dinheiro meu por aí não, quero todo meu dinheiro de volta com juros - Ele assente - Pode pegar o caderno de aluguel também, não quero que passe pano para ninguém.
- Pode crer - Ele Responde.
Eu sou dono desse morro e eles ainda tentam me passar para trás . Não herdei isso aqui atoa do meu pai não, meu pai me ensinou como comandar essa porra.
- Relaxa Fael. Hoje é dia de baile. Bora descer - Filipe diz.
Eu acabo assentindo com ele, não era muito de ficar desfilando pelo morro atoa , mas uma vez ou outra até ia.
- Oque tá pegando aqui seus comédias? - Desço até a entrada do morro junto com Filipe.
- Truco bora Fael? - Yuri fala .
- Horário de serviço mané - Filipe fala para eles.
Filipe era o sub do morro, crescemos aqui, eu e ele , o meu pao criou e somos que nem irmãos , ele me ajuda muito e sempre está do meu lado, confio nele de olhos fechados.
- Como a Juliana está gostosa em - Yuri fala para Mateus. Eu olho para trás e vejo apenas uma menina morena de costa subindo o morro.
- São pagos para cuidar as mina é? - Eu falo para eles - Quero vocês cobrando os comédias que estão me devendo. - eles começam a rir e eu reviro os olhos. - Mando nessa porra mais não?
- Vai colar no baile? - Filipe pergunta.
- Vou não - Eu respondo - E acho bom você se controlar porque segunda vamos cobrar cada um em.
- Já é - Ele fala e fazemos um toque e ele sai de dentro da boca.
Bolo um baseado e começo a puxar um. Não demorou muito para pegar às cartas de truco e a gente começar a jogar.
Ariane e Tais se aproximam da mesa.
- Será que posso falar com você Fael? - Ariane pergunta.
- Desenrola aí - Eu olho para ela.
- Conversar eu e você apenas. - Ela diz com uma voz manhosa.
- Estou de boa aqui jogando truco. - Eu olho para ela e ela se aproxima do meu ouvido.
- Acho que você vai gostar do que eu tenho para te mostrar. - Ela diz com um sorriso em seu rosto.
- Então cola lá na boca mais tarde - Eu olho para ela - Daqui uma hora eu tô lá.
- Te espero. - Ela diz sorrindo.
Eu não era de ficar esbanjando as mina que eu pegava por aqui, mas também não ficava na seca.
Era difícil eu colar em baile já porque todas caíam em cima, mas diversão era sempre bom.
Juliana narrando
O final de semana passou tão rápido e eu levo um susto quando vejo o despertador tocar. Meu pai não veio para casa no final de semana e torcia para que ele tivesse em casa agora de manhã. Eu amava meu pai muito e por isso seria muito difícil eu abandonar ele, ele era tudo na minha vida, era tudo oque eu tinha.
- Oi pai - Eu falo assim que vejo ele e sinto um alívio por dentro.
- Bom dia - Ele responde meio seco e cheirando a cachaça.
- Já tomou café? - Eu pergunto para ele preocupada .
- Ainda não - Ele responde olhando para o nada.
- Quer que eu arrume alguma coisa para o senhor comer? - Eu pergunto ficando na sua frente.
- Não precisa - Ele responde se levantando e passando por mim sem dizer nada.
Abro a porta e levo um susto quando vejo um vapor na frente da minha casa.
- Ó tem aviso aqui para tu - Yuri diz me entregando um papel.
- Oque é isso? - Eu pergunto.
- Aviso de aluguel atrasado. Já tá vencendo o próximo e precisa acertar isso aí, se não quem vai cobrar é o chef.
- Mas tá pago Yuri. Eu paguei.
- Pagou não. Quem recebe sou eu . - Ele diz me olhando sério.
- Eu dei o dinheiro para o meu pai pagar - Eu falo lembrando do dia que entreguei o dinheiro para ele.
- Então quem recebeu foi o dono do bar - Ele fala me olhando - Olha teu prazo tá acabando é melhor tu desenrolar a grana ai. - Ele diz saindo.
Ele deve ter gasto com bebida.
Pensei em voltar para dentro de casa e perguntar para ele porque esse aviso, mas resolvo ir trabalhar se não iria chegar atrasada, esse mês eu teria que me programar para pagar dois meses.
Oque eu ganhava era pouco para pagar tudo sozinha, eu não sei como eu ainda acreditava nele e entregava o dinheiro para ele pagar o aluguel, ele não conseguia se controlar mais, estava em um caminho sem volta.
- Bom dia - Eu falo assim que entro dentro da loja e vejo que a dona Ana estava com uma cara fechada e Rafaela também.
- Juliana será que podemos conversar? - Ana pergunta - Là no meu escritório.
-Claro - Eu acompanho ela até o escritório - Eu fiz alguma coisa de errado Ana? - Pergunto numa esperança de ser apenas uma bronca.
- Então minha querida , a loja está vendendo muito pouco e eu vou precisar te demitir - Eu paraliso e olho para ela - Eu sinto muito, aqui está o seu pagamento, estamos reduzindo o pessoal e vou deixar apenas dois mais antigos, eu sinto muito Juliana.
- Tudo bem - Eu falo -Obrigada.
Encontro Rafaela lá fora me esperando e pelo jeito ela também tinha sido demitida.
- Corte de gasto? - Rafaela pergunta.
- Sim - Eu respondo para ela - E agora?
- Podemos tentar alguma coisa em shopping - Ela fala.
- Eles não dão trabalho para quem mota no morro - Eu falo para ela. - Esqueceu a onde moramos? Na rocinha Rafaela.
- Preconceito de merda - Ela fala.
- Mas você sabe que é assim que acontece - Eu suspiro - Pelo menos oque eu tenho aqui eu consigo pagar os dois aluguéis.
- Dois aluguéis? como assim Juliana - Rafaela me olha espantada - Você paga tudo certinho.
- Mês passado eu dei para o meu pai o dinheiro e acredita ele gastou - Eu falo dando uma risada forçada - Advinha com oque? Hoje Yuri foi lá me cobrar.
- Você deveria usar esse dinheiro para sair do morro - Ela fala - Deixa ele lá se afundar sozinho.
- Não posso fazer isso ele é meu pai Rafaela - Eu falo para ela e ela suspira e não diz mais nada.
Rafaela resolveu tentar ir até o shopping para arrumar um emprego e eu volto para o morro para pensar oque eu iria fazer. Tentar algo no morro? Poderia ser uma solução.
Estava chegando na entrada do morro quando vejo uns cara armado falando com os vapores ali.
- Ei - Sinto alguém me chamar , eu me viro vendo que era Yuri.
- Oi - Eu falo encarando.
- Essa é a filha do Thiago. - Ele fala apontando para mim. - Eles querem desenrolar com teu pai mas ninguém consegue achar o velho.
- Quem são vocês? - Eu pergunto olhando para eles.
- Teu pai tem uma dívida comigo - O cara barbudo e alto com cara feia me olha - Eu quero meu dinheiro, tu vai mandar aquele velho descer e me pegar agora.
- Eu não sei se ele está em casa. Que dinheiro é esse que ele deve para você?- Eu pergunto querendo entender.
- Sobe lá em cima e manda aquele velho descer, porque eu quero meu dinheiro se não. - Ele pega a arma na mão. - Já era para eu ter resolvido isso mas eles não estão deixando eu subir.
- Quando ele deve? - Eu pergunto.
- Eu só negócio com o teu pai - Ele me olha e eu encaro ele.
- A gente já disse que o velho não tá na casa - Yuri fala. - Sobe Juliana e se você achar seu pai manda ele descer.
- Eu sei a onde tu trabalha mocinha, se eu não achar teu pai, eu cobro de você. - O cara grita em quanto eu subia.
Eu subo aquelas escadarias à mil, chego em casa sem fôlego mas quando entro dentro de casa não encontro meu pai em lugar nenhum.
Juliana narrando
No outro dia de manhã meu pai ainda não tinha chego em casa, eu estava preocupada. Pego a minha bolsa o dinheiro para o aluguel e escondo dentro do guarda roupa bem escondido. Não poderia arriscar perder o único dinheiro que eu tinha para pagar meu aluguel.
Eu vou até a casa da Rafaela para conversar com ela, mas não encontro ela. Quando eu viro a rua dou de cara com Yuri, Filipe e o Fael conversando na frente da boca. Eu passo sem nem olhar para o lado mas eu vejo o olhar deles em cima de mim.
Eu moro aqui a minha vida toda e a vida toda eu evito passar por aqui, mas hoje foi impossível. Posso contar nos dedos às vezes que eu vi o Fael na minha vida ou até mesmo seu pai.
- Juliana - Escuto a voz de Yuri e olho para ele. Ele se aproxima de mim.
- Tudo Bem? - Eu pergunto vendo que Fael me encarava sério.
- O dinheiro do aluguel. Teu prazo acaba hoje.
- Eu tenho o dinheiro, ele está na minha casa.
- Passo lá mais tarde para receber. - Ele fala e eu assinto com a cabeça, ele se afasta voltando para o lugar à onde estava e eu continuo o meu caminho para casa.
Quando chego em casa vejo que à casa estava toda revirada.
- Pai - Chamo ele pela casa mas ele não me respondia - Pai - Vou até o seu quarto e vejo tudo revirado , a porta do seu guarda roupa aberto sem nenhuma roupa dentro.
Para onde ele teria ido? Ele foi embora e me deixou?
Começo arrumar aos poucos toda bagunça, quando termino já era noite.
Abro os armários e vejo que não tinha nada de comida ali, até isso ele tinha levado. Vou até o meu quarto e quando abro o guarda roupa vejo as minhas roupas reviradas, procuro pelo meu dinheiro e não encontro nada. Começo a ficar desesperada.
- Meu Deus - Eu pego a minha bolsa procurando pelo dinheiro na esperança que eu não tivesse tirado ele da carteira. Mas não tinha nada. - Meu próprio pai me roubou - Eu falo me sentando na cama.
Não acredito que meu próprio pai tinha me roubado,.
Eu começo a me desesperar vendo que realmente ele tinha me roubado, não tinha nenhum dinheiro ali, nem um real sequer. Eu estava desesperada , eu não tinha dinheiro e não teria como pagar os aluguéis e nem como sobreviver.
Eu estava na merda por causa do meu próprio pai.
Yuri daqui à pouco iria vir para cobrar meu aluguel. Oque eu iria fazer ? Oque eu ia dizer?
Fael narrando
- Fael - Yuri fala no rádio. - Tô com um problema aqui na entrada. Tentei falar com Filipe mas não rolou.
- Tô descendo. - Falo desligando o rádio.
Coloco a arma na minha cintura e saio com o rádio na mão, quando saio da boca vejo a Juliana subindo correndo pelas escadas.
- Que bagunça é essa porra? - Grito assim que vejo uma movimentação na entrada do morro. - Oque tá pegando aqui?
- Esses cara aí querem entrar para cobrar a dívida de um morador - Yuri fala.
- Que morador? - Eu pergunto olhando para eles.
- Thiago da rua 7 - Ele responde. - Pai lá da Juliana - Eu o encaro.
- Ele deve para nós tambem - Filipe fala .
- Agora tu tá aí. - Eu olho para ele.
- Mas tô dizendo que o cara não tá em casa e não achamos ele no morro - Yuri fala .
- Ele tem uma filha - O cara fala. - Se ele não me pagar quem vai sofrer as consequências é ela. Eu tô falando.
- Como é o seu nome? - Eu pergunto olhando para ele.
- Teco - Ele responde.
- A sua dívida é com o velho, ache ele fora do meu morro - Eu respondo para ele - Agora some .
- Isso não vai ficar assim. Eu vou voltar com os meus homens e vou entrar nesse morro para achar ele - O cara ameaça.
- Tenta - Eu olho para ele - Eu vou tá lá na laje rindo da tua cara seu desgraçado.
O cara sai ameaçando e eu reviro os olhos vendo ameaça da aquele merda.
- Quanto esse vermes deve para nós? - Eu pergunto para Filipe.
- Uns 8 mil - Ele responde.
- Caralho. Porque não tava no caderno de dívida que eu vi? Vocês tão perdendo a noção das coisas. Eu quero a porra desse dinheiro.
- É droga cara . Você viu outro caderno - Filipe fala.
- Ele deve ter vazado - Eu falo - A noite vamos bater na casa do velho. Eu quero esse dinheiro na minha mão ainda hoje.
-Mas só vai ter a filha - Filipe fala.
- Ela ainda tá devendo o aluguel. - Yuri fala - Disse que entregou o dinheiro para o pai quando eu fui cobrar.
- O aluguel tá atrasado não tá ? - Eu pergunto.
- Sim - Filipe responde.
- Ela vai assumir a dívida toda não quero nem saber. A desgraçada tá morando de graça. Quero o meu dinheiro. - Eu falo.
Estava quase anoitecendo e os vapores da entrada do morro já tinha me passado o rádio dizendo que mais dois cara vieram cobrar o Thiago e estão atrás da filha dele também. Se o velho não pagar a filha iria rodar rapidinho e eu não iria nem precisar fazer esforços para isso.
- Vai colocar a menina para rua mesmo? - Filipe fala me olhando.
- Ela paga o mês atrasado e vaza, se não ela morre - Eu respondo para ele - É assim que funciona aqui, quero saber de dinheiro não, quero saber do povo me respeitar aqui dentro.
Ele apenas assente com a cabeça, e continuo fumando o seu baseado.
- Anda manda cobrar aquela filha da puta - Eu falo para Filipe.